quinta-feira, 29 de janeiro de 2015
quarta-feira, 28 de janeiro de 2015
Olecranoalgia
Em outros tempos classificaria
o choramingo de Luiz Gonzaga Belluzzo sobre a alteração da política econômica como
dor-de-cotovelo. Já hoje estou convencido de que se trata precisamente
disto. Depois de capitanear há pouco um manifesto a
favor da presidente e da política então vigente, afirma não considerar a
mudança “uma traição, e sim, submissão”. A presidente teria
capitulado “diante das pressões de mercado, assim como os líderes europeus”.
Parece menos grave do que “traição”, mas o efeito final é o mesmo: ao menos por
ora o governo não parece (ainda bem!) disposto a seguir suas recomendações.
Mansidão à parte, é
claro que houve capitulação. Não, é bom que se diga, diante do “mercado”, esta
entidade incorpórea que leva a culpa quando os “keynesianos de quermesse” se
sentem traídos. O que levou à rendição foi o desempenho pífio da política
econômica que vigorou no primeiro mandato, pela qual Belluzzo, como interlocutor privilegiado da
presidente,
foi um dos responsáveis.
A “nova matriz
macroeconômica” pôs em prática exatamente as prescrições de economistas como
ele, que em momento algum discordou do que foi adotado. Do lado fiscal o gasto
federal cresceu como nunca, atingindo no ano passado um aumento de R$ 193
bilhões relativamente ao observado em 2010, já deduzida a inflação. Disto,
menos de R$ 20 bilhões correspondeu a investimento adicional, mesmo colocando
no bolo a partir de 2013 os gastos ligados ao Minha Casa, Minha Vida, o
que superestima a ampliação do gasto de capital.
Os bancos públicos
também emprestaram como se não houvesse amanhã. Apenas no BNDES o volume de
crédito saltou de 9,4% para 12,1% do PIB em quatro anos (R$ 170 bilhões em
dinheiro de hoje), praticamente todo financiado pelo aumento da dívida do
Tesouro Nacional, cujos repasses para o banco atingiram R$ 160 bilhões no
período.
Seguindo as
recomendações da “nova matriz”, a moeda sofreu desvalorização. Além das
intervenções regulatórias (limites às vendas de dólar, IOF sobre ingressos, etc.),
o Banco Central comprou cerca de US$ 63 bilhões em 2011 e 2012, trazendo o
dólar de R$ 1,60-1,70 para R$ 2,10-2,20 entre 2011 e meados de 2013. No mesmo intervalo
as demais moedas latino-americanas se apreciaram relativamente ao dólar,
sugerindo que se tratou de política deliberada e não um movimento global, como
o observado nos últimos meses.
Já o BC, mesmo em face
de inflação acima da meta e crescente, insistiu em reduzir a taxa de juros de
2011 a 2012. Apenas a ameaça da inflação superar o limite máximo de 6,5% é que
fez o Copom correr, tardia e relutantemente, atrás do prejuízo.
Por fim, com as
dificuldades de conter a inflação, houve recurso a controles diretos de preços,
dos combustíveis à energia, passando pelas tarifas de ônibus urbanos,
intervenção tosca que desarticulou, entre outros, os setores sucroalcooleiro e
energético, para não mencionar o desastre nas finanças da Petrobras, que se
tornou a empresa de petróleo mais endividada do mundo.
Os resultados estão aí:
crescimento de 1,5% ao ano, inflação superior a 6% ao ano, déficits externos
crescentes e uma dívida pública que saltou de 53% para 63% do PIB (aumento de
R$ 1,2 trilhão). Em português castiço: deu com burros n’água...
A política agora
adotada vem para corrigir as bobagens cometidas em nome da “nova matriz”,
alegremente apoiada por Belluzzo. Já dizia Guimarães Rosa: “sapo não pula por
boniteza, mas porém por precisão”.
Na ausência do ajuste
fiscal não há como permitir o encarecimento do dólar sem efeitos ainda mais
perversos sobre a inflação (enquanto na Europa, ele parece ignorar, o problema
é a deflação), nem como reverter a tendência de aumento da dívida pública.
Há de custar caro? Há,
mas o custo de por em casa em ordem, é bom deixar claro, é responsabilidade daqueles
que a desarrumaram e Belluzzo fez parte, com gosto, deste time, não por acaso a
caminho da Segundona.
