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sexta-feira, 30 de novembro de 2012

4 segundos, mais ou menos

Cabeça brilhante no Jornal Nacional.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Dejà-vu

Nota: este artigo foi escrito em meados de novembro, antes de sair de férias. Tive que fazer pequenas alterações, por conta do que aconteceu desde então, mas deixei registrada a versão original, mesmo porque os acontecimentos recentes mostraram que o ponto central da coluna estava correto. Julguem vocês mesmo. Abs

Quando o próprio governo reconhece que o regime cambial é de “flutuação suja” é porque não restou flutuação, só sujeira. Nos últimos 6 meses (127 dias úteis) a taxa de câmbio ficou no intervalo de R$ 2,00/US$ a R$ 2,05/US$ em nada menos do que 106 dias, mais do que 80% do tempo. Como na história de Cachinhos de Ouro, o mingau parece era muito frio abaixo de R$ 2,00/US$ (apenas 8 observações) e muito quente acima de R$ 2,05 (modestas 13 observações). Apenas naquele intervalo é que as autoridades se sentem pareciam confortáveis.

Os motivos parecem eram claros. Abaixo de R$ 2,00/US$ recomeça a choradeira do setor industrial, à qual o governo não consegue resistir. Já o câmbio acima de R$ 2,05/US$ parece parecia gerar certo receio, talvez acerca da inflação, muito embora na lista de prioridades do governo ela apareça logo após o programa de corte das garras das harpias nos parques federais.

Resta saber se este estado de coisas é seria duradouro. Creio Desenvolvimentos recentes mostraram que não, em função do que vem ocorrendo no mercado de trabalho e do parco desenvolvimento no campo da produtividade.

Como tenho insistido há tempos, há sinais cada vez mais fortes que o mercado de trabalho se encontra apertado. Apesar do ritmo de criação de empregos ter se reduzido, em particular no segmento do trabalho formal, os salários prosseguem crescendo aceleradamente, algo como 8% no terceiro trimestre deste ano, na comparação com o mesmo período do ano passado.

Já o crescimento da produtividade, tomado ao pé da letra, tem sido negativo, pelo mesmo até o segundo trimestre. Na minha interpretação, mais caridosa, a tendência de expansão da produtividade é da ordem de 1,5% ao ano, positiva, mas ainda assim insuficiente para compensar o aumento de custos advindo da pressão salarial.

Neste aspecto, a salvação da lavoura, principalmente para o setor industrial, foi a depreciação da moeda. Medido em dólares o salário médio caiu de US$ 990 no terceiro trimestre de 2011 (o mais elevado da série) para cerca de US$ 860 no mesmo período de 2012, queda de 13%.

Todavia, a se manter o ritmo de crescimento dos salários, em um ano seu valor em dólar já estará ao redor de US$ 930 caso a taxa de câmbio permaneça inalterada, erodindo novamente a competitividade do setor industrial. Posto de outra forma, passa a ser questão de tempo para que o BC, guiado pelo Ministério da Fazenda, seja obrigado a migrar a taxa de câmbio para novo patamar, de modo a manter salários nacionais (ajustados à diferença de produtividade) alinhados aos dos concorrentes internacionais. Caso haja sensação de dejà-vu, não se espante: trata-se da mesma política cambial adotada na década de 70 e com implicações similares.

Por um lado, desvalorizações periódicas permitirão o repasse de preços internacionais, assim como observamos recentemente no caso das commodities agrícolas.

Por outro lado, o aperto no mercado de trabalho deve garantir que salários continuem subindo acima da inflação. Em particular isto implica que a inflação de serviços deve seguir rodando acima da inflação de bens.

Visto por outro ângulo, à medida que a economia se aproxima do pleno emprego a taxa de câmbio teria que se apreciar para aumentar as importações líquidas e, portanto, a oferta total de bens e serviços. Caso, porém, a política cambial não permita que tal ajuste se dê pelo barateamento do dólar, a apreciação ocorrerá pelo encarecimento do produto local.

A alternativa a esta política envolveria, por um lado, um controle mais estrito dos gastos públicos, em particular dos gastos correntes e, por outro, um conjunto de políticas dirigido à aceleração do crescimento da produtividade.

