Parece que pego no pé
(ou seria na “perna manca”?) do ministro da Fazenda, mas, asseguro, trata-se da
mais pura verdade. Penso às vezes que não deveria ser assim, até por gratidão. Eu
começo a me torturar sobre o tema de uma coluna assim que termino de escrever a
anterior; é apenas a presença do ministro que alegra minh’alma com a certeza
que, graças a ele, não me faltará assunto.
No caso, a contribuição
ministerial para a análise desta semana é uma gema em estado bruto. Segundo
ele, o desempenho sofrível da economia (aquele mesmo que ele não previu,
contaminado por um otimismo de fazer o Dr. Pangloss enverdecer de inveja) se
deve a “duas pernas mancas”: o escasso financiamento ao consumo e a fraqueza da
economia internacional.
Isto mostra que,
conforme o esperado, ele ainda não compreendeu a natureza da desaceleração da
economia brasileira e que, portanto, continua tratando a doença com remédios errados.
Diga-se, aliás, que este deve ser o principal motivo de sua internacionalmente
reconhecida falta de pontaria nas previsões. Se o diagnóstico está equivocado,
só com muita sorte a previsão poderia dar certo.
As ações de política
econômica revelam – até mais do que as inúmeras entrevistas do ministro – que o
governo atribui à insuficiência de demanda os números medíocres de crescimento
observados desde 2011. De fato, medida após medida, o que observamos são novos
estímulos ao consumo, restrições às importações e tentativas canhestras de
ressuscitar o investimento com doses maciças de créditos subsidiados. Pouco, em
contraste, tem sido feito no sentido de buscar aumentar a capacidade produtiva
da economia, em particular no que se refere ao crescimento da produtividade.
No entanto, a um
observador mais atento não há de ter escapado os sinais crescentes de
dificuldades pelo lado da produção. A taxa de desemprego, por exemplo, segue
nos níveis mais baixos de sua (curta) história, pouco abaixo de 5,5%, e o ritmo
anual de geração de empregos, em que pese alguma desaceleração nos últimos
meses, ainda supera a expansão da população em idade ativa.
Mais importante, as
estimativas de aumento da produtividade permanecem muito baixas. Considerando,
por exemplo, que nos 4 trimestres terminados em setembro deste ano o PIB aumentou
2,3% contra aumento de 1,6% do emprego, segundo a Pesquisa Mensal do Emprego, a
produtividade, tomada ao pé da letra, teria crescido apenas 0,6% naquele
período.
Uma estimativa mais
caridosa, cujo foco é na tendência mais do que na observação de alguns poucos
trimestres, sugere números um pouco maiores, na casa de 1% ao ano, mas, ainda
assim, insuficientes para sustentar um ritmo de crescimento mais vigoroso do
que o hoje observado.
Na verdade, visto que
tanto a população em idade ativa quanto a produtividade parecem crescer em
torno de 1% ao ano cada, qualquer crescimento muito superior a 2% ao ano requer
queda adicional do desemprego, o que não era problema há alguns anos, mas hoje,
em face da baixa taxa acima mencionada, passa a ser uma limitação relevante.
Ao perder isto de vista
e insistir nas “pernas mancas” como motivos para nosso crescimento medíocre o
governo produz uma política econômica, agora sim, capenga.
Estímulos à demanda, em
particular pelo aumento do gasto público, quando a oferta se encontra restrita
agravam nossos desequilíbrios. Do lado doméstico aceleram a inflação, contida
apenas a golpes de controle de preços. Do lado externo se traduzem em elevação
do déficit em conta corrente, que este ano deve ultrapassar US$ 80 bilhões
(pouco menos do que 4% do PIB).
A política econômica
hoje em vigor é perfeita para quem precisa escrever semanalmente sobre o
assunto, mas incapaz de recolocar o país na rota do crescimento acelerado e
sustentável. A mudança de rumos é imperativa, ainda que possa atrapalhar minha
vida como colunista, sacrifício que encararia com satisfação.
(Publicado 18/Dez/2013)