Ai... |
(Publicado 21/Jan/2014)
terça-feira, 27 de janeiro de 2015
segunda-feira, 26 de janeiro de 2015
quinta-feira, 22 de janeiro de 2015
quarta-feira, 21 de janeiro de 2015
Juras de amor e convergência
Parece incrível, mas houve quem tecesse loas ao legado
de Guido Mantega no ministério da Fazenda, em especial à inflação
de 6,4% no ano passado, muito embora esta tenha superado a meta em quase dois
pontos percentuais, no limite máximo permitido, e mesmo assim à custa de
controles de preços que desarrumaram ainda mais a economia.
Se, porém, o elogio é pernicioso,
pior é a tentativa fajuta de vender a ideia que a inflação elevada é um
“problema estrutural”, sina da qual o país não pode escapar.
Segundo esta
historinha, no governo Dilma a inflação ficou em 6,2% ao ano, apenas um pouco
acima do observado no governo Lula, quando a média atingiu 5,8% ao ano. Assim,
de alguma forma, a inflação brasileira “tenderia” a um patamar ao redor de 6% e
o melhor seria se acostumar com esta ideia.
Não é preciso muito
para localizar os furos do argumento. A começar pelo uso da média, conceito
que, se mal utilizado, serve para revelar apenas o que se deseja, ocultando o
fundamental. De fato, no governo Lula a inflação média ficou em 5,8% ao ano,
mas isto esconde que no segundo mandato caiu para 5,1% ao ano, bem inferior aos
6,4% ao ano observados entre 2003 e 2006.
Aliás, mesmo este
número é exagerado, pois reflete em grande medida os impactos da crise política
de 2002, visíveis na elevada inflação do primeiro trimestre de 2003 (5,1%). Entre
abril de 2003 e dezembro de 2006 a inflação registrou 5,4% ao ano.
Fica claro, portanto,
que a inflação veio em queda durante o governo Lula, ainda que com oscilações
ao longo do processo. É no governo Dilma que a trajetória se inverte, apesar do
uso generalizado do controle de preços.
Mais importante, porém,
é o desvio da inflação com relação à meta, lembrando que a meta foi mais alta
no período 2003-2006 do que nos anos subsequentes, quando estacionou em 4,5%. Durante
os oito anos do governo Lula o desvio médio foi 0,7% por ano, praticamente
igual nos dois mandatos. Já no período 2011-14 atingiu 1,7% por ano, um ponto
percentual a mais do que o observado anteriormente.
Resumindo, o governo
Dilma foi marcado por inflação mais alta e ainda mais distante da meta. Nenhum
destes processos é consistente com a noção de uma “inflação estrutural”, contra
a qual pouco se pode fazer. Pelo contrário, se a inflação subiu, isto significa
necessariamente que ela já foi mais baixa e que, portanto, não há nenhum
obstáculo intransponível para a obtenção de resultados melhores do que os
registrados no período mais recente.
Faltou, é claro, uma
atuação mais destemida do BC. Desde muito cedo o Copom deixou de perseguir a
meta, fato revelado pela redução da taxa de juros mesmo em face de inflação
corrente e esperada crescentes, na contramão do indicado por qualquer compêndio
de política monetária.
Agora, mais uma vez, o
BC promete trazer a inflação de volta à meta em 2016, devoto do “fiado só
amanhã”. No entanto, ao explicar a alta inflacionária em 2014 seu presidente se
apressa ao negar qualquer responsabilidade, atribuindo o problema ao encarecimento do dólar e ao aumento
dos preços administrados.
Deixa convenientemente
de lado o represamento a que estes preços foram sujeitos em anos anteriores,
assim como a pesada intervenção no mercado de câmbio. Satisfeito com isto, o BC
não agiu para reduzir a inflação.
Tivesse o BC feito o
que era necessário, os impactos do dólar e dos preços administrados (que devem
se repetir este ano) implicariam riscos bem menores quanto ao possível
“estouro” do limite superior da meta.
O primeiro passo para recuperar
a credibilidade do BC seria o reconhecimento da sua responsabilidade no
processo, assim como o bom diagnóstico é base para a cura.
O histórico de inflação
acima da meta já não ajuda, mas, sem o mea
culpa, fica ainda mais difícil acreditar em nova jura de convergência,
principalmente em face dos números que nos aguardam no começo de 2015.