Considerando o que foi feito nestas áreas até o momento, contudo, consigo até entender porque preocupação com a inflação vem depois da manicure das harpias: sob este regime deve ser mais difícil trazê-la de volta à meta do que tentar apanhar os pássaros na unha.

- Ih, não funcionou...

(Publicado 28/Nov/2012)

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

¿Y si?


A pergunta mais importante em Economia é também a mais difícil de ser respondida: o que ocorreria caso, ao invés de adotarmos determinada política A, adotássemos a política B? Esta é também uma pergunta recorrente na vida comum: se tivesse entrado à esquerda, ao invés de à direita, teria chegado mais cedo ao trabalho? Ou, se tivesse me dedicado à Medicina, como queria minha mãe (de acordo com a tradição judaica o feto não é considerado viável até se formar médico), que caminhos minha vida teria tomado?

Algumas destas questões não têm resposta fora do campo da ficção, pois são experimentos únicos, para tristeza da minha mãe. No que tange a outras, porém, se há regularidades teóricas e empíricas, podemos imaginar como certos fenômenos teriam se desenrolado caso decisões diferentes tivessem sido tomadas em momentos cruciais.

Estava pensando nisso ao observar os desenvolvimentos recentes na Argentina. Não há de ter escapado da atenção do leitor mais atento a magnitude do protesto contra a presidente Kirchner, nem a queda abrupta de sua popularidade pouco tempo depois de sua reeleição.

A verdade é que a Argentina tem, há tempos, adotado um conjunto de políticas econômicas “heterodoxas” que, embora lhe tenha dado certo alívio por um período, foi minando gradativamente sua capacidade de crescimento.

A começar pela despreocupação com a inflação. No começo de 2004, tempos em que o Indec ainda era uma instituição confiável, livre do tacão do governo, a inflação havia recuado para níveis muito baixos (cerca de 2%), uma vez dissipados os efeitos da maciça desvalorização do peso no começo de 2002. A atividade econômica, por sua vez, vinha em franca recuperação e o país reunia, assim, as condições ideais para consolidar o controle da inflação.

Naquele momento crucial, contudo, mais uma oportunidade foi desperdiçada. As autoridades desprezaram a questão inflacionária e elegeram o crescimento como único objetivo. Ao final de 2005 a inflação já ultrapassava os dois dígitos e, para lidar com o problema, o governo recorreu a controles diretos de preços e subsídios; com o fracasso destes, passou a adulterar o índice de inflação. Hoje a inflação oficial se encontra ao redor de 10% nos últimos 12 meses, enquanto estimativas privadas sugerem um índice cerca de 3 vezes mais alto.

No que se refere ao desempenho fiscal a deterioração também foi marcante. O superávit primário do governo federal, que superava os 3% do PIB até 2008, vem em queda acentuada e equivalia a meros 0,3% do PIB no ano passado, evaporando ao longo de 2012.

Por fim, para a alegria de vários economistas pátrios, a taxa de câmbio argentina foi administrada, supostamente mantida a patamares que tornariam a indústria local competitiva. Obviamente, com a aceleração da inflação isso não passou de ilusão. A Argentina chegou a ter uma fatia de mercado equivalente a 9% das importações brasileiras (seu principal mercado, que absorve cerca de 20% das exportações platinas); hoje esta participação caiu para 7%, a menor em quase 20 anos.

Dados estes desenvolvimentos, o surpreendente não é que a Argentina esteja enfrentando problemas sérios; o inusitado, na verdade, é que estes tenham demorado tanto a se manifestar, provavelmente atenuados pelo forte aumento de preços das commodities, assim como pelo bom desempenho brasileiro entre 2004 e 2010.

O interessante é que, embora pouca se ouça dos nossos keynesianos de quermesse sobre a Argentina hoje, a combinação de política por ela adotada de 2004 para cá era cantada em verso e prosa como a receita para o Brasil crescer aceleradamente. O desempenho argentino pode ser considerado, contudo, como o que poderia ocorrer com o Brasil caso tivéssemos ouvido o canto das sereias heterodoxas. E também como o que pode nos acontecer a continuar a deterioração segura e implacável da nossa política econômica.

Una política muy amiga...

(Publicado 21/Nov/2012)

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Por que o tripé?


