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terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Ignorância sem fronteiras

Já com a coluna da semana passada pronta, destacando as semelhanças entre a provável política econômica do governo Trump e a malfadada “nova matriz” (combinação de protecionismo e expansão fiscal numa economia próxima ao pleno emprego), fui surpreendido (mas não muito) pela declaração de Peter Navarro, diretor do Conselho Nacional de Comércio Exterior, acusando a Alemanha de deliberadamente desvalorizar o euro para estimular suas exportações.

Se algo faltava, a ressurreição da “guerra cambial”, delírio do nada saudoso ministro da Fazenda Guido Mantega, deve ser mais do que suficiente para convencer os céticos sobre os riscos de aproximação da política econômica nos EUA com o experimento fracassado do Brasil.

Há um quê de realidade na afirmação, que, porém, não a torna correta. É bastante razoável imaginar que, caso a Alemanha tivesse mantido sua moeda, ao invés de embarcar no euro, o hipotético marco alemão deveria estar mais valorizado do que a moeda única. A Alemanha cresce mais do que a média da Zona do Euro (ZE) e sua taxa de inflação, ainda que modesta, é, pelo menos desde 2013, mais alta do que a observada no restante do bloco. Assim, se o Bundesbank ainda fosse o responsável pela gestão da política monetária, as taxas de juros alemãs seriam mais altas do que de fato são, levando a um marco mais forte do que o euro atualmente.

Não se segue disto, contudo, que a Alemanha tenha manipulado o euro. A começar porque não é ela quem define a política monetária, mas sim o conjunto de países que pertencem à ZE, de modo que a taxa de juros não é necessariamente a ideal para cada país, mas, ao menos em tese, para a “média” da região.

Não é por outro motivo, aliás, que há um claro desconforto alemão com a condução da política monetária. Mais de uma vez o presidente do Bundesbank, Jens Weidmann, se opôs às medidas de afrouxamento monetário e o establishment alemão tem se posicionado persistentemente contra as baixas taxas de juros praticadas pelo BCE. Em suma, a Alemanha não pode baixar artificialmente a taxa de juros e, mesmo se pudesse, tem dado mostras de que escolheria o curso oposto.

A fraqueza do euro reflete, portanto, em parte a decepcionante recuperação europeia e, em parte, a força relativa da economia norte-americana, expressa na perspectiva de normalização de suas taxas de juros a um ritmo bastante superior ao esperado para a ZE.

De fato, a política fiscal mais frouxa nos EUA, no contexto de um mercado de trabalho muito próximo de seu potencial, deve aumentar as pressões inflacionárias e, portanto, acelerar o ritmo de elevação da taxa de juros, fenômeno que deve contribuir para fortalecer o dólar face às demais moedas. Da mesma forma, maior proteção contra a concorrência externa atua também no sentido de apreciar o dólar.

Assim, se Navarro, um dos principais conselheiros de Trump nas questões de comércio internacional, já acredita que “a Alemanha está usando o euro imensamente desvalorizado para explorar os EUA e seus parceiros da União Europeia”, deverá ficar ainda mais preocupado quando esta tendência se materializar, desfazendo parcialmente os efeitos da proteção comercial.

Não é consolo algum, mas a ignorância não tem fronteiras.

* * *


À memória do meu pai (6/12/1932 – 4/2/2017)



(Publicad0 8/Fev/2017)

18 comentários:

A sorte deles é que pelo visto as cagadas politicas nao vao chegar no FED, como aconteceu aqui no BC.

"A sorte deles é que pelo visto as cagadas politicas nao vao chegar no FED, como aconteceu aqui no BC."

O mandato da Yellen acaba daqui a um ano...

"O mandato da Yellen acaba daqui a um ano..."

Mas as opcoes para o novo Chair somente dentro do proprio board do FED se nao me engano. Pelo menos tem essa blindagem.

Alexandre,

O que você acha do argumento de Balance Sheet Recession" do Economista Richard Koo?

Laura

Curioso é ver por aí (não aqui, obviamente) pessoas que se dizem liberais colocando o Trump sapiens em um pedestal.

Meus sentimentos, Alex.

E essa volta do inflacionismo aqui no Brasil, hein Alex? Essa galera tem influência pra fazer estrago?

Veja o que Netanyahu declarou: Não há “maior partidário do povo judeu e do Estado judeu do que o presidente Donald Trump”.O senhor esta indo contra o estado de Israel com suas criticas Trump?

Os inflacionistas estão por ai livres leves e soltos ,sem arrependimentos; os delfins ,os bellezzas...disponíveis para mais uma assessoria .

"O senhor esta indo contra o estado de Israel com suas criticas Trump?"

Tomara que sim, mas, vindo do Netanyahu, acho que a direção é oposta

unrelated... impressão minha ou o Oreiro anda meio ortodoxo ultimamente?

Meus sentimentos a vc e sua familia. Sou fa do seu trabalho.
Ja pensou em escrever um livro?
A resposta deve ser um sonoro "sim", a duvida mesmo eh qdo kkkkkk
Grande abraco.

Fico na dúvida, quem tem o cabelo mais horrível, o Pointy Hair Boss, ou o Trump? Os dois são personagens em quadrinhos, mas um vai virar história em pouco tempo. Esses ignorantes salafrários serão um "footnote".

Até lá o bom é assistir SNL com Alec Baldwin...

Opa, Alexandre. São Paulo e vários outros municípios sofrem com o problema do déficit no sistema de transporte público. Queria saber se você conhece algum estudo que envolva eficiência e qualidade dos sistemas de transporte ao redor do mundo no qual, talvez, o Brasil possa se encaixar. Já vi em casos estrangeiros que a Grécia lá pra 2012 teve um problema com esse sistema e como rever e adequar essas ideias de meia-entrada e passe livre? Abraço.
Na minha opinião, é algo feito sem uma fiscalização adequada e se concede o beneficio aos montes sem um controle orçamentário x renda do beneficiário.

Que os momentos felizes vividos juntos lhe consolem e à sua família,
que os ensinamentos e os exemplos positivos lhe acompanhem,
que suas ações, Alex, honrem a sua memória.

Meus sinceros pêsames.

Jeca Tatu

Nunca houve uma critica sua as politicas do governo Obama contra o Obamacare,o alto deficit publico,a regulamentação do mercado financeiro,a desastrosa politica externa de Obama que fez o acordo nuclear contra o Iran.

Enquanto Donald Trump é um sujeito de direita, defende o estado de Israel e vai desfazer todas as politicas desastradas de Obama,o senhor resolve pegar no pé dele.

Caro Alex o senhor como judeu poderia assinar a petição "Queremos Jair Bolsonaro no Hebraica",além de divulgar essa petição em seu blog?

http://www.peticaopublica.com.br/pview.aspx?pi=BR97878