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segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

De novo! Que safadinho...

O ministro da Fazenda e elfo vidente Guido Mantega continua a aprontar!

Segundo a reportagem do G1, elfo Guido prevê crescimento de 4% para o PIB brasileiro em 2013, devido a ‘condições muito melhores’ como a ‘redução de energia elétrica’ (referência a algum futuro apagão?), ‘os juros mais baixos de nossa história’ e o ‘câmbio mais elevado, a R$2, R$2 e pouquinho’.

O alegre elfo, reconhecido especialista em sexo e poder nas sociedades autoritárias, vê melhorias também no investimento que, em seu cenário, deve avançar 8% em 2013. Em suporte a seu cenário, elfo Guido, pimpão, cita a contínua redução das taxas cobradas pelos bancos públicos, a expectativa que bancos privados vão expandir o crédito ainda mais fortemente que os bancos públicos, e o início dos investimentos em estradas e ferrovias dentro do regime de concessões.

Sobre o novo papel de bobo da corte da comunidade financeira internacional, o elfo aponta seu preciso e esguio dedo na direção dos especuladores internacionais e vive seu momento j'accuse (*): “Neste ano, eu contrariei o interesse dos especuladores internacionais. Não dos investidores, do pessoal que vem para a bolsa, mas dos especuladores que não são nem os grandes bancos. São meia dúzia que tem por aí. Tinham uma 'boquinha' aqui no Brasil. Ganhavam fácil dinheiro, especulando.”

Tal comentário faz-me pensar: será que durante a meia década ou mais que a imprensa financeira (Economist, Financial Times) elogiou a política econômica brasileira era apenas falsidade servindo o interesse de especuladores?

(*) Não confundir com a banheira de hidromassagem. 


- Pelo menos eu não mencionei câmaras setoriais!

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

A bola torta


Na semana passada o Banco Central, seguindo os rituais associados ao nosso finado regime de metas para a inflação, divulgou seu Relatório de Inflação, publicação trimestral que, em outros tempos, foi o principal canal de comunicação da autoridade monetária com o público. Naquela época analistas vasculhavam cuidadosamente o Relatório, em particular as previsões do Copom sobre a evolução esperada dos preços, variável crucial para as decisões de política monetária.

Nos dias de hoje as previsões do BC atraem bem menos atenção. Em parte, talvez a principal parte, porque é mais do que claro que elas deixaram de guiar as taxas de juros determinadas pelo Copom. Em mais de uma instância, mesmo prevendo inflação acima da meta e crescente, o BC simplesmente ignorou suas próprias projeções e persistiu na trajetória de redução da taxa de juros. Por este lado não deveria haver qualquer surpresa quanto ao fato do IPCA-15, uma medida antecipada do número oficial (o IPCA), ter atingido a bagatela de 5,8% em 2012, muito distante da meta de 4,5%.

(A propósito, bem me recordo da descrença acerca da minha previsão sobre a inflação atingir entre 5% e 5,5%, mais perto de 5,5% do que de 5%. Ironias da vida: quem diria que me revelei, na verdade, um otimista inveterado, apenas pouco melhor que o otimista invertebrado?).

Pode ser, porém, que a menor atenção devotada às previsões do BC reflita também ceticismo sobre a qualidade deste número, que tipicamente tem se mostrado muito mais otimista do que a Poliana que escreve estas mal traçadas.

De fato, em dezembro de 2009 o BC previu que a inflação em 2010 atingiria 4,6%; o número final foi 5,9%. Em 2010 a previsão oficial para 2011 indicava 5%, mas a inflação bateu 6,5%, o teto exato do intervalo de tolerância. Apesar disso em dezembro daquele ano o BC redobrou a aposta e prometeu a convergência para a meta, cravando 4,7% para a inflação de 2012, que, tudo indica, deverá ficar mesmo na casa de 5,8%, como adiantado pelo IPCA-15.

Em três anos consecutivos, pois, o BC errou por mais de um ponto percentual de diferença (o erro médio é de 1,3 ponto percentual). Diga-se, porém, que errar a previsão não é, a princípio, nenhuma grande vergonha, nem o principal tema da discussão.

Caso o BC tivesse por vezes superestimado a inflação e em outras oportunidades a subestimado diríamos que há problemas com a precisão das estimativas, mas não um viés. Afinal de contas, como se diz por aí (e eu, como economista, subscrevo entusiasticamente), fazer previsões é um negócio complicado, ainda mais sobre o futuro.

Na prática, porém, o que se observa são erros para um lado só: a subestimação sistemática da inflação. No primeiro caso diríamos que a bola de cristal do BC está embaçada, como de resto a de todos nós economistas; já no segundo, eu diria que a bola de cristal do BC não está prevendo, mas torcendo, o que é muito diferente.

Não é por acaso, portanto que, quando o BC projeta que a inflação será 4,8% em 2013 (ou mesmo quando promete apenas que será inferior à observada em 2012) tanto economistas como pessoas normais (a distinção é intencional) encarem a promessa com visível incredulidade, expressa, por exemplo, na previsão consensual de mercado para a inflação na casa de 5,5% para o ano que vem (embora eu acredite que será ainda mais alta).

A triste verdade é que o BC perdeu o controle do processo inflacionário ao perder as rédeas sobre as expectativas. Caso ache que vai segurá-las por meio de previsões excessivamente otimistas acerca da trajetória da inflação está em vias de sofrer um desapontamento amargo. Se quiser recuperar a mão o passo inicial é reconhecer a extensão do problema, postura muito diferente da que encontramos no Relatório de Inflação e na comunicação do BC em geral.

Apesar disso, feliz 2013!

"Para 2014, a projeção encontra-se em torno do valor central da meta em ambos os cenários"


(Publicado 26/Dez/2012)

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Saudades dos anos 70

O ilustre mestre renascentista, virtuoso multi-instrumentista e comediante de primeira, professor Bresser-Pereira tem um artigo na Folha de São Paulo que deveria ser encapsulado para ser redescoberto muitas décadas no futuro. Se alguém tem uma dúvida que o Brasil, salvo cataclisma nuclear ou de similar intensidade, não vai chegar a ter 40% da renda per capita dos EUA nos próximos 200 anos, basta ler este artigo para entender porque. Um país que permite que tal bufão seja ministro em mais de uma ocasião é um país destinado à mediocridade.