Qualquer analista que tenha mantido alguma conexão com a realidade já percebeu que o tripé econômico adotado a partir de 1999 não mais existe. Fingir que a fixação da taxa de câmbio, a incapacidade de atingir a meta para o superávit primário – apesar do volume extraordinário de receitas de dividendos – e a perda pelo terceiro ano consecutivo da meta de inflação (com mais duas perdas contratadas para 2013 e 2104) sejam apenas “pragmatismo” na operação do tripé revela um cinismo atroz, ou apenas a incapacidade de perceber que o ambiente econômico mudou, e não para melhor.

A própria relutância em reconhecer o abandono do esquema de política econômica já reflete certo desconforto. De fato, se houvesse uma alternativa superior, não veríamos tantos dos antigos opositores do tripé insistindo que ele está, sim, mantido.

Na verdade, a questão central quanto à escolha do modelo de política diz respeito ao regime cambial, isto é, se a taxa de câmbio se ajusta às forças de mercado, ou se é, de alguma forma, administrada.

Países que adotam regimes de câmbio administrado em geral o fazem por duas razões: ou são economias com um grande volume de comércio internacional, ou têm dificuldades em controlar a inflação.

Um exemplo do primeiro caso é a adoção do euro. As economias europeias, seja pela proximidade geográfica, seja pelo processo de integração no pós-guerra, se caracterizam por intensa atividade comercial; sob tais circunstâncias a taxa de câmbio fixa facilita as trocas, permitindo maior especialização e produtividade. Não por acaso, sempre que possível estes países tentaram manter taxas de câmbio fixas entre si, com fracassos espetaculares ao longo do caminho.

Já a Argentina de 1991, assim como o Equador hoje, representam os casos de países cuja incapacidade de lidar com o problema inflacionário acabou desaguando na “importação” da política monetária dos EUA, por meio da adoção do dólar.

O Brasil não se enquadra nestas alternativas. Do ponto de vista do comércio internacional somos um país relativamente fechado e com um componente considerável de commodities em nossas exportações. Já no que diz respeito à inflação, nossa experiência de poucos anos atrás mostra que um BC resoluto tem plena capacidade de mantê-la controlada.

Adicionalmente nos últimos anos o país se livrou das dívidas em moeda estrangeira e, com isso, dos riscos financeiros associados à flutuação da moeda, isto é, da possibilidade da depreciação cambial levar à quebra de empresas endividadas no exterior.

Por estes motivos deve ficar claro que o regime de câmbio flutuante é o que melhor serve ao país. Em caso de choques, como alterações em preços de commodities, ou nas condições de financiamento externo, a taxa de câmbio se ajusta, isolando, em grande medida, os efeitos destes choques sobre atividade e preços domésticos.

A decorrência lógica de tal regime cambial é a necessidade do BC se dedicar ao controle inflacionário, no caso pela adoção de um sistema de metas para a inflação, uma vez que não se pode contar com a política monetária de outros países para resolver o problema.

Dados os dois primeiros componentes, segue-se que o Tesouro deve dar as condições para que o BC exerça seu mandato, seja garantindo que a dívida pública se mantenha estável, sem o que nenhuma estratégia antiinflacionária é crível, seja auxiliando o controle da demanda interna.

Isto dito, o tripé é também uma metáfora feliz, pois sem uma das pernas a estrutura toda se torna instável. No caso, perdemos duas ao fixar a taxa de câmbio e ao permitir que o gasto público crescesse de forma a inviabilizar a meta fiscal, o que já comprometeria o controle inflacionário mesmo se o BC estivesse comprometido com a sua meta. Resta tentar segurar a inflação atuando diretamente sobre os preços. Nunca funcionou, nem para o Imperador Diocleciano, mas é a estratégia que sobrou.

Será que faltou fiscal?

(Publicado 14/Nov/2012)

domingo, 11 de novembro de 2012

Perguntas aos leitores

  1. 1. Imagine a seguinte situação. Dois blogueiros de economia esbarram em evidência incontestável de comportamento eticamente questionável de um professor de economia. Seria este um tema interessante para um post?
a.     Sim.
b.     Não.

  1. 2. Se você respondeu (a) à pergunta anterior, qual o melhor momento para um artigo apresentando evidência incontestável de comportamento eticamente questionável de um professor de economia?
a.     Na semana anterior ao encontro da ANPEC.
b.     Depois do encontro da ANPEC.

