Eu não havia lido o artigo
de Janio de Freitas e era uma pessoa mais feliz. Não, é claro,
porque tenha sido criticado por ele. Pelo contrário, ser criticado por alguém
que não faz a menor ideia do que está falando não me deixa, em geral, nem mais,
nem menos sentido. A tristeza é similar à que me dá quando vejo um
adulto analfabeto ou um economista da Unicamp: o potencial humano desperdiçado.
No caso, a crítica a mim
dirigida diz respeito à minha expressão “aposta fracassada”. Segundo Janio,
assim a qualifico porque “deu em ‘piora fiscal, descaso com a inflação e
intervenção indiscriminada, predominando a ideologia onde deveria governar o
pragmatismo’”. Ah, o analfabetismo funcional...
Talvez o jornalista não
tenha acompanhado, mas posso lembrá-lo: há pouco o governo brasileiro, na
figura de seu ministro da Fazenda (por exemplo), assim como outros economistas
(que não dominam os meios de comunicação, como eu, mas curiosamente publicam em
todos os grandes jornais), afirmavam que o país adotara uma “nova matriz
macroeconômica”. (Vejam, por exemplo, aqui,
ou aqui,
ou ainda aqui.
Caso queiram mais um pouco, tem aqui
também, mas, na verdade, basta procurar no Google para saber o que digo.)
Esta “nova matriz
macroeconômica” consistia na combinação de dólar mais caro, juro mais baixo e
um superávit primário “que segue as necessidades da economia, caindo quando é
necessário ampliar as desonerações fiscais e subindo quando é preciso apertar o
cinto e reduzir o impulso à economia” (se bem que esta segunda parte ninguém
jamais viu). O resultado prometido era crescimento mais alto, sem desequilíbrios
externos e inflação na meta.
Na prática o crescimento
foi (e é) anêmico, a inflação é alta e o déficit externo crescente. Em
compensação, o investimento também não aumentou...
Pode ser que em outros
tempos o termo “fracasso” tivesse outro sentido; hoje, porém, não consigo
pensar em nenhum termo mais preciso para descrever o que ocorreu com a economia
brasileira. Ou seja, houve uma aposta e ela fracassou. Será que Janio tem
alguma outra definição diferente de “fracasso”?
Ah, mas e os milhões que
saíram da pobreza, não contam? Contam, claro, e muito. Só que aí precisamos ver
quando
estas pessoas saíram da pobreza.
Segundo dados do IPEA, a taxa de pobreza (definida como o
percentual de pessoas na população total com renda domiciliar per capita inferior à linha de extrema
pobreza) caiu à metade, de 15,2% em 2003 para 7,6% em 2008. Entre 2008 e 2012
reduziu-se um pouco mais, para 5,3%. Posto de outra forma, o grosso (algo como 3/4) da queda da
pobreza se deu quando a política econômica não se guiava pela tal “nova matriz”,
mas por um arranjo bastante distinto.
Podemos, claro, discutir
se a queda teria sido mais (ou menos) pronunciada sob outras condições e mesmo
se há uma relação de causa e efeito entre uma coisa e outra. Mas não há como atribuir
a maior parte da redução da pobreza à aposta fracassada de política macro, simplesmente
porque aquela a antecedeu em alguns anos.
Ocorre que, para saber
disto, é necessário um pouco mais de esforço do que citar meia dúzia de números
aprendidos na leitura do jornal. Opinião todo mundo tem; dados para ampará-la,
só quem pesquisa.
26 comentários:
Esse colunista da FSP, o Jânio de Freitas é um grande picareta oriundo do partidão e que ficou mais afoito para falar bobagens após a tomada do puder pela Petralhada.
Absolutamente nada do que ele escreve é grátis. Ganha dinheiro falando bobagens. O PT lhe paga regiamente.
Grande Alex, gosto de você porque, além da inteligência, você bate pesado, rs!
Fantástico!fantástico!fantástico!!!!!!
O cara é membro do Conselho Editorial da Folha e fala de linhagem de economistas que domina os meios de comunicação como você?
O que me assusta é ver um comentarista político de um jornal de circulação nacional ser tão despreparado para comentar um fato econômico - que não permite manipulação ideológica.
Quando Janio de Freitas escreve, o mundo emburrece.
Q preguiça desse Janio...