Baixo crescimento, ideologia e pensamento
Luiz Carlos Bresser-Pereira
Folha de S.Paulo, 17.12.2012
O governo está fazendo uma política monetária e industrial competente, que já logrou baixar os juros, depreciar parcialmente o câmbio e, através do PAC, busca planejar e aumentar o investimentos nos setores não competitivos

O baixo crescimento do PIB brasileiro no terceiro trimestre deixou os economistas convencionais alvoroçados. Afinal, tinham como criticar o governo desenvolvimentista da presidente Dilma Rousseff.

Qual a crítica? Que a baixa taxa de investimento (18% do PIB) deve-se à política industrial adotada pelo governo; que os empresários teriam ficado desorientados com as diversas medidas de estímulo fiscal e monetário que o governo vem tomando e teriam se tornado inseguros, teriam reduzido suas expectativas de crescimento e, assim, deixado de realizar investimentos.

Ora, isso não é explicação econômica; não implica pensamento, mas repetição da ideologia neoclássica e neoliberal, para a qual toda política industrial é sempre condenável porque distorceria a alocação de recursos. É ideologia equivocada, porque a experiência secular dos países mostra que isso é falso: que política industrial geralmente é um fator de desenvolvimento econômico.

Mas, então, qual é a causa do baixo crescimento? Em primeiro lugar, é preciso considerar que houve provavelmente erro do IBGE ao não considerar as variações de estoque em suas estimativas do PIB.

Conforme afirma com a competência de sempre Francisco L. Lopes, na Macrométrica, “a partir de 2010, os gestores e planejadores das empresas, assim como o distinto público, dentro e fora do país, resolveram acreditar que o Brasil se transformara em tigre asiático” e, por isso, aumentaram excessivamente a produção. Em 2012, não obstante suas vendas continuem satisfatórias, reduziram a produção porque se puseram racionalmente a reduzir estoques.

Mas o crescimento não é satisfatório, apesar da coragem que o governo revelou ao reduzir juros reais e ao lograr alguma desvalorização da taxa de câmbio. Não o é porque a taxa de câmbio está longe do equilíbrio (cerca de R$ 2,70 por dólar).

O crescimento também não é satisfatório porque uma política industrial, por melhor que seja, não tem condições de sanar esse desequilíbrio fundamental da economia brasileira. Muitos desenvolvimentistas ainda não entenderam isso e, baseados na experiência do alto crescimento do Brasil (1930-1980), acreditam nas virtudes mágicas da política industrial. Isso também é ideologia sem base no pensamento.

A “política industrial” desse período não era apenas um sistema de incentivos à indústria (política industrial estrito senso); era também, senão principalmente, uma política macroeconômica através da qual o governo mantinha a taxa de juros real baixa e a taxa de câmbio no equilíbrio industrial, neutralizando, portanto, a doença holandesa.

Isso se fazia por câmbios múltiplos e, nos anos 1970, por tarifas de importação e subsídios à exportação, os quais não eram mero protecionismo, como geralmente se pensa, mas uma forma de estabelecer o imposto sobre as exportações de commodities.

Deixemos, portanto, de lado as ideologias e tratemos de pensar. O governo está fazendo isto: uma política monetária e industrial competente, que já logrou baixar os juros, depreciar parcialmente o câmbio e, através do PAC, busca planejar e aumentar os investimentos nos setores não competitivos.

Está no caminho certo.

Agora vai!

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Entrevista à CBN

Jogo dos sete erros


Das desculpas para o crescimento lamentável deste ano poucas soam tão esfarrapadas quanto as oferecidas pelo secretário de política econômica em entrevista ao Valor Econômico nesta semana. Segundo ele, a queda do investimento, fator principal do triste desempenho do PIB, resultou da redução da taxa de juros e da desvalorização da taxa de câmbio*. É um argumento curioso, principalmente vindo de quem sempre defendeu o oposto, a saber, que tais medidas levariam à aceleração do crescimento.

Na verdade, a justificativa do secretário refere-se ao que ele chama de efeitos de “curto prazo” destas medidas. De acordo com ela os agentes carregavam papéis de curto prazo, que perderiam valor com a redução das taxas de juros (o chamado “efeito riqueza”), além de terem dívidas em moeda estrangeira, cujo valor em moeda local se eleva com o enfraquecimento do câmbio. A piora do balanço das empresas, por conta disto, seria a responsável pela queda dos investimentos.

Com esta afirmação o secretário consegue rara proeza: errar tanto na teoria quanto na prática.

Em primeiro lugar, ao contrário do que alega, o valor dos títulos sobe quando a taxa de juros cai. Este efeito é grande no caso de papéis de longo prazo (prefixados e indexados à inflação) e modesto no caso dos mais curtos (indexados à taxa Selic), mas não é negativo em nenhuma alternativa.

Isto dito, os prefixados (e indexados à inflação) representaram pouco mais de 57% dos títulos públicos em 2012, enquanto a parcela indexada à Selic atingiu 42% do total. Em 2009, porém, estas participações eram, respectivamente, 46% e 53% da dívida. Em outras palavras, se o argumento do secretário fosse válido, a queda da taxa de juros teria sido menos efetiva em 2009 (quando a parcela de títulos longos era menor) do que em 2012, mas o que se observa é precisamente o oposto: a economia respondeu melhor à redução dos juros naquele momento do que agora.

A segunda parte da justificativa refere-se ao efeito da depreciação do real, que teria elevado o valor da dívida externa das empresas em moeda nacional, com efeitos negativos sobre seu balanço. Isto é, obviamente, verdadeiro, mas omite que as receitas de exportações do setor privado em moeda local também aumentam na mesma proporção. No caso, as empresas nacionais deviam em outubro US$ 248 bilhões e haviam exportado US$ 246 bilhões nos 12 meses até aquele momento (sem contar US$ 40 bilhões em exportações de serviços).

