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terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Pirâmides

Boa parte das dificuldades para explicar a necessidade de reforma da Previdência vem do desconhecimento dos rudimentos do regime previdenciário. Em retrospecto, deveria ter escrito isto antes, mas, já que a reforma não irá ocorrer no atual mandato, podemos deixar pronto para recomeçar a discussão mais à frente. Ainda é possível adiar o encontro com a realidade; fugir dele é outra história.

Imagine um mundo em que há sempre duas gerações: uma jovem, trabalhando; outra mais velha, já aposentada. Há basicamente duas formas de garantir que a geração aposentada possa se manter durante a velhice.

Uma alternativa requer que a geração ativa poupe para seus anos futuros, por exemplo, criando fundos de pensão que investirão os recursos guardados e, quando da aposentadoria, pagarão aos investidores certa renda, que depende da rentabilidade de suas aplicações, bem como de um conjunto de outros parâmetros, como expectativa de vida, idade de aposentadoria, etc. Este regime previdenciário é denominado “capitalização” e são poucos países que o adotam como elemento central para sua previdência.

A outra é um regime de repartição. Sob esta organização, a geração ativa transfere uma parcela de sua renda para a geração inativa, em troca de ser tratada da mesma forma quando chegar sua vez de se aposentar e uma nova geração tomar seu lugar no mercado de trabalho.

O leitor mais atento há de notar alguma semelhança com o esquema de “pirâmides” financeiras, exceto por um elemento crucial: a população de um país ao longo do tempo é, para efeitos práticos, infinita. Sempre haverá uma geração substituindo a outra e o esquema funciona enquanto novas gerações vierem à vida, sob algumas condições.

Caso a proporção entre inativos e ativos fosse sempre a mesma, não seria difícil calibrar o regime para que funcionasse indefinidamente. Ocorre que não é este o caso, nem no Brasil, nem no mundo.

Por um lado as pessoas têm vivido mais. No Brasil a expectativa de vida ao alcançar a idade de aposentadoria tem subido continuamente (em 1980 a expectativa de sobrevida aos 60 anos chegava a 16 anos; hoje atinge 22), o que implica aumento da população aposentada. Por outro lado, a fecundidade tem caído: em 1980 cada mulher dava à luz, em média, 4 filhos; em 2017 esta média já havia recuado para 1,8 nascimentos/mulher. Posto de outra forma, a geração ativa também se tornou menor.

Em consequência de ambos os desenvolvimentos, a relação entre idosos e jovens (também chamada “razão de dependência”) vem caindo subindo e cairá subirá ainda mais no futuro, independentemente do que fizermos, pois o dado demográfico já foi lançado. [Obrigado pela correção, https://twitter.com/RicardoRangel_)

Assim, em 1980 a razão de dependência apontava uma população acima de 60 anos equivalente a 11% da população em idade ativa (de 15 a 59 anos); já em 2020 se espera que esta proporção se eleve para quase 21%, chegando a 52% em 2050.

A previdência no Brasil já é desequilibrada hoje, não só pela demografia, mas também pelos privilégios de categorias que se aposentam em condições muito mais favoráveis, sem contrapartida de contribuições equivalentes na ativa.


Caso os parâmetros do regime não sejam corrigidos, o que parecia ser uma pirâmide se tornará um monumento real aos faraós que hoje lutam – e com sucesso! – para manter suas regalias.

Pirâmides



(Publicado 20/Dez/2017) 

12 comentários:

Esse desenho prova duas coisas, primeiro, a falta de consistência nas coisas porque a base é a unica parte da piramide cujo intervalo não é de 4 anos, e segundo, as mulheres estão acabando com os homens... O negócio é capitalizar mesmo, porque depender do governo brasileiro é sinônimo de loucura!

Em 19/maio foi publicado um comentário aqui dizendo que a denúncia da JBS (18/maio) tinha como objetivo atacar a reforma da previdência .Na época isso foi considerado uma mera aplicação da teoria da conspiração- uma tradição da esquerda - mas vem se confirmando e ganhando adeptos(vide Delfin e coluna de Samuel domingo);afinal conspirações existem .

seria interessante mostrar a diferença entre a previdência dos trabalhadores da área privada e publica que é o grande X da questão

Em termos de risco de demografia, numa economia fechada, ha alguma diferenca real entre os regimes de capitalizacao e reparticao? Vamos supor que o plano de previdencia no regime de capitalizacao invista em varios projetos de infrastrutura de longo prazo, para casar os ativos com os passivos. Se a populacao cair, o valor e fluxo de caixa desses projetos de infrastrutura vao cair tambem, correto? De uma certa forma, com essa razao de dependencia pendendo para mais idosos vs. jovens, voce nao esperaria uma inflacao do custo de mao de obra muito superior ao de bens (consumo caindo)? Os paises desenvolvidos parecem estar passando por isso. Por fim, nao vejo como politicas podem salvar um pais de uma shrinking population...