Momento pedagógico II

Stefan Alvino: 

“A existência do BNDES é sim fundamental, mas para financiar e tornar mais competitivo e baratos as produtividades que internalizam os custos "socioambientais". Exemplos são as energias limpas como a solar e eolicas, e os transportes de massa com poluição baixa como metro e VLTs. O que está faltando no BNDES é a adoção de criterios mais tecnicos na concessão de emprestimos e menos politicagem, mas isso logo logo acho que vai se resolver.” 

Mais um momento pedagógico! 

Eu diria que a existência do BNDES se deve à sua utilidade para os governantes de plantão. O BNDES é um instrumento que os governantes do dia usam para transferir recursos para seus plutocratas de confiança. Também é um instrumento de chantagem contra o empresariado. Esta é a razão de sua existência. Esta é a natureza da besta. 

Tal finalidade hedionda deve ser disfarçada da população, daí a necessidade de desculpas como custos ‘socioambientais’, política industrial etc. Às vezes ouvimos que o papel do BNDES seria crucial para financiar o investimento no Brasil, o que é grotescamente curioso, pois a vasta maioria dos países de desenvolvimento similar ao Brasil consegue investir mais que o Brasil sem depender de um banco estatal de desenvolvimento de tal dimensão. 

Agora, ouvimos dos custos “socio-ambientais”. Mas por que o BNDES seria necessário para financiar o transporte em massa? Não podem os governos de São Paulo ou do Rio, ou concessionarias do setor privado, emitir dívida? Não pode a União garantir tal dívida se existe algum motivo de bem-estar social ou externaliade justificando isso? 

Cínico que sou, desconfio que a raison d’être do financiamento por um banco estatal é evitar-se a disciplina do mercado e garantir que as obras possam ser superfaturadas. Como disse, esta é a natureza da besta. 

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Momento pedagógico

Ontem escrevi um post entitulado “A conta” que causou a seguinte reação de um comentarista anônimo: 

 "O que estaria causando a recessão atual da economia brasileira e quais seus mecanismos de transmissão???" 

Minha resposta é que a economia brasileira não está em recessão. Crescimento de 1.5 – 2.5 por cento é a nossa velocidade de cruzeiro sob as políticas econômicas atuais. 

 Não me refiro às ações concebidas para afetar a dinâmica de curto prazo (por exemplo, política monetária e estímulos pontuais ao consumo), mas sim ao modelo que enfatiza políticas que reduzem nossa taxa de crescimento de longo-prazo.

Especificamente, refiro-me à proteção a setores industriais que não são competitivos, a recusa de nosso governo em assinar um contrato de livre comércio com os Estados Unidos (ou liberalizar unilateralmente), a contínua existência do BNDES e suas ações que protegem firmas estabelecidas contra a entrada de competidores, as regras de exploração do pré-sal que afastam o investimento não-estatal, os altos salários do funcionalismo público que distorcem as escolhas de carreira de nossos jovens mais talentosos, a política educacional mais interessada em doutrinar as crianças do que prepará-las para ser produtivas, a baixa prioridade dada ao investimento na infra-estrutura etc. 

O Brasil é como aquele proverbial besouro cuja aerodinâmica não permitiria voar. Exceto que o besouro voa.

Pé trocado, peneira furada


Com a queda da taxa de juros parece ser disseminada a visão que agora o Tesouro, ao pagar menos pelo serviço de sua dívida, teria um espaço para gastar mais. Trata-se de um equívoco, seja do ponto de vista empírico, seja do ponto de vista teórico, mas que, concretamente, parece guiar o governo, que já reconheceu a incapacidade de cumprir a meta fiscal deste ano.

Tal noção se baseia em crenças que não correspondem ao que os dados revelam. A começar pela ideia que os gastos com juros teriam de alguma forma forçado o governo a controlar seus gastos, fenômeno que a realidade insiste em desmentir.

Com efeito, o gasto primário federal, que em 1997 equivalia a 14% do PIB (R$ 330 bilhões a preços de hoje), atingiu 18% do PIB nos 12 meses terminados em setembro (R$ 801 bilhões), crescendo 6% ao ano acima da inflação. Não sei no que crê o leitor, mas para mim isto não guarda a menor semelhança com um governo de alguma forma restrito por suas obrigações financeiras.