Falta explicar, portanto, porque as empresas reagiriam tão mal a uma medida cujo impacto positivo sobre suas receitas é praticamente idêntico (senão maior) ao efeito negativo sobre a sua dívida...

A maior omissão, porém, não é sequer esta. Perguntado se a desvalorização da moeda não teria encarecido os bens de capital o secretário afirmou que “[a] taxa de câmbio (...) foi corrigida para um nível que não afeta o custo de importação dessas máquinas”. Bastam, porém, 5 minutos com os dados da Funcex em mãos para constatar mais uma afirmativa sem qualquer parentesco com a realidade.

Desde o terceiro trimestre de 2011 os preços em dólares dos bens de capital importados recuaram 1%, mas a depreciação da moeda, 24% no período, implicou uma elevação de 23% no preço em reais destes bens (19% descontada a inflação).

Esta não é, provavelmente, a única causa da queda do investimento, mas é difícil comprar a ideia que um aumento desta magnitude no preço dos bens de capital não representa um impacto negativo na decisão de investir, ainda mais sabendo que o secretário não tinha feito a conta ao responder a pergunta.

A entrevista, enfim, só confirma o argumento que tenho apresentado neste espaço: o diagnóstico da equipe econômica acerca da estagnação econômica está equivocado, não só por falta de uma base teórica mais sólida, mas principalmente pela obstinação em ignorar aquilo que os dados insistem em proclamar.

Um círculo!


(Publicado 19/Dez/2012)


Holland : (...) Temos chamado a atenção para o efeito riqueza negativo.

Valor: O que seria isso?
Holland : Quando a taxa de juros cai e o câmbio se corrige, há um efeito riqueza negativo. Isso ocorre porque os agentes estão carregados de títulos de curtíssimo prazo ou seus balanços estão um pouco, digamos, dolarizados. Essa correção de 'balance sheet' [balanço] é promissora. Trata-se de um fato histórico, raro, na economia brasileira. De toda forma, o efeito riqueza já foi dissolvido. As empresas se ajustaram. Passaram por uma fase de correção de estrutura de balanço em prol de prazos mais longos.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Para entender o fracasso da política econômica

Holland : Porque a inflação no Brasil se acomoda com capacidade impressionante. Há 13 meses, estava acumulada em 7,31%. Os analistas falam agora em 5,5% para este ano, num cenário de choque de preços...
Valor: Mas com a economia crescendo muito pouco, perto de 1%.
Holland : Não creio que esse fator seja tão relevante. Essa relação [entre crescimento e inflação] não é de curtíssimo prazo, mas de médio e longo prazo. Essa associação é meio anedótica. Nenhum economista sério associaria uma coisa à outra. Só para fazer o contrafactual: o Brasil cresceu 7,5% em 2010 e a inflação estava caindo.
Valor: Mas O IPCA em 2010 subiu para 5,9%.
Holland : Ocorre que, no segundo semestre de 2010, houve uma alteração de preços de commodities muito acima da queda no primeiro semestre. Isso emendou com choques de oferta domésticos, como o do etanol e de produtos hortifrutigranjeiros. Quando esse processo se dissipou, a inflação voltou a cair. [NOTA: Em 2011 a inflação se acelerou para 6,5%] Isso mostra a capacidade da inflação brasileira de se acomodar no centro da meta.


http://www.valor.com.br/brasil/2942014/transicao-para-nova-politica-economica-afetou-pib-diz-holland#ixzz2FJ1HF8h0

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Gestão de política econômica no Brasil (dica do Affonso Pastore)

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Batalha naval


Os 18 leitores já perceberam que tenho uma modesta diferença com a equipe econômica no que diz respeito à política adotada há algum tempo no Brasil: eles a consideram genial, um modelo de como gerir o país no contexto de um mundo instável; eu, por outro lado, a classifico como uma abominação, provavelmente a principal responsável pelo medíocre desempenho recente do país, que, na ausência de mudanças, deve ser também a marca registrada dos anos que virão.

Dentre todas suas características, porém, o que mais me incomoda é a percepção do improviso constante. O governo parece atirar em todas as direções, na esperança que alguma das suas medidas atinja o alvo e afunde o submarino adversário, mas a falta de um diagnóstico retira destes disparos um mínimo de orientação. Deste modo as chances destas ações gerarem um processo de crescimento sustentável são muito baixas, para não dizer nulas.

Tomemos, por exemplo, a recente desoneração da folha salarial do setor de construção civil. Trata-se, à primeira vista, de uma proposta meritória: o setor responde sozinho por cerca de 8% do emprego no país e é uma porta tradicional para o mercado de trabalho no caso da mão de obra com baixa qualificação. Ao mesmo tempo os salários no setor têm crescido aceleradamente (pouco mais de 9% na comparação com o ano passado, segundo dados da FGV), de modo que um alívio nos encargos tem a possibilidade de ajudar o segmento.

Falta, todavia, a visão do conjunto da economia. Com a taxa de desemprego na casa de 5% a 5,5%, parece claro que já operamos muito próximos ao pleno emprego, senão acima dele. Nestas circunstâncias, o estímulo à contratação de trabalhadores em um setor, no caso a construção civil, deve elevar também os salários em outros setores, notadamente o industrial, cujo salário de admissão é apenas um pouco inferior ao observado na construção.

Isto, contudo, agrava a perda de competitividade da indústria, uma vez que a elevação salarial já tem superado persistentemente o crescimento da produtividade mesmo antes da adoção da medida. Adicione-se a isto que a manufatura, ao contrário da construção, está sujeita à concorrência internacional, de modo que enfrenta limites à sua capacidade de repasse das elevações salariais aos preços. Como tenho argumentado, este é o principal fator limitante da expansão da produção industrial.

Trata-se de um clássico caso de cobertor curto: o incentivo à construção conflita com o objetivo de crescimento manufatureiro. Assim, muito provavelmente o governo terá que adotar novas medidas para compensar a indústria, incluindo novas rodadas de proteção e desvalorização cambial.

