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quinta-feira, 5 de abril de 2012

Amargo regresso

Sim, sou obsessivo, mas nem eu gosto tanto assim de revisitar temas sobre que escrevi repetidas vezes e apresentar argumentos já vistos à exaustão. Porém, como o tema da “desindustrialização” teima em voltar a cada fraquejada da produção manufatureira local, não tenho escapatória, mas regressar a ele e mostrar de novo que – embora exitosa (e como!) em sua tarefa de arrancar recursos dos crédulos – a tese não faz sentido.

Seus defensores voltam a apresentar dados sobre a redução da participação da indústria no PIB como prova irrefutável de que o Brasil está regredindo economicamente (pelas lágrimas deste pessoal imagino que em breve retornaremos às cavernas). Eu choraria pela indústria nacional, mas minha solidariedade com o resto da humanidade me impede.

De fato, considerando que, segundo a Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (UNIDO), a participação da indústria no PIB mundial caiu de 27% para 16% entre 1970 e 2010, guardo meus pêsames para a desindustrialização planetária, sem dúvida provocada pela tendência inexorável da apreciação da taxa de câmbio global (não sei ainda se contra o tanpi marciano ou o druggat de Tatooine, mas pretendo descobrir).

Obviamente, para me manter alinhado com o lobby nacional, desconsidero que o enriquecimento e o consequente aumento da demanda por serviços possam ter qualquer papel relevante a desempenhar no processo de redução de peso da indústria no PIB. Pensando bem, quem quer escola e médico quando fica mais rico, se há sempre a possibilidade de comprar mais uma geladeira? Isto dito, é conveniente deixar de lado também a queda expressiva dos preços das manufaturas relativamente aos serviços, seja no Brasil, seja no mundo, pois isso não justificaria a busca de mais subsídios.

As dificuldades óbvias da tese se sustentar face à tendência global de perda de relevância da manufatura aumentam ainda mais quando se considera que o Brasil tem mantido sua participação na produção industrial global. Segundo os dados da UNIDO o Brasil representava cerca de 1,7% da produção manufatureira global em 2000, repetindo o valor em 2010.

Podemos checar esta informação usando outras fontes, a saber, as estimativas da produção industrial global produzidas pelo CPB, assim como as estimativas nacionais, frutos do galhardo esforço do IBGE. O gráfico mostra a razão entre a produção industrial brasileira e a global de janeiro de 1999 a janeiro de 2012, tomando, por conveniência, a média do período como base 100.

Como se vê, a produção nacional não aparenta ter perdido a relevância global. Houve, é claro, momentos em que o Brasil saltou à frente da produção, assim como períodos nos quais ficamos um tanto atrás. Ao longo dos últimos 12 anos (a partir da adoção do câmbio flutuante), todavia, a razão entre produção local e global parece oscilar ao redor da média, comportamento consistente com as estimativas da UNIDO.

Fonte: Autor (dados do IBGE e CPB)
É verdade que, a partir de meados de 2010 nossos dados sugerem perda de participação da indústria brasileira na produção global (que, de qualquer forma, apenas reverteu à média do período), mas, como argumentei em minha última coluna neste espaço, boa parte disso resultou da redução da demanda interna, fruto do aperto monetário que se materializou do segundo trimestre de 2010 ao terceiro de 2011. Com o afrouxamento das condições monetárias há plenas condições para a recuperação da produção industrial no futuro próximo, sugerindo que a reversão à média, mais que acidente, faz parte da operação normal da economia.

Obviamente, desmentir a tese da “desindustrialização”, por maior prazer pessoal que me traga, tem escasso efeito prático. O lobby já convenceu os crédulos e, na expressão imortal de Armínio Fraga, “o meu, o seu, o nosso dinheiro” já está sendo devidamente canalizado para os suspeitos de sempre, agora numa escala algo maior. Diz-se que “o que os olhos não veem, o coração não sente”, mas o que fazer quando os olhos veem?

* * *
Dois comentários a propósito do artigo de José Augusto de Castro na Folha de S. Paulo de 1º de abril: (a) repetir um argumento errado não o torna certo, apenas duas vezes errado; e (b) as exportações do Brasil para seus 5 maiores mercados latino-americanos atingiram US$ 30 bilhões em 2007, 6,74% das importações daqueles países (US$ 445,5 bilhões); em 2011 foram US$ 39,2 bilhões exportados contra importações de US$ 583,3 bilhões, participação de 6,73%. A perda de participação de 0,01% foi beeem real...

Dê mais uma graninha para os suspeitos de sempre
(Publicado 5/Abr/2012)


24 comentários:

Acho que vale a pena retomar uma discussão antiga ("O" vs Oreiro).


A participação da indústria no PIB em 1995 era 27.53%.