Além disso, a verdade é que, apesar da queda da taxa Selic, o gasto com juros caiu bem menos do que se imagina, de uma média de 5,4% do PIB nos últimos anos para 5,1% nos 12 meses até setembro. O “milagre” às avessas tem raízes nos pesados subsídios dados ao setor privado por meio das instituições financeiras federais.

Como o Tesouro cobra destas instituições menos do que lhe custa para tomar recursos no mercado, sua conta líquida de juros fica tanto mais cara quanto maior o volume emprestado a estas instituições. Em particular, de 2007 para cá estes empréstimos saltaram de 0,5% para 8,5% do PIB, cujo subsídio implícito aparece precisamente na conta de juros, agindo no sentido oposto ao da redução da Selic.

Mais importante, porém, do que os equívocos factuais é o conceito de que juros mais baixos permitiriam gastos mais altos. Isto seria, em alguma medida, válido anos atrás, quando a preocupação da política fiscal no Brasil dizia respeito à nossa capacidade de manter a dívida pública sob controle, debate semelhante ao que ocorre hoje nos países da periferia europeia.

Sob tais circunstâncias a meta de superávit primário está intimamente ligada ao tamanho e ao custo da dívida. Quanto maior seu custo, tanto maior o esforço fiscal necessário para evitar que isto se traduza em aumento da dívida, implicando custos ainda maiores no futuro, espiral que pode se tornar incontrolável. Neste caso uma redução da taxa de juros permite uma política fiscal menos apertada.

Todavia, há muito que o foco real da política fiscal no Brasil deixou de ser a questão de controle de dívida. É verdade que a dívida bruta brasileira, equivalente a 58,5% do PIB em setembro, não é exatamente baixa, mas não há sinais de crescimento descontrolado e mesmo um superávit primário inferior ao observado nos últimos meses manteria a dívida relativamente estável.

O verdadeiro problema da política fiscal no Brasil é o rápido ritmo de aumento do gasto público, que compete com o gasto privado (consumo e investimento) pelos mesmos bens e serviços. Assim, no momento em que a redução da taxa de juros deve elevar o ritmo de expansão do gasto privado, o ideal seria a moderação da despesa pública, em particular dos gastos correntes, que, ao contrário do investimento, não implicam aumento futuro da oferta.

Observamos, porém, precisamente o oposto. Os gastos correntes, já ajustados à inflação, aumentaram quase R$ 28 bilhões (0,8% do PIB) em 2012, enquanto os investimentos (à parte a inclusão este ano do programa Minha Casa Minha Vida nesta rubrica) se mantiveram inalterados e irrisórios, correspondendo a pouco mais de 1% do PIB.

Resumindo, do tripé original nada sobra: o câmbio é fixo, a meta de inflação uma miragem, e o compromisso da política fiscal derrete como um sorvete ao sol, a quem a equipe econômica tenta tapar com uma peneira a cada dia mais furada.

Sintonia


(Publciado 7/Nov/2012)

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Paródia hilária


É de matar de rir o artigo do Arnaldo Jabor de hoje, no qual ele parodia um típico liberal da elite 'iluminada' latino-americana destilando seu desprezo invejoso dirigido à matriz. De fato, uma peça de crônica de grande coragem! 

É uma obra-prima da idiotice fractal.

A conta


Fernando Leta Jr escreve:

"Quero só ver quando a conta dessa festa chegar."

Respondo:

E por que tu achas que essa conta não chegou ainda, Fernando? 

Já comparaste o que está acontecendo em terms de crescimento com os outros latino-americanos que são/eram nossos pares, Chile, Colômbia, Peru e México?

Segundo as projeções da Economist (que não diferem muito de outras projeções que conheço, por exemplo Consensus Forecasts) para 2012, enquanto o Brasil cresce 1.5 por cento, Chile, Colômbia e México crescem respectivamente 5.0, 4.4 e 3.9 por cento.


A conta já chegou. 

Nosso velho conhecido


Mantega: contingenciamento permitirá cumprir meta de superávit


BRASÍLIA- O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse nesta segunda-feira que o contingenciamento do Orçamento de 2012 não afetará os investimentos do governo, e que este valor -que ainda não foi anunciado- será o que viabilizará o cumprimento da meta de superávit primário.