No entanto tais políticas também têm consequências negativas, seja do ponto de vista de elevação dos preços domésticos (a inflação parece que vai superar os 5,5% em 2012, o que me coloca na posição desconfortável de ter sido otimista demais nas minhas previsões no começo do ano), seja do ponto de vista de incentivos à expansão da produtividade e do investimento.

Poderia me estender, mas acredito que o argumento ficou claro. Por falta de um diagnóstico coerente o governo tem mais objetivos do que instrumentos, o que gera conflitos de políticas e reiterados remendos, daí a percepção inevitável (e correta) de improvisação persistente.

Desta forma, enquanto a equipe econômica não entender que o problema no Brasil não reside na fraqueza do consumo e da demanda, e sim no baixo crescimento da produtividade no contexto de uma economia próxima ao pleno emprego, não há porque imaginar que este padrão (se é que assim podemos chamá-lo) de política possa ser alterado.

Se há alguma certeza acerca dos rumos da economia no futuro próximo é que testemunharemos novos pacotes a intervalos crescentemente reduzidos e com a mesma efetividade para acelerar o crescimento até agora observada.

Água, água e água...


(Publicado 12/Dez/2012)

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Quarto do riso


Impossível não tratar do fraco crescimento da economia brasileira no terceiro trimestre, quando o PIB registrou expansão de meros 0,6%, praticamente selando crescimento ao redor de 1% este ano e sublinhando as dificuldades que o país terá que superar para atingir a meta de 4% em 2013. Eu, em particular, espero um número entre 3% e 3,5% no ano que vem, mas ficaria apenas moderadamente surpreso se ficasse pouco abaixo de 3%.

À luz da anemia econômica deste ano uma mente desatenta poderia até atribuir poderes mediúnicos ao Copom, que iniciou seu ciclo de redução da taxa de juros embalado pela “hipótese de que a atual deterioração do cenário internacional cause um impacto sobre a economia brasileira equivalente a um quarto do observado durante a crise internacional de 2008/2009”.

Uma investigação minimamente mais cuidadosa, contudo, mostra um quadro muito distinto daquele suposto pelo BC. A começar porque, do ponto de vista da economia global, a desaceleração recente é pálida sombra do que foi a crise de 2008/2009. Naquele momento a economia mundial sofreu um colapso, como revelado pela contração de 13% no comércio internacional; em 2012, em contraste, embora o crescimento tenha se desacelerado, permanece ainda em terreno positivo, registrando expansão pouco superior a 2% nos 12 meses terminados em setembro relativamente ao mesmo período do ano anterior.

Mais revelador que isso, contudo, é a comparação do desempenho da economia brasileira relativamente às suas contrapartes na América Latina. Da mesma forma que no meu artigo do mês passado escolhi as economias (Chile, Colômbia e Peru) que, além de compartilharem com o Brasil o perfil de exportadoras líquidas de commodities, adotam o regime cambial e monetário que vigorava até recentemente no país, isto é, mantiveram as metas para a inflação, assim como o câmbio flutuante, além do compromisso sólido com suas metas fiscais.

Assim, se a desaceleração da economia brasileira resultasse da crise internacional deveríamos observar um comportamento semelhante por parte dos demais países, como o ocorrido em 2009.

Há, porém, uma complicação técnica que precisa ser tratada: é necessário distinguir os movimentos cíclicos da economia daqueles associados à sua tendência de crescimento. De fato, os efeitos da crise internacional devem se manifestar como uma redução cíclica do crescimento, isto é, um desvio para baixo relativamente à sua tendência. Se tais efeitos não forem desembaraçados corremos o risco de atribuir à crise um ritmo de crescimento mais lento que, na verdade, se originaria de uma menor capacidade de expansão sustentável.

Para tratar uniformemente todas as economias em análise estimei uma tendência simples (um filtro Hodrick-Prescott) para cada uma delas e calculei o desvio do crescimento observado relativamente à tendência. O gráfico mostra os desvios do crescimento brasileiro, assim como a média dos desvios dos demais países (apenas para deixar o gráfico mais legível; chegaríamos às mesmas conclusões usando as informações separadas para cada país).

Os números são reveladores. É possível ver como os movimentos cíclicos no Brasil se assemelham aos dos demais países, em particular no período imediatamente posterior à eclosão da crise de 2008. Todos os países foram tragados pelo maesltron financeiro, desviando-se significativamente para baixo com respeito à sua tendência. Da mesma forma sua recuperação foi não apenas rápida, mas também vigorosa, revelando taxas de crescimento bastante superiores à tendência já em 2010.

Fonte: Autor (a partir de dados do IBGE, BCCh, BRC e BCRP)

Quando se examina o período mais recente, todavia, é visível a diferença de desempenho entre o Brasil e os demais países latino-americanos. Embora o crescimento tenha se desacelerado em todos eles (em média uma redução de 1 ponto percentual), a desaceleração brasileira foi muito mais forte (cerca de 4 pontos percentuais) e o Brasil é o único que registra expansão abaixo da tendência estimada.

Posto de outra forma, os dados sugerem que o baixo crescimento nacional é um fenômeno local. Já as causas são objeto de debate feroz, embora minha explicação favorita ainda aponte para o esgotamento do processo de incorporação de mão-de-obra ociosa como um culpado provável (no caso implicando também que a tendência acima estimada deve exagerar nossa capacidade de crescimento).

Isto dito, é preciso reconhecer que, em retrospecto, o Ministro da Fazenda estava correto ao qualificar a projeção do PIB de 1,5% como piada; só não percebeu que a sua própria piada (crescimento de 4%) era bem mais engraçada...

4%!!!!!


(Publicado 6/dez/2012)


quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Bye Dave...

Menos do mesmo


O resultado do PIB divulgado na semana passada foi decepcionante, não só pelo número em si, metade daquilo que todos esperavam (eu inclusive!), mas também, e principalmente, pela sua composição. O investimento cedeu pelo quinto trimestre consecutivo, acumulando queda de quase 6% desde o pico observado em meados de 2011. Tomados como proporção do PIB os investimentos caíram de 19,4% no segundo trimestre de 2011 para 18,1% no terceiro trimestre de 2012, nível mais baixo desde o final de 2009, quando a economia ainda se recuperava da crise.