Agora à vera |
(Publicado 14/Jan/2015)
terça-feira, 20 de janeiro de 2015
quinta-feira, 15 de janeiro de 2015
quarta-feira, 14 de janeiro de 2015
Tirocínio mínimo
Como sempre, a
presidente não desperdiçou a chance de perder uma oportunidade. Ao publicamente
advertir seu recém-empossado ministro do Planejamento acerca das mudanças nas
regras que determinam o reajuste anual do salário mínimo (SM) ela conseguiu a
proeza de cometer erros econômicos e políticos absolutamente primários.
De acordo com a norma
vigente o SM é reajustado pela inflação do ano anterior (medida pelo INPC, o
“irmão pobre” do índice oficial de inflação, o IPCA), combinada ao crescimento
do PIB de dois anos atrás.
Por exemplo, o INPC de
2014 deve ter atingido em torno de 6,2%, enquanto o crescimento do PIB de 2013
ficou em 2,5%. Assim, o reajuste do SM foi acertado (provisoriamente, pois
ainda precisamos saber o INPC de dezembro) em 8,8%, o que o trouxe de R$ 724,00
para R$ 788,00 por mês.
A regra atual implica,
portanto, aumento do SM persistentemente acima da inflação (o crescimento do
PIB pode ser negativo, mas, na prática, quando isto ocorre o reajuste fica
igual à inflação), o que, aliás, se observa desde a estabilização da economia
em 1994. No governo FHC o SM aumentou 4% ao ano acima da inflação, enquanto nos
governos Lula e Dilma este ganho atingiu 4,8% ao ano. De 1994 para cá,
portanto, houve aumento real superior a 140%.
O problema, no caso, é
que boa parte do gasto federal está de alguma forma ligado à evolução do SM, em
particular as despesas previdenciárias. Estima-se que a cada 10% de aumento do
SM os gastos subam cerca de R$ 25 bilhões/ano (0,5% do PIB), ou seja, em 2015 a
elevação já definida adiciona algo como R$ 22 bilhões (0,4% do PIB) às despesas
federais.
À luz disto, qualquer
economista que tenha estudado as contas públicas sabe que a política de aumento
persistente do SM acima da inflação é insustentável. O atual ministro do
Planejamento – que aparentava desconhecer o problema enquanto esteve na equipe
de Guido Mantega – parece ter finalmente se convencido de sua relevância. Daí
seu anúncio, rapidamente desmentido, sobre as alterações das regras atuais.
No entanto, a bronca
presidencial pública parece não ter considerado uma série de questões.
A mais óbvia diz
respeito à autonomia da equipe econômica. Como já tive oportunidade de explorar
neste espaço, a única forma de a
presidente persuadir o público que não pretende manter a desastrosa “nova
matriz macroeconômica” requer uma equipe que não se sujeite ao papel de
marionetes, como foi o caso do primeiro mandato. Há dúvidas consideráveis a
este respeito (eu, por exemplo, sigo longe de convencido) e o episódio da
bronca apenas adiciona ao clima de incerteza. Isto implica custos mais elevados
em termos de produto para ajustar a economia.
Não bastasse isto, as
regras vigentes já resultariam numa elevação muito modesta do SM em 2016 e
2017, pois o crescimento do PIB em 2014 e 2015 deve ser muito baixo, conforme
expresso na versão mais recente da pesquisa Focus do BC, que sugere
expansão de 0,15% e 0,50% respectivamente.
Posto de outra forma, a
presidente diminuiu de graça a estatura de seu ministro, pagando um custo
elevado em termos de credibilidade em troca da sugestão de manter uma política
que implicaria ganho real do SM inferior a 1% nos próximos dois anos.
É compreensível que a
presidente esteja na defensiva após ter quebrado as promessas de não mexer nos
direitos trabalhistas (“nem que a vaca tussa”), mas isto não é
desculpa para ter incorrido em erro tão elementar.
Neste aspecto é
revelador que a presidente não pareça ter refletido sobre a melhor resposta a
um problema que, no final das contas, seria trivial em face das circunstâncias
esperadas. Ela ainda não caiu em si sobre a enormidade da tarefa que enfrenta e
segue tentada a manter a atitude centralizadora, deixando pouco espaço para sua
nova equipe formular o ajuste necessário. Um péssimo sinal sobre o que nos
aguarda à frente.
