A queda do PIB no primeiro trimestre do
ano, 1,5%, reflete apenas o impacto do ocorrido em março, o que sugere uma
retração bíblica no segundo trimestre. Não devemos esperar uma recuperação
rápida da crise.
Desta
vez analistas conseguiram cravar a projeção do PIB do primeiro trimestre do
ano, que caiu 1,5% na comparação com o último trimestre de 2019, já ajustado à
sazonalidade. Resta saber, contudo, quanto da queda resultou dos efeitos da
epidemia e quanto pode ser atribuído à dinâmica que prevalecia até os idos de
março.
Nas
minhas contas, o resultado negativo do PIB no período resulta integralmente da crise
sanitária, ainda que esta tenha se materializado apenas no final do trimestre. Se
estiver correto, as perspectivas para os números do segundo trimestre (e do ano
como um todo) são ainda mais sombrias do que a mera leitura dos dados
divulgados na semana passada poderia sugerir.
Não
temos, é bem verdade, estimativas do PIB em frequência mensal que nos permitam
aferir com precisão como estávamos imediatamente antes do choque, mas há alguns
dados que iluminam em alguma medida a questão. O BC, por exemplo, calcula um
índice de atividade econômica mensal que busca antecipar, senão o PIB
propriamente dito, ao menos o comportamento geral da economia, combinando dados
da produção industrial, vendas no varejo e atividade de serviços, entre outros
indicadores.
Tal
índice, o IBC-Br, mostrava crescimento de 0,1% em janeiro e 0,4% em fevereiro,
sempre na comparação com o mês imediatamente anterior (e sempre corrigidos pelo
padrão sazonal!). Caso o ritmo de crescimento se mantivesse em março próximo do
observado no início do ano, o indicador mostraria crescimento modesto, na casa
de 0,1-0,2% no primeiro trimestre (o PIB provavelmente um pouco mais). Todavia,
o IBC-Br registrou queda de quase 6% em março, a pior marca da história,
superando por larga margem o observado nos meses finais de 2008, sob impacto da
crise financeira internacional, correspondente a uma queda de 1,9% no
trimestre, maior até do que a observada para o PIB.
Da
mesma forma, dados do mercado de trabalho contam a história de uma reversão
brusca. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, PNAD, principal
fonte para tais fins, revelava expansão moderada da ocupação total
(dessazonalizada), em torno de 100 mil postos de trabalho no bimestre. Já o Cadastro
Geral de Empregados e Desempregados, CAGED, que mede apenas o emprego com
carteira assinada, registrava o melhor primeiro bimestre desde 2011,
correspondendo a uma média dessazonalizada pouco abaixo de 180 mil/mês, bem
superior à observada no trimestre final de 2019 (74 mil/mês).
Assim,
muito embora a correspondência entre os dados de produção e de emprego (em
particular o emprego formal) não seja das mais sólidas em frequência tão alta,
também esse conjunto de indicadores apontava para mais um trimestre de
crescimento modesto antes do impacto da crise sanitária. Essa não é uma boa
notícia.
De
fato, se os números mensais conseguem capturar em algum grau como a economia
estava antes da crise, a queda registrada no trimestre resultaria, como
antecipamos, apenas do comportamento de março, possivelmente sequer o mês todo.
Posto de outra forma, se poucas semanas bastaram para nos levar ao pior
trimestre desde o segundo de 2015, a queda a ser observada daqui a três meses
deve deixar comendo poeira todas as retrações desde 1980, quando tem início a
mensuração trimestral do produto.
Os
poucos números disponíveis corroboram esta tese. O nível de ocupação, medido
pela PNAD, caiu de 92,9 milhões no primeiro trimestre para 89,7 milhões nos
três meses terminados em abril, voltando aos níveis de meados de 2017, ainda no
início da recuperação do emprego, isto é, perdemos quase três anos em apenas
dois meses. No caso do CAGED a destruição em março e abril atingiu 1,2 milhão,
correspondente a quase 2 anos de geração de empregos formais.
De
forma preliminar, tal comportamento indica queda pronunciada do PIB no segundo
trimestre, possivelmente ao redor de 9-10% na comparação com o primeiro
trimestre.
Ao
mesmo tempo, famílias e empresas estão com suas finanças fragilizadas,
indicando restauração lenta do consumo e do investimento, apesar da rede de
proteção social. A provável persistência de focos infecciosos também joga
contra, assim como o desaparecimento de uma massa ainda desconhecida de empresas,
que dificilmente sobreviverão à crise.
Assim,
muito embora a economia deva se recuperar na segunda metade do ano, quando,
esperamos, o efeito da epidemia esteja em reversão (mais uma torcida que uma
certeza), não contamos com o retorno rápido aos níveis que prevaleciam antes da
crise. Mesmo contanto com crescimento que seria rápido em condições normais (de
1% a 1,5% por trimestre), a retração do PIB no ano não deve ser inferior a
6,5%, provavelmente na casa de 7% a 7,5%, caso não haja uma segunda onda de
Covid19.
Não
contem, portanto, com o “V” do ministro; o alfabeto da recuperação,
infelizmente, começa com “U”.
(Publicado 3/Jun/2020)
3 comentários:
tenho medo das consequencias poltiicas disso. ja to imaginando o pior, mantega 2022
voce poderia fazer um comentario sobre a expropriacao na argentina? abracos
O Ano de 2021 sera ainda maior o caus!
João Neto
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