Não há como (nem porque) minimizar as consequências deste processo. No curto prazo o investimento responde por parcela relevante da expansão da demanda interna. Os demais componentes desta última (o consumo das famílias e do governo) têm mostrado certo vigor, crescendo a taxas médias próximas a 3,5% ao ano nos últimos trimestres, sugerindo que a baixa expansão da demanda doméstica resulta da fraqueza do investimento.

A médio e longo prazo, porém, as consequências são ainda mais graves, pois afetam a capacidade de crescimento sustentado. Minhas estimativas (com o auxílio inestimável de Cristiano Souza) sugerem que cada 1% do PIB a mais de investimento eleva o crescimento sustentável entre 0,20% e 0,25% ao ano. Se nossa avaliação estiver correta, portanto, a queda observada desde o segundo trimestre de 2011 nos custou algo em torno de 0,3% ao ano. Pode não parecer muito, mas em dez anos equivale a uma redução do PIB da ordem de 3%, isto é, cerca de um ano de crescimento perdido a cada dez.

O ponto central, no entanto, é entender os motivos por trás do fraco desempenho do investimento. Há certo consenso que o ambiente externo, notadamente a incerteza que cerca a crise europeia, deva ser responsabilizado pela timidez da inversão em função da elevação dos riscos a que submete qualquer projeto de investimento.

Não estou, porém, plenamente convencido. Muito embora este elemento possa desempenhar algum papel no processo, ele me parece insuficiente para explicar a magnitude da queda observada no período recente.

Com efeito, se a crise internacional fosse o fator determinante da fraqueza do investimento deveríamos observar um processo de queda sincronizada em vários países, em particular aqueles que compartilham (ou melhor, compartilhavam) certas características com o Brasil, como o peso das commodities nas exportações, assim como o regime monetário e cambial.

Isto, porém, não ocorre. A queda dos investimentos no Chile, Colômbia e Peru foi semelhante à ocorrida no Brasil entre 2008 e 2009; nos últimos trimestres, contudo, enquanto o investimento nacional segue em queda livre, naqueles países se observa precisamente o contrário.

Creio que a raiz do problema no Brasil está relacionada à evolução medíocre da produtividade. Tomada a valor de face, a propósito, a produtividade teria caído, visto que o PIB cresceu 0,9% entre o terceiro trimestre de 2011 e o mesmo período de 2012, enquanto o emprego cresceu 1,7%. Numa interpretação mais caridosa, porém, a tendência subjacente permaneceria positiva, porém modesta, em torno de 1,3% ao ano.

Já o salário real médio tem crescido entre 3% e 5% ao ano, o que implica elevação do custo real unitário do trabalho na casa de 2% a 2,5% ao ano, ou seja, redução equivalente dos lucros. Dado que o investimento depende crucialmente da evolução esperada dos lucros não é difícil concluir que este fenômeno deva se encontrar no cerne do fraco desempenho da formação de capital.

Some-se a isto um governo intervencionista, que vem modificando drasticamente as regras do jogo, e temos a explicação para o quadro observado. Noto, por fim, como se a conclusão não fosse triste o suficiente, que não há sinal de mudança de rumo na política econômica que possa alterar o estado das coisas. Podemos nos acostumar com o baixo crescimento: ele veio para ficar.

Agora vai!


(Publicado 5/Dez/2012)

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Momento didático: PIBinho no terceiro trimestre de 2012


O anúncio dos números do PIB no terceiro trimestre de 2012 oferecem-nos mais um momento didático.

Alguns dos otimistas sobre a economia brasileira têm projetado crescimento tão alto quanto 4.0% para 2013 (consta que alguns deles ouvem a campainha tocar e correm para abrir a porta do apartamento, na esperança que finalmente a Gisele cansou-se da vida enfadonha com o Tom). Mesmo a pesquisa Focus que costuma chegar atrasada em suas projeções de crescimento já ajustou a projeção média para 2013 para 3.7% (Deve cair mais na semana que vem! Podem escrever).

Mas por que deveríamos ser mais pessimistas sobre o crescimento no curto e médio prazo?

Olhando pelo lado da oferta, o crescimento do PIB acontece devido a aumento da mão de obra, no estoque de capital privado ou ganhos de produtividade. Não consigo ver contribuição significativa de qualquer dessas fontes no curto ou médio prazo.

No curto prazo, sabemos que aumentos na mão de obra devem ser menores do que em anos anteriores já que a taxa de desemprego está em níveis historicamente baixos.

Também sabemos que aumentos na capacidade produtiva devido ao investimento privado não devem ser substanciais devido à baixa taxa de investimento da economia brasileira e às ações anti-investimento privado do governo brasileiro (vide novo marco regulatório do pré-sal, lambanças da Eletrobrás etc), dentre as quais se destaca o recente esforço para depreciar o câmbio real, com o conseqüente encarecimento relativo do preço do investimento.

Então nos restam os ganhos em produtividade. Uma das possíveis fontes para aumentos na produtividade são melhorias na infraestrutura, por exemplo estradas, aeroportos, telecomunicações, portos. Não consigo esperar muito deste canal, baseado na experiência do atual governo na área de infra-estrutura e sua atitude com relação ao investimento privado. Um boom de investimento em infra-estrutura no Brasil parece-me tão provável quanto a Gisele...

Outra possibilidade é que dado um mercado de trabalho aquecido, setores mais produtivos da economia expandam em detrimento de setores menos produtivos, assim aumentando a produtividade média da economia. Nesta área os erros de política são talvez os mais penosos, pois nosso governo tem uma tendência de ceder a todos os apelos de setores sob pressão competitiva, fechando assim este mecanismo. O protecionismo é uma política extremamente perversa para uma economia perto do pleno emprego, pois os empresários dos setores protegidos não têm incentivo algum para melhorar sua produtividade ou investir em capacidade (mesmo porque não podem ter certeza que a proteção será permanente), mas ainda assim põem em cheque as perspectivas de crescimento dos setores de produtividade mais alta.