Ops! |
(Publicado 7/Jan/2015)
terça-feira, 13 de janeiro de 2015
segunda-feira, 12 de janeiro de 2015
João Sicsú bate seu próprio recorde de desonestidade intelectual!
Que João Sicsú é intelectualmente
desonesto não mais se discute. Ainda assim, porém, há momentos em que ele
consegue nos surpreender. Leiam, se tiverem estômago, mas posso sintetizar a
mensagem para vocês.
Há
3 fases de política econômica. Quando o país cresceu, foi porque seguiu nossa
política. Quando não cresceu, foi porque seguiu a política neoliberal.
Sério.
Vejam só: “A primeira fase obteve resultados pífios ou
medíocres. Tudo muito semelhante ao segundo mandato de Fernando Henrique
Cardoso.” Só não contou que a na tal “primeira fase” o crescimento do PIB
atingiu 3,5% ao ano, mesmo com o 2003 complicado pelo medo do que gente como
Sicsú poderia fazer.
Entre 2004 e 2006 o país
cresceu 4,2% ao ano. A inflação, 9,3% em 2003, caiu para 3,1% em 2006. A conta
corrente foi positiva em todos aqueles anos. Como se vê, um resultado pífio.
Mas o pico da desonestidade
(o que não é qualquer coisa quando se trata de Sicsú) é o seguinte:
“O ano de 2011 é um marco. Tem início a terceira fase. O debate morre,
na mídia e no governo. Grandes quadros progressistas ou de esquerda, aos
poucos, saem de cena. Os movimentos sociais estão adormecidos. As políticas de
Palocci e Meirelles voltam com força total: juros subiram, superávit primário
foi elevado, houve contenção do crédito e o câmbio flutuou livremente para
baixo. Os resultados se tornam pífios a partir de então.”
Fantástico! No mundo
mágico de Sicsú a tal “nova matriz macroeconômica” nunca existiu, o BC não
reduziu a Selic para 7,25%, o superávit primário não desapareceu e o estoque de
crédito do BNDES não cresceu 15% ao ano. A política econômica dos últimos 4 anos
não tem nada a ver com as recomendações campineiras. Além de desonesto, não
assume responsabilidades.
Apesar de ser um
desserviço à higiene, o artigo original e o link seguem abaixo. Aí poderão ver
se exagerei...
Adendo (13/Jan/2015)
Adendo (13/Jan/2015)
Um amigo, com mais estômago que eu, desencavou a seguinte pérola:
"A economia começou a reagir, de fato, no início de 2013, quando começaram a ser dissolvidos os efeitos provocados pela política contracionista de 2011. No primeiro trimestre do ano, o investimento cresceu mais que a economia – deu sinais que a forma do crescimento poderia se assemelhar à Era Lula. O resultado do 2º tri já foi bem melhor que o do primeiro. O PIB cresceu 1,5% em relação ao trimestre anterior e 3,3% em relação ao mesmo período do ano passado. E o investimento? Cresceu quase três vezes o crescimento da economia – tal proporção foi exatamente o que caracterizou a fase de crescimento de 2005 a 2010.
Outro quesito importante da qualidade do PIB é o crescimento da indústria. No 2º trimestre, houve crescimento de 1,7% da indústria de transformação em relação ao trimestre anterior. A construção civil foi o destaque, cresceu 3,8% em relação ao trimestre passado. Sempre que a indústria cresce a trajetória do PIB se mostra mais consistente.
Sonho para uns e pesadelo para outros: a economia está com inflação moderada e a trajetória de crescimento se mostra consistente, embora ainda modesta"
O autor? Sicsú, claro, em 30/Ago/2013. Ah, sim, e como lembrado também por este amigo, o artigo abaixo contradiz o Manifesto pró-reeleição de Dilma, assinado por quem? Preciso responder?
Não passaram apenas 12
semanas. Não passaram apenas 12 meses. São 12 anos de governos do PT e de seus
aliados. No imaginário do povo brasileiro, que tem pressa, uma dúzia de anos é
muito tempo. Não é o início de um projeto, mas sua consolidação. Esses 12 anos
não foram um período homogêneo em termos de resultados, de ideias e de
políticas adotadas. Houve ziguezague.