A participação da indústria no PIB em 2011 foi de... 27.53%.

Eu sei que a batalha da informação contra o lobby é inglória, mas a coincidência até a segunda casa decimal não deixa de ser divertida. Depois de 16 anos, rigorosamente nenhuma diferença: o Brasil é um dos poucos países que está resistindo ao dumping cambial marciano!

Claro, entre 1994 e 1995 a participação de indústria despencou de 40% para 27.53% - porque houve uma hecatombe nuclear no parque industrial brasileiro (Marte ataca!), ou uma mudança radical dos preços relativos, ou uma mudança de metodologia na série do ibge. Vai saber.

abs

Não há dúvidas da eficácia do lobby da FIESP. Eu que nunca gostei de sindicatos, principalmente os brasileiros, não posso deixar de registrar o papel desconstrutivo dos sindicatos dos patrões. Claro, imaginava que, para o equilíbrio das forças, o sindicato dos trabalhadores fosse importante. Que nada. No Brasil, o sindicato dos trabalhadores está carcomido pelo dos patrões.Para piorar, temos que aguentar aulas de economia do sindicalista, obviamente bem de vida, Paulinho da Força que fala que o problema da industria é o câmbio e os juros. Como vimos, o problema da indústria é a necessidade recorrente de subsídio que está ficando cada vez mais generoso. Moral da estória, temos mesmo é uma indústria de gigolôs. Se eu, pelo menos, pudesse importar livremente, poderia me defender um pouco. Para acabar com a minha festa, ainda tacham meus amigos fornecedores de produtos chineses, alemães e franceses de contrabandistas. Fazer o quê?

De qualquer forma, escolher setores, a dedo, para favorecer, como tem feito o governo Dilma, é uma opção política perigosa. Elege amigos e declara inimigos. Torna-se um balcão de pedintes de terno e gravata. A alternativa seria desvalorizar o câmbio e fim de papo. Mas é preferível encarar industriais chorões a enfrentar massas populares revoltadas com o aumento da inflação.

Demoliu o argumento da desindustrialização completamente, ganhou a medalha "Paul Krugman do B".

Sensacional! Parabéns pelo artigo. Muito claro
Alexandre, você poderia escrever um post sobre o tema: as margens de lucro das montadoras no Brasil vs Mundo?

Ótima visão, compartilho 100%.
Com relação à comprar mais uma geladeira pode ser opção para quem achar que a medicina ainda não está suficientemente evoluída e queira congelar-se para tratar-se no futuro quando quem sabe a indústria brasileira tenha tomado ciência do seu lugar e os industriais tenham parado com essa choradeira recorrente a cara 0,00x% de perda de participação no PIB.

Agora convido a todos os esclarecidos que divulguem a mensagem para tentarmos dessa forma jogar um pouco de luz sobre a cabeça dos "crédulos".

Parabéns. Vale a pena tocar no assunto. Triste é ver economistas e professores embarcando como se fossem massa de manobra. Coitados dos alunos.

Alex, vc previu que reduções de juros no final ano passado gerariam aumento inflacionario em Março. Tivemos o segundo mês com redução na inflação apurada pelo IBGE. A desaceleração que o governo percebeu lhe passou despercebida? Vc pensa que ficou muito agarrado às teorias e não considerou adequadamente o panorama econômico?

"Alex, vc previu que reduções de juros no final ano passado gerariam aumento inflacionario em Março."

Nãnãninã... Previ atividade recuperando forte a partir de março (e errei: o varejo bombou já em janeiro - e não foi fraco em dezembro - e a produção industrial começou a recuperar em fevereiro). Inflação acelera na segunda metade do ano.

Obrigado pela resposta. Vi que um engraçadinho pos um post ironico sobre inflação. Respeito muito sua opinião e por isso posto aki, apenas penso que o governo tinha informações de que a economia desaceleraria e então reduziu juros. Meu nome é Ronaldo Santiago, ronaldods@yahoo.com.br, sou engenheiro elétricista pela Unicamp e fiz especialização em Economia, tb lá. Ouvi cada absurdo do tipo: "O Lula foi quem acabou com a inflação", por isso corri para seu blog...

O gráfico compara produção industrial do Brasil vs do mundo. Me parece claro que a porcentagem brasileira cresceu justamente no período da recessão mundial. Uma simples maneira de ver isso é comparar o trend da produçao do Brasil e do resto do mundo e ver se foi o Brasil que cresceu ou o mundo que caiu (ou os dois).

Eu já ouvi comentários de que parte de nossa produção industrial é de produtos de baixíssima tecnologia, como suco de laranja em embalagens tetrapack, e outros produtos agrícolas como óleo de soja. Isso é fato?

