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terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Sempre à espera de D. Sebastião

Foi uma semana tenebrosa para os rumos da política fiscal no país. Por um lado, balões de ensaio acerca da revogação (ou “flexibilização”) da “regra de ouro”, dispositivo constitucional que limita o endividamento do governo às suas “despesas de capital”. Por outro, a sanção presidencial à lei que permite o uso de até R$ 15 bilhões do FGTS para empréstimo à Caixa Econômica Federal (CEF) na forma de um bônus perpétuo.

Em ambos os casos, sinalização não apenas das dificuldades relativas à política fiscal, mas principalmente da incapacidade de lidar com elas.

Tomemos o caso da “regra de ouro”. Ela basicamente permite que o governo emita dívida somente em dois casos: para pagar a dívida que está vencendo (a chamada “rolagem”, que, por definição apenas mantem o valor da dívida) e para financiar o investimento público (neste caso, aumentando o valor da dívida).

Se levada a ferro e fogo, portanto, implicaria limitar o déficit primário ao investimento. Ocorre, porém, que estas grandezas têm apresentado comportamento divergente: o resultado primário, superavitário até 2013, se tornou cada vez mais negativo desde então, acumulando, no caso do governo federal, déficit equivalente a 2,5% do PIB nos 12 meses até novembro de 2017.

Já o investimento, que atingiu seu pico em setembro de 2014 (1,4% do PIB), vem em queda livre desde então, para 0,9% do PIB em 2015 e 0,8% do PIB nos 12 meses terminados em novembro. Apenas a antecipação do pagamento do BNDES, R$ 50 bilhões, ocorrida no ano passado permitiu que o novo endividamento não superasse o investimento e quebrasse a “regra de ouro”. No entanto, este tipo de operação permite contornar o problema por algum tempo, mas não resolve o desequilíbrio de fundo.

Da mesma forma, flexibilizar a regra de ouro, mesmo introduzindo medidas obrigatórias de ajuste em caso de violação, pode evitar punições aos responsáveis pela gestão fiscal, mas de forma alguma oferece uma solução para um país em que o gasto obrigatório supera a arrecadação e no qual o mundo político não consegue levar adiante reformas que nos levem a reverter o problema do gasto crescente.

Já no caso da CEF, seu uso irresponsável, patrocinado pelos pais (agora ausentes) da Nova Matriz Econômica, levou o banco a uma situação delicada do ponto de vista da relação entre seus ativos (empréstimos) e seu patrimônio (capital), que hoje já se encontra muito próximo dos limites estabelecidos na atual versão do Acordo de Basileia, que deverão se tornar ainda mais duros com a adoção de sua nova versão, conhecida como Basileia III.

Na prática, isto requer a injeção de capital novo, mas, dada a penúria do governo federal, seu único acionista, a alternativa foi a autorização para que o FGTS adquirisse uma dívida perpétua da CEF que, para fins regulatórios, equivale a capital. Contabilmente a aquisição desta dívida não conta como gasto do governo (o FGTS não faz parte da administração pública), também contornando o problema, ao invés de enfrentá-lo.

Não é a primeira vez que o governo tem que colocar dinheiro na CEF; com atitudes como esta, também não será a última.


Continuamos, pois, a empurrar nossos problemas com a barriga, na esperança que algum D. Sebastião venha a resolvê-los, porque nós não queremos fazê-lo.



(Publicado 10/Jan/2018)

14 comentários:

Até parece que a CEF tá preocupada com o Basiléia e a alavancagem deles.

Alex, boa noite!

Quando voce estima uma regressao por GMM, o que voce olha? Eu costumo usar, no dia a dia, é claro (pois nao faria isso em um artigo academico), a estatistica J e o p-valor dela. Assim, vejo se os instrumentos utilizados sao minimamente razoaveis.

Alem disso, voce costuma usar os proprios regressores defasados como instrumento?

Bjo

Cecilia

Sobre descumprir a "regra de ouro", o governo temer congelou os concursos, no mínimo poderia ter feito já uma reforma administrava ou mini-reformas, já cortando cargos de "chefia" que hoje representam 1/3 da folha dos gastos, nem vou discutir o afastamento de dirigentes enrolados em vários processos de competência duvidosa, que ficam por serem cotas de partido.