"Vamos atrás do primário cheio em 2012, vamos conseguir fazer o primário cheio. E isso significa controle de gastos de custeio. Porém significa viabilizar todos os investimentos que serão necessários para ativar a economia", disse Mantega a jornalistas após a primeira reunião ministerial do ano.
"O corte será aquele necessário para viabilizar o superávit primário", disse.

meta deste ano é de 139,8 bilhões de reais, ou cerca de 3 por cento do Produto Interno Bruto (PIB), de todo o setor público, formado por governo central (governo federal, Banco Central e INSS), governos regionais (Estados e municípios) e empresas estatais.

Em 2011, o governo anunciou um corte de 50 bilhões de reais. Segundo disse uma fonte do Palácio do 
Planalto à Reuters, o valor do contingenciamento deste ano poderia chegar a 70 bilhões de reais, mas Mantega afirmou que a quantia ainda não está definida pelo governo.

De acordo com o ministro, o governo planeja anunciar o contingenciamento do Orçamento deste ano em meados de fevereiro.



O governo elegeu a política fiscal como sua principal arma para enfrentar a crise internacional. Será esse o grande diferencial do País em relação ao resto do mundo para se sair melhor do terremoto.
“Não haverá afrouxamento da meta fiscal em 2012 e nos próximos anos”, afirmou Guido Mantega, ministro da Fazenda, hoje, em conversa com pessoas próximas.
“Vamos continuar na rota da solidez fiscal, que é muito importante nesse momento de turbulência internacional.”

Mantega diz que governo não cumprirá meta de superávit das contas públicas


BRASÍLIA - A meta cheia de superávit primário do setor público, de R$ 139,8 bilhões, não será cumprida este ano, informou o ministro da Fazenda, Guido Mantega, em entrevista ao ‘Estado’. O governo vai abater do resultado parte dos investimentos realizados no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e do Minha Casa, Minha Vida. O tamanho do desconto ainda não está definido.

- Cumpre!
- Não cumpre!
- Não compra!
- Compra!
- Cansou?
- Não, sempre tem mais!

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Boundaries


• Taking the data at face value,  we find that GDP growth in the 4 quarters up to 2Q2012 has slowed down to 1.2%, while employment growth during the same period reached 1.9%, developments that suggest productivity coming down by 0.7%;
• That said, there are indications that labor productivity is procyclical, i.e., it tends to rise when the economy recovers and contracts as growth slows down. In light of this, we attempt to estimate how fast productivity should grow once the economy accelerates back, following the massive fiscal, monetary and credit impulses in place;
• Our estimates suggest that productivity growth can indeed reach above trend next year, around 2%, compared with trend growth close to 1.5% per annum;
• Yet, even with additional productivity growth we conclude that it is not possible to expand more than 3-3.5% next year without further tightening of the labor market. Indeed, growth in excess of these levels would require further increase in labor force participation, a variable whose trend – despite demographic transition – has remained remarkably constant during the past years.
• It is conceivable, however, that labor force participation deviates from the trend, as it has done quite a few times in recent years, at least for a while. If it reaches the maximum levels observed since the beginning of the series it can sustain growth in the vicinity of 4%;
• However, in order to lure workers into the labor force, wages would have to increase even faster than current observations (around 9-10% compared with the same period last year). These levels would still surpass, by a large margin, productivity growth, despite its procyclical nature;
• Hence, the ensuing increase in unit labor costs would translate into additional inflationary pressures for non-tradable goods, maintaining inflation still above target;
• As for the tradable sector, notably manufactures, rising unit labor costs would erode competitiveness, prompting renewed calls for protection and further currency depreciation, which local authorities are likely to oblige. I would not be surprised, thus, should authorities gradually move the exchange rate band from current levels in order to offset the impact of rising labor costs.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Anatomia de um choque


Não é segredo que o Banco Central trata o recente aumento do preço internacional de commodities agrícolas como um “choque de oferta”, com implicações fortes para a política monetária. Pressupõe-se que seja um fenômeno semelhante à elevação das tarifas de serviços públicos, ou dos preços de petróleo, que tendem a elevar a inflação e reduzir a renda, limitando a propagação do aumento inicial de preços.

