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terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Fiz, mas não fui eu...

“Narrativa” virou uma palavra da moda. Há quem acredite que, mais que uma verdade, só é necessária uma narrativa que possa ser facilmente reproduzida pelos militantes de plantão, o que no contexto da disputa política é possivelmente verdade, mas certamente não quando estamos tentando entender o que de fato ocorreu.

Digo isto porque está em curso uma tentativa de criar uma narrativa (ou várias) que tire do governo anterior a responsabilidade pelo desastre que se abateu sobre a economia brasileira a partir do começo de 2014, do qual só começamos a sair no final de 2016 e começo de 2017.

Não falta quem tente atribuir a recessão bíblica que vivemos ao suposto “austericídio”, apesar do aumento persistente das despesas públicas (R$ 16,5 bilhões, já ajustados à inflação, de 2014 para cá, equivalentes a 1,7% do PIB) e da elevação do déficit público (limpo de “pedaladas” e afins) de 1,2% para 3,1% do PIB no mesmo período, ignorando acintosamente o papel dos erros da política econômica acumulados até o final de 2014.

Tentativa mais sutil de relativizar os erros do período é a de Marcio “Antonieta” Holland, em artigo recente na revista Conjuntura Econômica, em que ensaia um mea culpa, algo envergonhado, mas que esbarra numa série de problemas.

A começar porque quer limitar sua responsabilidade aos aspectos macroeconômicos do desastre, deixando para outros o fardo das intervenções desastradas no domínio econômico, que, como afirmei recentemente, conseguiram ser ainda piores que a política macro.

Quer também atribuir parcela do fracasso à corrupção, deixando convenientemente de lado que as oportunidades para a corrupção generalizada que se observou no período tenham se originado precisamente do intervencionismo patrocinado pela Nova Matriz. Ou alguém em sã consciência acredita que é mera coincidência a concentração de tais atos na Petrobras, exemplo maior da política intervencionista? E as acusações relativas à compra de medidas provisórias, justamente na área das desonerações tributárias, que o próprio Holland associa à Nova Matriz?

Por outro lado, mesmo quando se penitencia, ainda se gaba do crescimento do país entre 2011 e 2013 afirmando “algo parece que deu certo”. Já quando fala do período posterior, lamenta que o estouro do boom de commodities não seja considerado como fator responsável por “pelo menos um pouco da recessão”.

Lógica curiosa: quando o país cresce, é porque “algo deu certo”; já na recessão, invoca-se o preço das commodities.

A verdade é que países latino-americanos como Chile, Colômbia e Peru – que compartilhavam com o Brasil a dependência de preços de commodities (e são muito mais abertos ao comércio internacional, portanto mais sensíveis a esta variável), mas que mantiveram políticas econômicas corretas – sofreram uma desaceleração de seu crescimento da casa de 1,5% a 2,5% entre 2011-14 e 2015-16; já o Brasil passa por uma queda de 6 pontos percentuais (de +2,3% aa para -3,7% aa) no mesmo período e vê seu PIB encolher. Algo parece que não deu certo.

Ao fim da história, temos mais um exercício de equilibrismo do que o reconhecimento do estrago que suas políticas causaram ao país. Ao invés de um longo artigo, Holland poderia simplesmente ter dito: fiz a Nova Matriz, mas não fui eu...

Forjei a Nova Matriz, mas não fui eu


(Publicado 17/Jan/2018) 

5 comentários:

Bom dia, caros. Gostaria de ouvir a opinião de vocês (ou indicasse alguem) sobre a fala do Paul Romer em relacao ao modelo utilizado pelo Banco Mundial e repercussões do caso. Um grande abraço.
Há muita histeria, como esperado, e um olhar sóbrio sobre o caso cairia muito bem.

1- Na CPI, o governo apresentou os seguintes números da RGPS para 2016:

Despesas com Benefícios: 516 Bi
Arrecadação Líquida: 364 Bi
Déficit = 152 Bi

2- O reajuste para as aposentadorias em 2017 foi de 6,58% e a arrecadação teve aumento de 4,6% (informado pelo governo neste mês). Projetando, com base em 2016, para 2017:

Despesas com Benefícios= 550 Bi
Arrecadação Líquida = 381 Bi
Déficit = 169 Bi

3- O déficit informado para 2017 pelo governo é de 182 Bi. A diferença de 13 Bi deve-se às novas aposentadorias em 2017, certo?

4- Quantas novas aposentadorias foram em 2017? “Diante do infindável vaivém sobre o que fica e o que sai do texto, 1.083.920 brasileiros se aposentaram pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) apenas entre janeiro e setembro deste ano [2017], recorde de aposentadorias no período.” http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2017/11/19/internas_economia,641902/aposentadoria-do-inss-da-salto-e-cresce-14-em-um-ano.shtml

5- Supondo uma interpolação linear, daria aproximadamente 1,4 Mi aposentados em 2017.

6- Logo cada novo aposentado do RGPS recebe R$ 9.286, sendo que o teto é R$ 5.703.

Onde está o erro?

Alex, o que costuma usar de instrumento no seu gmm de curva IS, Philips e Taylor?

Abracao
Julio

"Alex, o que costuma usar de instrumento no seu gmm de curva IS, Philips e Taylor?"

No contexto do modelo, não estimo a RT.

Para a IS:
Monitorados T Bill Vix Log Hiato Prod. Mundial Cresc. Prod. Potencial Mund. CRB USD Oil USD

Defasadas
Hiato Impulso fiscal Swap 360 Expect. Inflação

Para a CP:
CRB USD Oil USD

Defasadas
Monitorados IPCA Expect. Inflação Hiato

"6- Logo cada novo aposentado do RGPS recebe R$ 9.286, sendo que o teto é R$ 5.703.

Onde está o erro?"


Acredito que vc nao corrigiu o valor das aposentadorias, que recebem aumento todos os anos.


abs.,
Nerso