Isso é verdade, mas acho que o comentário se referia às exportações de manufaturados (por este motivo prefiro fazer a diferença entre commodities e produtos diferenciados, mas acabei deixando de lado porque ninguém mais faz).

Perdoe-me a intimidade mas tenho que dizer:
"Cara, descobri seu blog agora e tal fato me encheu de felicidade. Artigos como este me fizeram ganhar o dia, mostrando-me que há (ainda) vida (muito) inteligente no País."
Parabéns.
Jeca Tatu

Alex,

E a taxa de câmbio?

Hoje ela está em 1,80. E se daqui a pouco ela for pra 1,50? Mesmo assim você continuará não acreditando em "desindustrialização"? (o termo é forte).

Junior

Valor: Há um grande debate no Brasil sobre desindustrialização. Em 2011, a participação da indústria de transformação no PIB ficou abaixo de 15%. O governo deve tentar proteger a indústria?

Krugman: Não fiz muita lição de casa sobre a situação brasileira, mas acho que há de fato uma questão aí. O Brasil tem os fluxos de capital e as exportações de commodities, e faz algum sentido pelo menos tentar lidar contra os efeitos desses fatores.

Valor: O BC adotou postura mais agressiva desde agosto, quando começou a cortar os juros, apesar de algumas pressões inflacionárias, especialmente nos preços de serviços. Como o sr. vê a política monetária brasileira?

Krugman: Não tenho uma visão forte a respeito, mas acho que é razoável. A economia está claramente em desaceleração, e a inflação, provavelmente como em todos os lugares, é transitória. O relaxamento monetário é apropriado.

"That awkward moment" quando o grande ídolo de um certo economista digno de Nobel em arrogância o desmente frontalmente em duas questões fundamentais.

"Paul Krugman do B" é alucinação, melhor vc procurar outro gringo pra lamber as bolas... Alan Greenspan deve estar doido pra arranjar um pupilo.

""That awkward moment" quando o grande ídolo de um certo economista digno de Nobel em arrogância o desmente frontalmente em duas questões fundamentais."

Sim, isto depois de afirmar:

"Krugman: Não fiz muita lição de casa sobre a situação brasileira, mas acho que há de fato uma questão aí."

"Krugman: Não tenho uma visão forte a respeito, mas acho que é razoável.

Realmente, depois de ler estas afirmações não pude conter as lágrimas...

Como diria Raul, tente outra vez.

Po, Alex, pega leve com o rapaz ai, tadinho rs

Tadinho de mim. Estas afirmações peremptórias do Krugman desmentiram todos os números que levantei...Oh dor...

"Po, Alex, pega leve com o rapaz ai, tadinho rs"

É cada babação de ovo entre esses comentários...

Quem sabe se o Krugman se deparar com todos esses números "que levantei" ele venha a rever suas afirmações peremptórias, não é mesmo?

Talvez o Sr. Schwartsman, com todo seu apelo midiático e sua turminha de bajuladores, consiga chamar a atenção do 'mestre' para essas questões. Se houver de fato essa pretensão, boa sorte...

Ainda não tenho uma opinião formada a respeito deste possível processo de desindutrialização. Seu post me chamou a atenção e tentarei pesquisar mais sobre o assunto.
A princípio, acho que a questão pode ser defendida e contestada por diversas formas, mas existem dois problemas com sua defesa:
1) Comparar a industrialização brasileira com o resto do mundo é uma defesa da idéia de que a desindustrialização é um processo natural. Mas o problema brasileiro parece estar na precocidade que isto vem acontecendo. O Brasil ainda não teria maturado seu parque industrial de forma a criar setores de alta tecnologia como em economias desenvolvidas que representam grande parcela da economia mundial (ou seja, sua comparação é grande parte em função de economias com estruturas muito diferenciadas das do Brasil);
2) os dados que você apresenta vão de 2009 a 2011. Falar de um processo deste baseado em dados de três ano não parece ser uma defesa forte.

"os dados que você apresenta vão de 2009 a 2011. Falar de um processo deste baseado em dados de três ano não parece ser uma defesa forte"

Talvez se você olhasse para os dados veria que estes cobrem o período 1999-2011, um pouquinho mais que os três anos, não?

"O Brasil ainda não teria maturado seu parque industrial de forma a criar setores de alta tecnologia como em economias desenvolvidas que representam grande parcela da economia mundial"

Curioso que em 80 anos de industralização ainda tenhamos que ouvir argumento de indústria infante... Será que a nossa (in)capacidade de formar uma indústria de alta tecnologia pode estar talvez, quem sabe, relacionada à qualidade lastimável da educação no Brasil?

jurei que era sobre o filme da jane fonda e do jon voight. vai à merda, careca burro.

Peraí, peraí que eu não sei se entendi: você achou que um post do blog era um filme com o Jon Voight e a Jane Fonda e eu que sou burro?