Caro Alexandre,
Perfeitos os comentários, mas eu iria mais longe: o maior problema desse tipo de articulista e até do debate público no Brasil nos últimos dez anos é de ego. Trata-se de uma crença arraigada de que as políticas que eles defendem são melhores pq são moralmente superiores, pq têm a melhora das condições do povo como objetivo. Nós, liberais, seríamos vampiros, preocupados em sugar o sangue do povo para sustentar índices que não têm nenhuma implicação relevante para a realidade. É de uma covardia atroz, pq exime eles de usarem qualquer argumento fundamentado em dados e pesquisas.
Alex, vc é pirracento, mas é bom. Belo texto.
Noiticia velha, mas sen do veinculada nacionalmente:
Laís Alegretti, Renata Veríssimo e Ricardo Della Coletta, da Agência Estado
BRASÍLIA - O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou que o governo central teve um superávit primário de cerca de R$ 14 bilhões em dezembro, o que resultou em uma economia de cerca de R$ 75 bilhões em 2013, acima da meta do governo para o ano passado, de R$ 73 bilhões. "Queria começar o ano dando boas notícias do ponto de vista fiscal. O governo central cumpriu o compromisso de fazer um superávit primário acima de R$ 73 bi para o ano de 2013", afirmou.
>> meus comentários: ahuahauhauhauhauahuahua
Esse artigo não foi uma análise e sim uma defesa partidária. Ou mais, foi uma defesa do jeitinho contra a ciência e a experiência humana. Será que ele sugere que exista uma correlação positiva entre crescimento e pobreza?
Dantas
Há, Há, Há.
Te peguei no pulo, sr. "economista"!!!!!
E as expectativas?????
"...não há como atribuir a maior parte da redução da pobreza à aposta fracassada de política macro, simplesmente porque aquela a antecedeu em alguns anos..."
As pessoas, antecipando a mudança da política macroeconômica, DEIXARAM DE SER POBRES!!!!!
Está na hora de aprofundar o modelo!!!!
Saudações.
.
Há, Há, Há.
Te peguei no pulo, sr. "economista"!!!!!
E as expectativas?????
"...não há como atribuir a maior parte da redução da pobreza à aposta fracassada de política macro, simplesmente porque aquela a antecedeu em alguns anos..."
As pessoas, antecipando a mudança da política macroeconômica, DEIXARAM DE SER POBRES!!!!!
Está na hora de aprofundar o modelo!!!!
Saudações.
.
"As pessoas, antecipando a mudança da política macroeconômica, DEIXARAM DE SER POBRES!"
Perfeito, perfeito...
Alex, você tem razão em grande parte do artigo.
Mas concordo com Janio quando ele diz que pouco se fala positivamente da baixa taxa de desemprego no país. Trata-se de um resultado esplêndido (talvez não fruto da ação do governo) mas que ocorreu durante os mandatos do PT. Essa notícia, quando veiculada em qualquer lugar do mundo, causa espanto e menções honrosas. Realmente é algo muito bom e pouco comemorado pelos analistas.
Vlw John
Alexandre,
Você poderia provar que a queda de 3/4 da pobreza se deve à antiga matriz econômica (ou, o que vai no mesmo sentido, provar que a desaceleração da queda da pobreza se deve à adoção da nova matriz macro)?
Nunca vi nenhuma análise empírica do gênero na litertura sobre o tema (e me dedico ao assunto).
Existem hipótese que colocam a desaceleração da queda da pobreza como uma questão de efeitos marginais decrescentes (na margem é cada vez mais difícil focar nos muito pobres e efetivar sua saída da pobreza).
Não sei o que acha a respeito...
Marcos
PS: parabéns pela patada no Janio. Cada macaco no seu galho é uma questão de princípios na divisão social do trabalho.
"Você poderia provar que a queda de 3/4 da pobreza se deve à antiga matriz econômica (ou, o que vai no mesmo sentido, provar que a desaceleração da queda da pobreza se deve à adoção da nova matriz macro)?"
Não, nem foi este minha intenção (o que, aliás, está explícito na nota). A essência do argumento é que a aposta fracassada não pode explicar 3/4 da queda da pobreza.
Deixo para alguém que tenha mais instrumental para tratar do assunto.
"Você poderia provar que a queda de 3/4 da pobreza se deve à antiga matriz econômica (ou, o que vai no mesmo sentido, provar que a desaceleração da queda da pobreza se deve à adoção da nova matriz macro)?"
Simples.
