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terça-feira, 26 de setembro de 2017

Fake history e análise econômica

“You are entitled to your opinion. But you are not entitled to your own facts.”

(Daniel Patrick Moynihan)

"Never let the truth get in the way of a good story"

(Mark Twain)

Yoshiaki Nakano cometeu coluna na semana passada argumentando que as elevadas taxas de juros observadas no Brasil teriam origem na economia cafeeira, que dominou o país de meados do século XIX até a primeira metade do século XX.

Segundo Nakano, o cafeicultor “se assemelhava mais a um rentista do que um produtor preocupado com redução de custos. Seus lucros dependiam da extensão da sua posse de terras e de variáveis fora de seu controle, não do seu empreendedorismo ou espírito inovador.” Como recebia o pagamento uma vez por ano e tinha que guardar o dinheiro, preferia juros elevados. Por outro lado, como “consumia importados e passava parte do ano na Europa”, preferia uma taxa de câmbio apreciada. Por causa disto, conclui, até hoje temos que conviver com juro alto e câmbio apreciado...

Há vários problemas com o raciocínio, se cabe aqui o termo.

Quem já estudou o assunto deve ter ficado chocado com a caracterização do cafeicultor como um “rentista”. A economia cafeeira se caracterizava por grandes investimentos, pois, ao contrário de culturas anuais, pés de café precisam ser plantados com antecedência, bem antes da materialização das receitas. Posto de outra forma, cafeicultores eram, por natureza, empreendedores e, como tal, precisavam constantemente de crédito.

E, como algum leitor já deve ter notado, a produção de café não se destinava ao mercado interno, pois sequer um exército de bebedores do precioso líquido do meu calibre (6 a 9 xícaras de expresso por dia) dariam conta da produção local. Na qualidade, portanto, de exportadores, é curioso imaginar que cafeicultores pleiteassem uma taxa de câmbio mais apreciada. Ao contrário, as pressões do setor sempre foram no sentido de depreciar a moeda.

Só para lembrar, logo após a Proclamação da República, apoiada entusiasticamente pela cafeicultura, a política econômica foi caracterizada pela rápida expansão do crédito (o famoso Encilhamento, que começou ao fim da monarquia, por pressão do setor de café). Já o mil-réis, que comprava 27 pence em 1888, só conseguia comprar 7 pence 10 anos depois. Houve valorização para 11 pence por ocasião da política de estabilização de Joaquim Murtinho (1898-1902), mas já em 1906 foi criada a Caixa de Conversão, justamente para evitar a apreciação da moeda, por reivindicação do setor.

Vale dizer, cafeicultores não defendiam nem câmbio apreciado, nem juro alto, muito pelo contrário e qualquer um que tenha lido a respeito sabe disto, mas não, claro, Nakano. Não bastasse o ridículo de atribuir a persistência de altas taxas de juros a acontecimentos tão remotos, ainda erra sobre fatos que são de conhecimento comum.

Isto pode parecer implicância, mas, creiam, não é (só) o caso.

Há economistas que acreditam poder escrever sobre qualquer tema sem se dignar a verificar se há um mínimo de verdade nas afirmações que fazem. Ignoram fatos, mas querem que suas ideias sejam levadas a sério a ponto de influenciar decisões de política.

Argumentos no debate econômico têm que ser ancorados em boa teoria e, principalmente, em fatos. Infelizmente, o que mais vejo são “chutes” como o explorado acima, sem qualquer conexão com a realidade.


Não sei, sinceramente, como ainda dão importância para quem apresenta esta postura lamentável...



(Publicado 20/Set/2017)

33 comentários:

Não querendo dar razão ao raciocínio, se cabe aqui o termo, mas... Sendo a cafeicultura dependente de capital, como tratores, caminhões e adubo, e o Brasil não sendo lá um grande provedor desse capital, não seria de fato mais negócio ter o câmbio apreciado para baratear o custo de importação de capital?

Nakano, não desista! Tente a vinda de D. João VI ou a expulsão dos Jesuítas.

No fundo, a idéia (e da ideologia) desta versão é atribuir a culpa de todos os males do capitalismo bananense (seja juros alto, inflação ou unha encravada) ao rentista, elitista, capitalista opressor.

não sei se o Nakano é da turma dos campineiros, se não é, parece.

"Sendo a cafeicultura dependente de capital, como tratores, caminhões e adubo, e o Brasil não sendo lá um grande provedor desse capital, não seria de fato mais negócio ter o câmbio apreciado para baratear o custo de importação de capital?"

No século XIX e começo do século XX?