Um balanço minucioso do
período 2003-2014 ainda precisa ser elaborado. Mas, grosso modo, houve três
fases. Na primeira, as ideias fervilhavam. Era um governo que acertava e
errava. Aliás, errava mais do que acertava, mas havia muito debate. Era um
governo vivo de ideias. Havia debate nas universidades, na mídia, nos
movimentos sociais, na internet e no interior do próprio governo.
A equipe econômica,
constituída em 2003, por Antônio Palocci e Henrique Meirelles, provocou um
desconforto histórico. O PT, um partido que foi construído nas lutas por
melhores salários e mais empregos, nos genuínos movimentos sociais e com forte
influência de uma esquerda que pregava justiça social, nomeou uma equipe
econômica que defendia ideias opostas à sua história.
Em nome da governabilidade
e de muitos outros argumentos chamados de técnicos tais como “não se pode dar
cavalo de pau em transatlântico”, fez-se uma opção definitiva de continuidade
do modelo econômico do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso
(1999-2002).
Estranhada por muitos,
essa tinha sido uma opção definitiva, sem volta. Foi uma opção estranha para
economistas desenvolvimentistas e de esquerda, mas foi uma opção confortável e
comemorada pelos petistas pragmáticos. Havia um argumento simplório que confortava
a militância petista: “deixa a política econômica com eles e a política social
com a gente”. Erro crasso: políticas sociais necessitam de financiamento cuja
fonte está no modelo econômico.
A primeira fase obteve
resultados pífios ou medíocres. Tudo muito semelhante ao segundo mandato de
Fernando Henrique Cardoso. Basta comparar os números e perceber que as melhoras
foram imperceptíveis. E assim a história seguiria o seu rumo... sem solavancos
e com uma oposição enfraquecida já que o governo havia roubado alguns de seus
quadros e todas as suas ideias econômicas.
Faltou combinar com a vida
real... resultados irrelevantes, ataques bem sucedidos da grande mídia tendo
como mote a corrupção no interior do governo, queda do ministro Palocci
provocada por denúncias de um caseiro, a crise americana/mundial de 2007-2009 e
a intensificação do debate de ideias, fizeram o PT se reencontrar com a sua
história e seus sonhos dos anos 1980 e 90.
Teve início a segunda
fase. A oposição foi saindo do Ministério da Fazenda e voltando para a
oposição. Saiu de outros órgãos do governo também. Meirelles continuou à frente
do Banco Central, mas a sua diretoria foi mudando: quem era do mercado
financeiro voltou aos seus empregos de origem. O modelo do período FHC foi
modificado sem “cavalo de pau”. Houve algum tipo de controle do movimento de
capitais internacionais especulativos. Os bancos públicos honraram o rótulo que
possuem. A Petrobras fazia descobertas inusitadas. O governo elevou o seu
patamar de investimentos, uma política fiscal anticíclica foi organizada e
houve início de uma restruturação que objetivava justiça tributária.
Importantes programas sociais foram lançados ou aprofundados. Os resultados
obtidos foram extraordinários. José Alencar, o vice-presidente da República, e
o presidente Lula se consolidaram.
O ano de 2011 é um marco.
Tem início a terceira fase. O debate morre, na mídia e no governo. Grandes
quadros progressistas ou de esquerda, aos poucos, saem de cena. Os movimentos
sociais estão adormecidos. As políticas de Palocci e Meirelles voltam com força
total: juros subiram, superávit primário foi elevado, houve contenção do
crédito e o câmbio flutuou livremente para baixo. Os resultados se tornam
pífios a partir de então. O único bom resultado que é o desemprego deixa de ser
explicado pelo vigor econômico e é mantido graças a fatores demográficos e
políticas sociais específicas.
Após 12 anos,
representantes diretos dos banqueiros assumem a direção do Ministério da
Fazenda e dão o tom da política econômica. Os juros sobem novamente. Metas de
superávit primário são fixadas independentemente dos ciclos. Representantes de
latifundiários e do agronegócio ganham espaço. E, em nome da moralização,
direitos sociais estão ameaçados.
A guinada de 2011, que se
torna mais nítida em 2015, parece ter sido mais uma jogada política pragmática
de consolidação do modelo iniciado em 2003 que foi interrompido em 2006-7. A
opção de 2003 retornou apenas com suas políticas em 2011. Em 2015, retorna com
as políticas e com representantes legítimos da oposição ligados ao sistema
financeiro. A opção feita na Carta aos Brasileiros de 2002-3 parece estar se
consolidando. O pragmatismo político de governabilidade do PT parece ter
vencido os sonhos e a história do PT.