Suponha que o Plano Real não foi implantado. Suponha mais ainda que o Lula ganhou as eleições de 1994. Adicionalmente, suponha que o Lula implementou suas ideias de campanha àquela época. Por último, suponha que o Lula conseguiu se reeleger e continuou implementando as mesmas ideias da campanha de 1994. Q.E.D.
Alex, além de todos os argumentos expostos em seu post, vale lembrar o editorial da Folha de 22/05/2013, que lembrava a falta de correção dos índices utilizados para contabilizar o tamanho da pobreza tupiniquim. Caso tais índices fossem atualizados pela inflação, boa parte das duas dezenas de milhões de brasileiros voltariam ao estado de pobreza. Tudo não passa de mandracaria contábil, que só serve pra quem é servil ao discurso oficial...
Anônimo disse...
Alex, você tem razão em grande parte do artigo.
Mas concordo com Janio quando ele diz que pouco se fala positivamente da baixa taxa de desemprego no país. Trata-se de um resultado esplêndido (talvez não fruto da ação do governo) mas que ocorreu durante os mandatos do PT. Essa notícia, quando veiculada em qualquer lugar do mundo, causa espanto e menções honrosas. Realmente é algo muito bom e pouco comemorado pelos analistas.
Vlw John
7 de janeiro de 2014 16:22
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John, meu jovem! Que taxa de desemprego é essa num país que possui 12 milhões de FAMÍLIAS dependentes de bolsa social? Que taxa é essa num país onde o
seguro-desemprego bateu recorde de desembolso? Então o desemprego "cai", mas número de beneficiários de "seguro desemprego" aumenta? Como isso é possível? Nem o "realismo mágico" do Garcia Marques dá mais conta de explicar essas "excentricidades" latino-americanas ...
.
"Previdência e seguro-desemprego estouram previsão e lideram alta de gastos em 2013"
http://goo.gl/v4Mmfk
Vamos ver com a inflação seguindo acima da meta e baixo investimento somados a inaçao do governo quanto tempo essa taxa de desemprego se mantém . Spn
Sr. Alexandre,
Nos links disponibilizados, o governo anuncia que o primeiro ano da “nova matriz” seria 2013, sendo 2012 um ano de transição.
Sendo leigo, estranhei a condenação ao fracasso de uma política com menos de um ano. No Google encontrei que o Globo (em editorial) demorou apenas 6 meses. O argumento usado foi que essa política já vem desde 2009, que é implicitamente o mesmo usado pelo senhor ao dividir a evolução da taxa de pobreza (observo que a taxa de pobreza definida pelo senhor equivale à taxa de extrema pobreza do IPEA).
Para um leigo, o bônus do cenário mundial favorável fica para a “velha matriz” e o ônus de uma crise mundial para a “nova matriz”. Assim é fácil demonstrar a superioridade de uma sobre a outra.
Quando realmente começou a “nova matriz”?
Abs,
O Poeta
"Assim é fácil demonstrar a superioridade de uma sobre a outra"
Pelo contrário. Caso queiramos marcar o começo da nova matriz em 2011, toda queda do pobreza seria anterior à ela e, portanto, nada poderia ser atribuído à nova matriz. Se eu quisesse moleza para provar meu ponto, "puxaria" a adoção da nova matriz para 2012/13.
De qualquer forma, o corte em 2008 é definido pela política fiscal. Até então o superávit primário ficava pouco acima de 3% do PIB; desde então a média (2009-12) caiu para cerca de 1,5% do PIB.
Alex,
Vc poderia ser ate mais sucinto pra resumir a um idiota desses o que ele escreveu.
Basicamente pega-se dinheiro emprestado e da-se para a grande maioria de pessoas pobres. Eh obvio que eles vao gostar. Quem nao gostaria?
O problema chegara no momento de pagar a conta, porque nao ta explicado no artigo da Folha de onde o dinheiro pra isso vira, uma vez que nao da mais pra arrancar impostos dos poucos que herculeamente conseguem produzir nesse pais com esses governantes brilhantes.
Eh soh olhar o grafico de gastos com pessoas x desemprego. Um eh exatamente o inverso do outro. Eh a velha politica do pao e circo misturada com voto do cabresto.
Ricardo C.
Sr. Alexandre,
"De qualquer forma, o corte em 2008 é definido pela política fiscal."
Ok! Eu não sabia desse critério.
Obrigado,
O Poeta
Janio é mais um jornalista chapa branca falando besteiras. Não perco meu tempo com este senhor, se não fosse pelo Mão Visível não o teria lido.
Alexandre, não dê Ibope para este analfabeto econômico!
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