Então quando alguém me diz que o Brasil tem uma taxa de crescimento potencial de 4.0% no médio prazo... isto me informa mais sobre a qualidade do analista do que qualquer outra coisa. O que me traz para a afirmação do professor Lozardo no Globonews que economistas do mercado financeiro teriam um viés pessimista. Au contraire, eu diria que economistas do mercado financeiro são pagos para ter um viés otimista. Primeiro, quanto maior a visão otimista que investidores locais e estrangeiros têm sobre as perspectivas da economia brasileira, maior o volume de transações que pagam comissão e alimentam o estilo de vida de nossos economistas de mercado; segundo, os economistas de bancos grandes (principalmente) sofrem pressão para não divergir da visão oficial e quando divergem, fazem-no com mais deferência do que o oficialismo merece. Por isso mesmo, qualquer leitor experiente de relatórios de economistas de mercado sabe que se a projeção de crescimento para 2013 é 4.0% ou os 3.7% do Focus de hoje, neguinho quis dizer 3.0% e olhe lá!

domingo, 2 de dezembro de 2012

Links para o Painel da Globo News de 1/dez/2012

Primeira parte.

Segunda parte.

sábado, 1 de dezembro de 2012

25% of nothing


• Those who had the time and patience to go through BCB communication since the beginning of the easing cycle have surely concluded that the main intellectual argument for its dovish stance in terms of monetary policy has been the supposed “disinflationary bias” stemming from the international scenario;
• Although more recent communication has eschewed this particular expression, earlier versions of the case for monetary easing upon the assumption that the impact of the external turmoil would have an impact on the economy “equivalent to one fourth of the impact observed during the international crisis of 2008/09”;
• Though the Brazilian economy was never even close to experiencing such, poor output growth in the past 4 quarters has been branded as vindication for BCB actions, as well as its allegedly accurate reading of the international environment;
• Yet, if it were the effects of global deceleration that led to Brazilian slowdown, we should find evidence of similar impacts on comparable economies, in particular other Latin American commodity exporters;
• The evidence, nevertheless, begs to differ. Contrary to the observed in 2008-10, Brazilian growth rates deviated substantially from those of its peers, an indication that the slowdown in Brazil is not only (nor mainly) the result of a common external force, but rather idiosyncratic (domestic) factors;
• Building in previous research we argue that the most relevant elements within domestic factors are those supply related, mainly the recent developments in the labor market. As a matter of fact, something between one fourth and one third of Brazilian growth since 2004 has come from the incorporation of unemployed workers, a positive, albeit finite, process. As the economy approaches full employment, output growth must converge to potential, which, given labor productivity growth estimates (around 1.5% per annum) and working age population growth, should be in the vicinity of 3% per annum;
• The implications for inflation are straightforward: instead of disinflation we should have the accumulation of inflationary pressures, so far offset by one-off events, which should still play leading roles in 2013;
• If BCB continues waiting the disinflationary bias to materialize, it is likely to be sorely disappointed, but this should not change its monetary policy stance, keeping rates on hold for a long time, probably until the final months of 2013.

Mais do que 4 segundos

Para quem se interessar, estarei hoje (sábado, 1/dez) no Painel da Globo News, às 23:00 (reprise amanhã às 11:05). Para quem não se interessar, saiba que minha amiga, Zeina Latif, uma das melhores economistas do país participará do programa, motivo mais que suficiente para assisti-lo. Mais tarde publico um link com o conteúdo.

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

4 segundos, mais ou menos

Cabeça brilhante no Jornal Nacional.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Dejà-vu

Nota: este artigo foi escrito em meados de novembro, antes de sair de férias. Tive que fazer pequenas alterações, por conta do que aconteceu desde então, mas deixei registrada a versão original, mesmo porque os acontecimentos recentes mostraram que o ponto central da coluna estava correto. Julguem vocês mesmo. Abs

Quando o próprio governo reconhece que o regime cambial é de “flutuação suja” é porque não restou flutuação, só sujeira. Nos últimos 6 meses (127 dias úteis) a taxa de câmbio ficou no intervalo de R$ 2,00/US$ a R$ 2,05/US$ em nada menos do que 106 dias, mais do que 80% do tempo. Como na história de Cachinhos de Ouro, o mingau parece era muito frio abaixo de R$ 2,00/US$ (apenas 8 observações) e muito quente acima de R$ 2,05 (modestas 13 observações). Apenas naquele intervalo é que as autoridades se sentem pareciam confortáveis.

Os motivos parecem eram claros. Abaixo de R$ 2,00/US$ recomeça a choradeira do setor industrial, à qual o governo não consegue resistir. Já o câmbio acima de R$ 2,05/US$ parece parecia gerar certo receio, talvez acerca da inflação, muito embora na lista de prioridades do governo ela apareça logo após o programa de corte das garras das harpias nos parques federais.

Resta saber se este estado de coisas é seria duradouro. Creio Desenvolvimentos recentes mostraram que não, em função do que vem ocorrendo no mercado de trabalho e do parco desenvolvimento no campo da produtividade.

Como tenho insistido há tempos, há sinais cada vez mais fortes que o mercado de trabalho se encontra apertado. Apesar do ritmo de criação de empregos ter se reduzido, em particular no segmento do trabalho formal, os salários prosseguem crescendo aceleradamente, algo como 8% no terceiro trimestre deste ano, na comparação com o mesmo período do ano passado.

Já o crescimento da produtividade, tomado ao pé da letra, tem sido negativo, pelo mesmo até o segundo trimestre. Na minha interpretação, mais caridosa, a tendência de expansão da produtividade é da ordem de 1,5% ao ano, positiva, mas ainda assim insuficiente para compensar o aumento de custos advindo da pressão salarial.