"(trator) No século XIX e começo do século XX?"

pensei a mesma coisa.
num dá uma vergonha-alheia???

LEO2CBH1

Nossa...'Jesus na causa'! Qual quer estudante de graduação que tenha feito 'Formação Econômica Do Brasil', ou a primeira cadeira de 'Economia Brasileira', conhece esse 'paper' ai do 'Gustavão'. Será que ele não conhece!? É muita 'safadeza' para um homem só! (kkk)

"Há economistas que acreditam poder escrever sobre qualquer tema sem se dignar a verificar se há um mínimo de verdade nas afirmações que fazem. Ignoram fatos, mas querem que suas ideias sejam levadas a sério a ponto de influenciar decisões de política."

Freud explica...

O grande gasto de um cafezal é mão de obra. Café bom é colhido a mão, só os grãos maduros...

O senhor fez o mesmo movimento do Gustavo,saiu do PSDB e foi o para o Partido Novo?

http://www.valor.com.br/politica/5136408/formulador-do-real-gustavo-franco-deixa-psdb-e-se-filia-ao-novo

Para sair do PSDB eu precisaria primeiro entrar nele...

O senhor não faz parte dos economistas que fazem parte do PSDB?

Como não? O senhor não faz parte do grupo de economistas que é filiado ao PSDB?


De onde você tirou esta ideia? Do mesmo livro do Yoshiaki?

Marcos Lisboa,Samuel Pessoa,Arminio Fraga,Elena Landau,Mansueto Almeida todos eles são filiados ao PSDB,aprecem nos principais eventos do PSDB.

O que achou desse artigo, Alex?

http://www.valor.com.br/opiniao/5138222/transparencia-monetaria-que-tal

Abs
Pedro Castro

Prezado Alexandre,

Este seu post me lembrou a tese da Dominância Fiscal reativada pela Mônica de Bolle (hoje ela nem fala mais estranhamente) e a tese do Lara Resende sobre os juros (que gerou todo aquele debate no Valor).

Esta gente é tão criativa.

Um abraço.

Alexandre, curtiu o debate Braulio vs Dudu e Samuca? Acha o Braulio bom economista?

Bjo, Lu

"Alexandre, curtiu o debate Braulio vs Dudu e Samuca?"

Não vi debate... Vi um massacre...

Alex, não saiu do PSDB porque nunca entrou. Mas, como eu, deve ter votado no Aecio. Arrependimento mata?

PSDB foi o percursor das ideias liberais no Brasil,pensei que o senhor como economista fizesse parte desse Grupo.

"pensei que o senhor como economista fizesse parte desse Grupo."

Pensou?

"Arrependimento mata?"

Não chega a tanto. Obviamente, dada a nova informação, não votarei mais nele e defendo que o Senado permita que ele seja processado.

Onde está esse debate (ou massacre) do Samuel, dudu e Braulio?

http://blogdoibre.fgv.br/posts/o-impacto-da-nova-matriz-economica-resposta-braulio-borges

http://blogdoibre.fgv.br/posts/o-impacto-da-nova-matriz-economica-resposta-braulio-borges

Por que não premiram o Tombini?

http://www.valor.com.br/financas/5141728/ilan-goldfajn-e-eleito-melhor-banqueiro-central-da-america-latina?utm_source=Facebook&utm_medium=Social&utm_campaign=Compartilhar

"Por que não premiram o Tombini?"

Porque não existe prêmio para banqueiro central mais submisso, senão seria barbada...

Alexandre, vai me desculpar, mas nao houve massacre algum. O braulio saiu-se muito bem no debate comtra samuel e dudu. A questao do controle sintetico para resolver a polemica é ridicula. Quem trabalha com o metodo sabe das gigantescas fragilidades do mesmo, especialmente quando a intervencao nao é muito bem definida e idiossincratica. Enfim, acho que o braulio mandou bem...

"Quem trabalha com o metodo sabe das gigantescas fragilidades do mesmo, especialmente quando a intervencao nao é muito bem definida e idiossincratica."

Ainda assim, muito superior a comparar o país a um grupo escolhido a dedo, incluindo a Venezuela. E, francamente, usar consumo de energia ao invés do PIB (mas só quando convém), é lamentável...

Vc ja leu a treplica parte 2? Da uma olhada e veja se houve uma escolha a dedo...

Até que o Braulio está se defendendo bem! Aposto que os próprios Samuca e Dudu admitem isso e não classificariam o debate como um "massacre"...

Ansiosamente aguardo mais uma réplica de Samuca e Dudu!!