Com muitas dúvidas e certa
desesperança nesse governo encerro essa breve reflexão.
quarta-feira, 7 de janeiro de 2015
Feliz 2016
2014, o ano que acabou antes de começar, se encaminha para um
fim melancólico, embora previsível. Ainda assim, deixará saudades. O consenso de
mercado, conforme capturado pela pesquisa Focus desta semana, aponta para
crescimento de 0,55% no ano que vem, enquanto a inflação chegaria a 6,53%, em
larga medida por conta do reajuste dos assim chamados “preços administrados”,
na prática reprimidos muito além do razoável nos últimos anos.
Já eu considero
otimista a projeção de um crescimento em 2015 superior ao de 2014.
Em entrevista recente o
futuro ministro da Fazenda aponta para aperto fiscal de R$ 56 bilhões no ano
que vem (desconfio também que mais será necessário, mas fiquemos com seu
número), pouco mais que 1% do PIB. Como se imagina, a maior parte deste ajuste
deverá vir sob a forma de impostos mais elevados.
Já o BC, depois de
enfiar os pés pelas mãos ao prometer “parcimônia” nas próximas reuniões do Copom, esqueceu
o que havia escrito 12 dias antes e agora jura que irá “fazer o que for necessário para que
no próximo ano a inflação entre em longo período de declínio que a levará à
meta de 4,5% em 2016”. Obviamente, depois de tantas idas e vindas, não há
quem ponha a mão no fogo pela palavra do BC (eu certamente não), mas, se o
compromisso for à vera, implica taxas de juros ainda mais altas em 2015,
adicionando pressões para baixo sobre a demanda doméstica e, portanto, o nível
de atividade.
Por fim, sem querer
transformar a coluna numa longa lista de fatores negativos, os aumentos de
preços administrados acima mencionados, principalmente energia e transportes, devem reduzir a renda
das famílias, eliminando um dos poucos elementos que têm sustentando o consumo
nos últimos trimestres.
Em resumo, não há o que
indique crescimento mais forte no ano que se inicia. O país conseguirá,
portanto, a proeza de exibir, simultaneamente, inflação elevada e crescimento
(ainda mais) ridículo, um acontecimento raro.
Isto dito, por mais que
se atribua o provável desempenho sofrível da economia em 2015 às políticas
acima descritas, a verdade é que não foram estas (sequer adotadas, aliás) que
nos colocaram na atual situação.
O crescimento baixo,
inflação elevada e déficits externos crescentes são o legado de mais um
experimento heterodoxo no país, muito embora uns e outros ainda se recusem a
admitir o óbvio fracasso. Como sempre ocorre nestes casos, cabe às políticas
tradicionais o papel de nos tirar da encrenca e não será desta vez que
quebraremos este triste padrão.
A desaceleração do ano
que vem faz parte do custo da farra dos últimos 5 anos. Face a uma trajetória
crescente da dívida do governo, que saltou de 53% para 63% do PIB de 2010 para cá,
inflação na casa de 6,5%, um setor elétrico em total desarranjo (apesar do
suposto profundo conhecimento da presidente sobre o setor), entre outras
distorções, não há alternativa séria que não requeira uma inversão radical da
política econômica.
Assim, é bastante
provável que em 2015 testemunhemos uma piora considerável do emprego. O
desemprego, que até agora se manteve baixo graças à saída em massa dos jovens do
mercado de trabalho, deve, portanto, subir de forma mais marcante do que vem
ocorrendo no período mais recente, erodindo a única conquista do governo no
campo econômico.
Neste contexto, com a
inflação ainda alta, graças à escolha do BC pela convergência lenta (se
convergência houver), não é necessário ser um gênio da política para concluir
que o apoio ao governo, já decrescente, deverá minguar ainda mais. Isto lança
dúvidas consideráveis acerca da firmeza da administração quanto a seguir o rumo
agora sugerido.
Não sabemos, portanto,
se 2015 representará o primeiro passo para nossa redenção ou mera interrupção
na estrada da decadência que nos assola. De uma forma ou de outra, 2015 já era.
Feliz 2016...
2015 é o cara à esquerda... |
(Publicado 31/Dez/2014)