Neste aspecto, a salvação da lavoura, principalmente para o setor industrial, foi a depreciação da moeda. Medido em dólares o salário médio caiu de US$ 990 no terceiro trimestre de 2011 (o mais elevado da série) para cerca de US$ 860 no mesmo período de 2012, queda de 13%.

Todavia, a se manter o ritmo de crescimento dos salários, em um ano seu valor em dólar já estará ao redor de US$ 930 caso a taxa de câmbio permaneça inalterada, erodindo novamente a competitividade do setor industrial. Posto de outra forma, passa a ser questão de tempo para que o BC, guiado pelo Ministério da Fazenda, seja obrigado a migrar a taxa de câmbio para novo patamar, de modo a manter salários nacionais (ajustados à diferença de produtividade) alinhados aos dos concorrentes internacionais. Caso haja sensação de dejà-vu, não se espante: trata-se da mesma política cambial adotada na década de 70 e com implicações similares.

Por um lado, desvalorizações periódicas permitirão o repasse de preços internacionais, assim como observamos recentemente no caso das commodities agrícolas.

Por outro lado, o aperto no mercado de trabalho deve garantir que salários continuem subindo acima da inflação. Em particular isto implica que a inflação de serviços deve seguir rodando acima da inflação de bens.

Visto por outro ângulo, à medida que a economia se aproxima do pleno emprego a taxa de câmbio teria que se apreciar para aumentar as importações líquidas e, portanto, a oferta total de bens e serviços. Caso, porém, a política cambial não permita que tal ajuste se dê pelo barateamento do dólar, a apreciação ocorrerá pelo encarecimento do produto local.

A alternativa a esta política envolveria, por um lado, um controle mais estrito dos gastos públicos, em particular dos gastos correntes e, por outro, um conjunto de políticas dirigido à aceleração do crescimento da produtividade.

Considerando o que foi feito nestas áreas até o momento, contudo, consigo até entender porque preocupação com a inflação vem depois da manicure das harpias: sob este regime deve ser mais difícil trazê-la de volta à meta do que tentar apanhar os pássaros na unha.

- Ih, não funcionou...

(Publicado 28/Nov/2012)

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

¿Y si?


A pergunta mais importante em Economia é também a mais difícil de ser respondida: o que ocorreria caso, ao invés de adotarmos determinada política A, adotássemos a política B? Esta é também uma pergunta recorrente na vida comum: se tivesse entrado à esquerda, ao invés de à direita, teria chegado mais cedo ao trabalho? Ou, se tivesse me dedicado à Medicina, como queria minha mãe (de acordo com a tradição judaica o feto não é considerado viável até se formar médico), que caminhos minha vida teria tomado?

Algumas destas questões não têm resposta fora do campo da ficção, pois são experimentos únicos, para tristeza da minha mãe. No que tange a outras, porém, se há regularidades teóricas e empíricas, podemos imaginar como certos fenômenos teriam se desenrolado caso decisões diferentes tivessem sido tomadas em momentos cruciais.

Estava pensando nisso ao observar os desenvolvimentos recentes na Argentina. Não há de ter escapado da atenção do leitor mais atento a magnitude do protesto contra a presidente Kirchner, nem a queda abrupta de sua popularidade pouco tempo depois de sua reeleição.

A verdade é que a Argentina tem, há tempos, adotado um conjunto de políticas econômicas “heterodoxas” que, embora lhe tenha dado certo alívio por um período, foi minando gradativamente sua capacidade de crescimento.

A começar pela despreocupação com a inflação. No começo de 2004, tempos em que o Indec ainda era uma instituição confiável, livre do tacão do governo, a inflação havia recuado para níveis muito baixos (cerca de 2%), uma vez dissipados os efeitos da maciça desvalorização do peso no começo de 2002. A atividade econômica, por sua vez, vinha em franca recuperação e o país reunia, assim, as condições ideais para consolidar o controle da inflação.

Naquele momento crucial, contudo, mais uma oportunidade foi desperdiçada. As autoridades desprezaram a questão inflacionária e elegeram o crescimento como único objetivo. Ao final de 2005 a inflação já ultrapassava os dois dígitos e, para lidar com o problema, o governo recorreu a controles diretos de preços e subsídios; com o fracasso destes, passou a adulterar o índice de inflação. Hoje a inflação oficial se encontra ao redor de 10% nos últimos 12 meses, enquanto estimativas privadas sugerem um índice cerca de 3 vezes mais alto.

No que se refere ao desempenho fiscal a deterioração também foi marcante. O superávit primário do governo federal, que superava os 3% do PIB até 2008, vem em queda acentuada e equivalia a meros 0,3% do PIB no ano passado, evaporando ao longo de 2012.

Por fim, para a alegria de vários economistas pátrios, a taxa de câmbio argentina foi administrada, supostamente mantida a patamares que tornariam a indústria local competitiva. Obviamente, com a aceleração da inflação isso não passou de ilusão. A Argentina chegou a ter uma fatia de mercado equivalente a 9% das importações brasileiras (seu principal mercado, que absorve cerca de 20% das exportações platinas); hoje esta participação caiu para 7%, a menor em quase 20 anos.

Dados estes desenvolvimentos, o surpreendente não é que a Argentina esteja enfrentando problemas sérios; o inusitado, na verdade, é que estes tenham demorado tanto a se manifestar, provavelmente atenuados pelo forte aumento de preços das commodities, assim como pelo bom desempenho brasileiro entre 2004 e 2010.

O interessante é que, embora pouca se ouça dos nossos keynesianos de quermesse sobre a Argentina hoje, a combinação de política por ela adotada de 2004 para cá era cantada em verso e prosa como a receita para o Brasil crescer aceleradamente. O desempenho argentino pode ser considerado, contudo, como o que poderia ocorrer com o Brasil caso tivéssemos ouvido o canto das sereias heterodoxas. E também como o que pode nos acontecer a continuar a deterioração segura e implacável da nossa política econômica.

Una política muy amiga...

(Publicado 21/Nov/2012)

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Por que o tripé?