Em tais casos o BC combate os chamados “efeitos secundários”, por exemplo, tentativas de repasse dos preços mais altos, mas acomoda o impacto do choque no intervalo ao redor da meta. Diga-se, aliás, tal intervalo existe apenas para tal fim, certamente não para que o BC mire a priori na parcela entre a meta e o limite superior do intervalo.

Diga-se também que, pela mesma lógica, no caso de um choque de oferta positivo, por exemplo, uma redução de tributos sobre um insumo relevante (energia?), o BC igualmente não deveria reagir ao efeito primário; apenas às reações que pudessem levar a inflação abaixo da meta, mas estas são apenas divagações de um obsessivo, não o ponto central do artigo.

A questão é saber se podemos caracterizar a seca nos EUA, que contraiu a produção agrícola naquele país, como um choque de oferta do ponto de vista do Brasil? Tenho dito que não. Os preços se elevaram, mas, como o Brasil é exportador líquido destas commodities, o efeito sobre a renda nacional é positivo: não há plantador nacional de soja chorando pela quebra da safra americana. Na perspectiva deste fazendeiro o que houve foi um aumento na demanda por seu produto, levando a preços internacionais mais elevados.

Na verdade, na visão do fazendeiro brasileiro o motivo para alegria é ainda maior. Não houve apenas aumento dos preços em dólar, mas também um aumento dos preços medidos em reais, elevando adicionalmente sua renda às expensas dos consumidores nacionais, em particular a fração mais pobre da população, cujo gasto com alimentos compromete parcela maior do seu orçamento (argumento algo demagógico, sim, mas não menos verdadeiro).

Alguém poderia imaginar que isto é inevitável: se os preços aumentam lá fora devem também subir por aqui e que, portanto, nada poderia ser feito, mas a evidência sugere precisamente o contrário.

Começo notando que de 2006 a 2010, a despeito de uma elevação considerável dos preços internacionais de commodities (em torno de 35%), os preços em reais subiram consideravelmente menos (9%). O motivo é claro: a elevação dos preços das commodities corresponde a um aumento dos preços das exportações brasileiras relativamente às importações. Tal melhora de termos de troca tende a fortalecer a moeda, atenuando o impacto dos preços.

Em contraste, a recente elevação de preços internacionais de commodities se traduziu integralmente sobre preços domésticos porque a taxa de câmbio, ao contrário do ocorrido anteriormente, foi mantida fixa.

Isto fica claro no contraste da experiência brasileira com a de países latino-americanos que, como o Brasil, são exportadores líquidos de commodities, mas que, ao contrário do que ocorre por aqui, mantiveram o regime monetário e cambial que vigorava até há pouco nestas plagas, a saber, metas para a inflação e câmbio flutuante.

Fonte: Autor, com dados do CRB, BCB, BCCh, BRC, e BCRP 

A comparação é reveladora: preços de commodities (índice CRB) medidos nas moedas destes países (Chile, Colômbia e Peru) têm caído desde o começo do ano, enquanto os preços em reais seguem pronunciada trajetória de elevação, mesmo antes da elevação dos preços em dólar, que permanecem algo abaixo de onde estavam no início de 2012. É óbvio que o desempenho distinto se deve ao comportamento díspar das moedas: enquanto o dólar encareceu 10% no Brasil, se tornou mais barato (de 3% a 8%) nas demais economias.

É interessante notar que, até 2010, estas moedas eram fortemente correlacionadas. Foi, portanto, a política brasileira de manipulação do câmbio que implicou a elevação dos preços domésticos de commodities. Caso a moeda flutuasse de verdade, o real provavelmente teria de apreciado em linha com as demais e estaria hoje entre R$ 1,70-1,80/US$. Neste caso os preços domésticos de commodities seriam em torno de 15% mais baratos e a inflação consideravelmente mais baixa.

Este resultado traz duas conclusões relevantes. Em primeiro lugar que, conforme argumentado, a elevação de preços domésticos de commodities nada tem de choque de oferta. Revela, além disso, os limites muito claros da possibilidade de manter a inflação na meta quando o BC tem como um de seus objetivos principais fixar a taxa de câmbio. Nada que não soubéssemos; apenas o que nossas autoridades resolveram ignorar.

Quem vai juntar os pedaços?


(Publicado 1/Nov/2012)