“Narrativa” virou uma
palavra da moda. Há quem acredite que, mais que uma verdade, só é necessária
uma narrativa que possa ser facilmente reproduzida pelos militantes de plantão,
o que no contexto da disputa política é possivelmente verdade, mas certamente
não quando estamos tentando entender o que de fato ocorreu.
Digo isto porque está
em curso uma tentativa de criar uma narrativa (ou várias) que tire do governo
anterior a responsabilidade pelo desastre que se abateu sobre a economia
brasileira a partir do começo de 2014, do qual só começamos a sair no final de
2016 e começo de 2017.
Não falta quem tente
atribuir a recessão bíblica que vivemos ao suposto “austericídio”, apesar do
aumento persistente das despesas públicas (R$ 16,5 bilhões, já ajustados à
inflação, de 2014 para cá, equivalentes a 1,7% do PIB) e da elevação do déficit
público (limpo de “pedaladas” e afins) de 1,2% para 3,1% do PIB no mesmo
período, ignorando acintosamente o papel dos erros da política econômica
acumulados até o final de 2014.
Tentativa mais sutil de
relativizar os erros do período é a de Marcio “Antonieta” Holland, em artigo
recente na revista Conjuntura Econômica, em que ensaia um mea culpa, algo envergonhado, mas que
esbarra numa série de problemas.
A começar porque quer
limitar sua responsabilidade aos aspectos macroeconômicos do desastre, deixando
para outros o fardo das intervenções desastradas no domínio econômico, que, como afirmei recentemente, conseguiram ser ainda
piores que a política macro.
Quer também atribuir
parcela do fracasso à corrupção, deixando convenientemente de lado que as
oportunidades para a corrupção generalizada que se observou no período tenham
se originado precisamente do intervencionismo patrocinado pela Nova Matriz. Ou
alguém em sã consciência acredita que é mera coincidência a concentração de
tais atos na Petrobras, exemplo maior da política intervencionista? E as
acusações relativas à compra de medidas provisórias, justamente na área das
desonerações tributárias, que o próprio Holland associa à Nova Matriz?
Por outro lado, mesmo
quando se penitencia, ainda se gaba do crescimento do país entre 2011 e 2013
afirmando “algo parece que deu certo”. Já quando fala do período posterior,
lamenta que o estouro do boom de commodities não seja considerado como
fator responsável por “pelo menos um pouco da recessão”.
Lógica curiosa: quando
o país cresce, é porque “algo deu certo”; já na recessão, invoca-se o preço das
commodities.
A verdade é que países
latino-americanos como Chile, Colômbia e Peru – que compartilhavam com o Brasil
a dependência de preços de commodities
(e são muito mais abertos ao comércio internacional, portanto mais sensíveis a
esta variável), mas que mantiveram políticas econômicas corretas – sofreram uma
desaceleração de seu crescimento da casa de 1,5% a 2,5% entre 2011-14 e
2015-16; já o Brasil passa por uma queda de 6 pontos percentuais (de +2,3% aa para
-3,7% aa) no mesmo período e vê seu PIB encolher. Algo parece que não
deu certo.
Ao fim da história, temos mais um exercício de equilibrismo do que o reconhecimento do estrago que suas políticas causaram ao país. Ao invés de um longo artigo, Holland poderia simplesmente ter dito: fiz a Nova Matriz, mas não fui eu...
(Publicado 17/Jan/2018)
5 comentários:
Bom dia, caros. Gostaria de ouvir a opinião de vocês (ou indicasse alguem) sobre a fala do Paul Romer em relacao ao modelo utilizado pelo Banco Mundial e repercussões do caso. Um grande abraço.
Há muita histeria, como esperado, e um olhar sóbrio sobre o caso cairia muito bem.
1- Na CPI, o governo apresentou os seguintes números da RGPS para 2016:
Despesas com Benefícios: 516 Bi
Arrecadação Líquida: 364 Bi
Déficit = 152 Bi
2- O reajuste para as aposentadorias em 2017 foi de 6,58% e a arrecadação teve aumento de 4,6% (informado pelo governo neste mês). Projetando, com base em 2016, para 2017:
Despesas com Benefícios= 550 Bi
Arrecadação Líquida = 381 Bi
Déficit = 169 Bi
3- O déficit informado para 2017 pelo governo é de 182 Bi. A diferença de 13 Bi deve-se às novas aposentadorias em 2017, certo?
4- Quantas novas aposentadorias foram em 2017? “Diante do infindável vaivém sobre o que fica e o que sai do texto, 1.083.920 brasileiros se aposentaram pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) apenas entre janeiro e setembro deste ano [2017], recorde de aposentadorias no período.” http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2017/11/19/internas_economia,641902/aposentadoria-do-inss-da-salto-e-cresce-14-em-um-ano.shtml
5- Supondo uma interpolação linear, daria aproximadamente 1,4 Mi aposentados em 2017.
6- Logo cada novo aposentado do RGPS recebe R$ 9.286, sendo que o teto é R$ 5.703.
Onde está o erro?
Alex, o que costuma usar de instrumento no seu gmm de curva IS, Philips e Taylor?
Abracao
Julio
"Alex, o que costuma usar de instrumento no seu gmm de curva IS, Philips e Taylor?"
No contexto do modelo, não estimo a RT.
Para a IS:
Monitorados T Bill Vix Log Hiato Prod. Mundial Cresc. Prod. Potencial Mund. CRB USD Oil USD
Defasadas
Hiato Impulso fiscal Swap 360 Expect. Inflação
Para a CP:
CRB USD Oil USD
Defasadas
Monitorados IPCA Expect. Inflação Hiato
"6- Logo cada novo aposentado do RGPS recebe R$ 9.286, sendo que o teto é R$ 5.703.
Onde está o erro?"
Acredito que vc nao corrigiu o valor das aposentadorias, que recebem aumento todos os anos.
abs.,
Nerso
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