Qualquer analista que tenha mantido alguma conexão com a realidade já percebeu que o tripé econômico adotado a partir de 1999 não mais existe. Fingir que a fixação da taxa de câmbio, a incapacidade de atingir a meta para o superávit primário – apesar do volume extraordinário de receitas de dividendos – e a perda pelo terceiro ano consecutivo da meta de inflação (com mais duas perdas contratadas para 2013 e 2104) sejam apenas “pragmatismo” na operação do tripé revela um cinismo atroz, ou apenas a incapacidade de perceber que o ambiente econômico mudou, e não para melhor.

A própria relutância em reconhecer o abandono do esquema de política econômica já reflete certo desconforto. De fato, se houvesse uma alternativa superior, não veríamos tantos dos antigos opositores do tripé insistindo que ele está, sim, mantido.

Na verdade, a questão central quanto à escolha do modelo de política diz respeito ao regime cambial, isto é, se a taxa de câmbio se ajusta às forças de mercado, ou se é, de alguma forma, administrada.

Países que adotam regimes de câmbio administrado em geral o fazem por duas razões: ou são economias com um grande volume de comércio internacional, ou têm dificuldades em controlar a inflação.

Um exemplo do primeiro caso é a adoção do euro. As economias europeias, seja pela proximidade geográfica, seja pelo processo de integração no pós-guerra, se caracterizam por intensa atividade comercial; sob tais circunstâncias a taxa de câmbio fixa facilita as trocas, permitindo maior especialização e produtividade. Não por acaso, sempre que possível estes países tentaram manter taxas de câmbio fixas entre si, com fracassos espetaculares ao longo do caminho.

Já a Argentina de 1991, assim como o Equador hoje, representam os casos de países cuja incapacidade de lidar com o problema inflacionário acabou desaguando na “importação” da política monetária dos EUA, por meio da adoção do dólar.

O Brasil não se enquadra nestas alternativas. Do ponto de vista do comércio internacional somos um país relativamente fechado e com um componente considerável de commodities em nossas exportações. Já no que diz respeito à inflação, nossa experiência de poucos anos atrás mostra que um BC resoluto tem plena capacidade de mantê-la controlada.

Adicionalmente nos últimos anos o país se livrou das dívidas em moeda estrangeira e, com isso, dos riscos financeiros associados à flutuação da moeda, isto é, da possibilidade da depreciação cambial levar à quebra de empresas endividadas no exterior.

Por estes motivos deve ficar claro que o regime de câmbio flutuante é o que melhor serve ao país. Em caso de choques, como alterações em preços de commodities, ou nas condições de financiamento externo, a taxa de câmbio se ajusta, isolando, em grande medida, os efeitos destes choques sobre atividade e preços domésticos.

A decorrência lógica de tal regime cambial é a necessidade do BC se dedicar ao controle inflacionário, no caso pela adoção de um sistema de metas para a inflação, uma vez que não se pode contar com a política monetária de outros países para resolver o problema.

Dados os dois primeiros componentes, segue-se que o Tesouro deve dar as condições para que o BC exerça seu mandato, seja garantindo que a dívida pública se mantenha estável, sem o que nenhuma estratégia antiinflacionária é crível, seja auxiliando o controle da demanda interna.

Isto dito, o tripé é também uma metáfora feliz, pois sem uma das pernas a estrutura toda se torna instável. No caso, perdemos duas ao fixar a taxa de câmbio e ao permitir que o gasto público crescesse de forma a inviabilizar a meta fiscal, o que já comprometeria o controle inflacionário mesmo se o BC estivesse comprometido com a sua meta. Resta tentar segurar a inflação atuando diretamente sobre os preços. Nunca funcionou, nem para o Imperador Diocleciano, mas é a estratégia que sobrou.

Será que faltou fiscal?

(Publicado 14/Nov/2012)

domingo, 11 de novembro de 2012

Perguntas aos leitores

  1. 1. Imagine a seguinte situação. Dois blogueiros de economia esbarram em evidência incontestável de comportamento eticamente questionável de um professor de economia. Seria este um tema interessante para um post?
a.     Sim.
b.     Não.

  1. 2. Se você respondeu (a) à pergunta anterior, qual o melhor momento para um artigo apresentando evidência incontestável de comportamento eticamente questionável de um professor de economia?
a.     Na semana anterior ao encontro da ANPEC.
b.     Depois do encontro da ANPEC.

Momento pedagógico II

Stefan Alvino: 

“A existência do BNDES é sim fundamental, mas para financiar e tornar mais competitivo e baratos as produtividades que internalizam os custos "socioambientais". Exemplos são as energias limpas como a solar e eolicas, e os transportes de massa com poluição baixa como metro e VLTs. O que está faltando no BNDES é a adoção de criterios mais tecnicos na concessão de emprestimos e menos politicagem, mas isso logo logo acho que vai se resolver.” 

Mais um momento pedagógico! 

Eu diria que a existência do BNDES se deve à sua utilidade para os governantes de plantão. O BNDES é um instrumento que os governantes do dia usam para transferir recursos para seus plutocratas de confiança. Também é um instrumento de chantagem contra o empresariado. Esta é a razão de sua existência. Esta é a natureza da besta. 

Tal finalidade hedionda deve ser disfarçada da população, daí a necessidade de desculpas como custos ‘socioambientais’, política industrial etc. Às vezes ouvimos que o papel do BNDES seria crucial para financiar o investimento no Brasil, o que é grotescamente curioso, pois a vasta maioria dos países de desenvolvimento similar ao Brasil consegue investir mais que o Brasil sem depender de um banco estatal de desenvolvimento de tal dimensão. 

Agora, ouvimos dos custos “socio-ambientais”. Mas por que o BNDES seria necessário para financiar o transporte em massa? Não podem os governos de São Paulo ou do Rio, ou concessionarias do setor privado, emitir dívida? Não pode a União garantir tal dívida se existe algum motivo de bem-estar social ou externaliade justificando isso? 

Cínico que sou, desconfio que a raison d’être do financiamento por um banco estatal é evitar-se a disciplina do mercado e garantir que as obras possam ser superfaturadas. Como disse, esta é a natureza da besta.