Sobre a Caixa, a primeira boa notícia de governança veio do Banco Central que graças a eles foram afastados quatro diretores, é um bom exemplo de que pelo menos algumas ilhas existem no Governo Central contra o loteamento que cria desperdícios que vão levar ao descumprimento da "regra de ouro".

"Alem disso, voce costuma usar os proprios regressores defasados como instrumento?"

Já cometi todos os pecados acima...

Um dos efeitos dessas polêmicas sobre assédio sexual será deslocar para a direita as curvas de demanda por masturbação, prostitutas e homossexualismo; no primeiro caso o novo equilíbrio deve ser rápido já que a oferta é infinitamente elástica (dependendo da idade); no segundo pode haver um efeito-preço (inflação) se a oferta não crescer por restrições adicionais do movimento identitário. Os deslocamentos serão maiores na versão americana do que é assédio do que na versão francesa.

Perfeito, Alex. O sebastianismo, presente em nosso DNA, sugere que alguém ou algum evento virá nos salvar. Só as reformas - e a estrita observância de suas regras após sua aprovação - podem mudar nossa trajetória histórico-institucional descendente.

o que estão fazendo na CEF, em continuidade ao governo Dilma, não tem nome melhor que CRIME, desde maquaigem contábil, favorecimento ilicito, propina, engodo contra a economia popular, tudo isso na esteira do mesmo populismo que marcou os 13 nefastos anos de PT.

não é a toa o MP atrás dos 15 vice-presidentes, fora os ex-vices, os tantos presidentes, mas encluam aí até gerentezinhos locais mancomunados com empreiteira de prefeiturazinha do interior e toda a matilha envolta, corretores, assessores, jornalistas, analistas, especuladores.

BraZil S/a.
diga o teu nome, quero ver a tua cara, quero ver quem paga pra gente ficar assim.

Basileia, oras, é só mais uma normazinha chata, vão dar a volta rapidinho nisso aí.

1) a regra de ouro não deveria permitir endividamento apenas para pagamento de principal da dívida? Os juros se caracterizam como serviço, ou seja, custeio. Certamente houve pressão de grupos organizados querendo meia entrada e facilidades pra que o governo se endividasse mais

Só faltou falar da petrobras. Desconfio até que parente vai aparecer nessa eleição
2)O que vc achou da mudança da metodologia de precificação do gás?

Em visita a um amigo numa cidade média do interior, ele me leva pra ver espetáculo assombroso e inédito nas últimas décadas: na periferia dez vezes maior do que cidade propriamente dita, turbas, principalmente mulheres, à tardinha, com feixes de lenhas (galhos secos, bambus) à cabeça. Me diz ele que sitiantes e chacareiros estão trazendo de longe matilhas de pitbulls e rottweilers. É um povinho (povão) ignorante incapaz de entender a política de preços de uma empresa de economia mista, que tem de dar lucros e prestar contas aos seus acionistas, inclusive aos das ADRs, estes capazes de exigir us$ bilhões se as “coisas” não andarem nos eixos...

Alex, eu acho que a macro do dia a dia exige que se utilizem tecnicas como GMM com regressores defasados mesmo. A menos que se tenham bons instrumentos, é o que dá para fazer na correria do dia a dia. Nao se sinta um pecador. Eu uso com frequencia la na consultoria. Acha bizarro? Bjo

"eu acho que a macro do dia a dia exige que se utilizem tecnicas como GMM com regressores defasados mesmo. A menos que se tenham bons instrumentos, é o que dá para fazer na correria do dia a dia. "

Assino embaixo...

Alckmin subindo tarifa de transporte em véspera de eleição kkk.

Liberais são bobos mesmo. Não passa do primeiro turno. Só ganha em São Paulo.

"Alckmin subindo tarifa de transporte em véspera de eleição kkk.

Liberais são bobos mesmo. Não passa do primeiro turno. Só ganha em São Paulo."

Bom mesmo é subir tarifa depois da eleição, como a Dilma fez. Não dá problema...

Alexandre, boa tarde! Li um artigo hoje no Valor sobre possivel perda de eficiencia da politica monetaria. Achei razoavel. O que pensa vc? Bjo, Julia