Alex, o Raj Cheety, de Stanford, costuma mostrar que a depender do percentil da distribuição de renda em que você se encontra, sua expectativa de sobrevida varia consideravelmente. Os mais pobres tem expectativa de sobrevida bem menor ao chegar aos 40 do que os muito ricos (quase dez anos de diferença).

Dado que o bem-estar dos mais ricos é bem superior ao dos mais pobres, não acha que a Reforma da Previdência poderia ter idades mínimas de aposentadoria dependentes da renda do indivíduo? Todos deveriam se aposentar mais tarde em relação ao que temos hoje, mas os mais ricos se aposentariam ainda mais tarde.

Abs
Economista X

Prezado Alex,

O aumento das metas de inflação na Argentina não te parece mágica que nossa "turma" já vislumbrou como solução criativa infalível?

Sem uma discussão séria do excesso de benefícios dos já aposentados do nosso sistema e com um governo nos moldes do brasileiro que gasta em luxo (para ser bondoso), mesmo aquela inicial, a situação fiscal não se sustenta, a previdência só reflete os privilégios da sociedade, quem mais capitalizou-a é que menos recebe, e ainda financiou obras ruins via BNDES pelo FGTS e FAT.

Se for para sistema ser cada um paga a sua,que seja, meu dinheiro investido tem que ser aplicado melhor, é uma conta simples, quanto mais rendimento melhor para mim, mas o sistema atual é eu financio os outros como Temer e Lula e ainda obras como estádios de futebol, todo o dinheiro , foi para o ralo, a situação atual as vezes é melhor quebrar e fazer uma reforma séria em todo atual sistema de direitos e deveres da nossa Constituição, eu quero pelo menos pagar e ter algum que seja pelo menos o meu $$ ser melhor cuidado.

Bom dia Alex,

A TLP foi um sucesso, é inegável. Mas o Banco Central poderia ser mais transparente com a divulgação desta taxa, não?

Primeiro, não está claro se a taxa depende da inflação mensal ou acumulada em 12 meses. Se for mensal, isso é uma merda, pois há sazonalidade gigante.

Segundo, porque não há em lugar nenhum uma informação que diz quanto está a TLP hoje. Apenas divulgaram uma taxa que serve de insumo pro cálculo.

Um abraço,
Carlos Lito

É justo diminuir a aposentadoria de quem estudou tanto para passar em um concurso publico?

É justo diminuir a aposentadoria de quem estudou tanto para passar em um concurso publico?

É.

Discordo de uma das hipóteses assumida na sua análise.

O sistema de previdência no Brasil não é de repartição “pura”, pelo simples fato que, a CF no seu Art 194 estabelece contribuições sociais para seu financiamento, via seguridade social (PIS, COFINS e outras). O brasileiro, além da sua contribuição previdenciária, paga impostos para financiar o INSS (o qual é desviado via DRU).

Sendo assim, a previdência tem 2 fontes de recursos. A primeira depende da distribuição demográfica e a segunda do crescimento do PIB.

Portanto, o senhor precisaria mostrar que o crescimento histórico do PIB não será suficiente para compensar a variação demográfica para concluir que a RGPS não é sustentável, com a legislação em vigor (sem idade mínima).

O RPPS obviamente não é sustentável e, portanto, esse privilégio deve acabar.

Se for para reformar a RGSP, a proposta do Economista X (29/12) é mais justa socialmente.

Qual a sua opinião sobre uma "tabela progressiva"? Normalmente liberais são contra ...

Discordo de uma das hipóteses assumida na sua análise.

Pode discordar; continua errado

O sistema de previdência no Brasil não é de repartição “pura”, pelo simples fato que, a CF no seu Art 194 estabelece contribuições sociais para seu financiamento

Duplamente errado. Outros impostos ainda seriam pagos - como sao - pagos pela geração ativa para os inativos; a própria definição de repartição. E você, como os desonestos da ANFIP, mistura previdência com seguridade social.

o senhor precisaria mostrar que o crescimento histórico do PIB não será suficiente para compensar a variação demográfica para concluir que a RGPS não é sustentável, com a legislação em vigor (sem idade mínima).

Serio? Preciso mesmo? Em que planeta, ou melhor, em que Dimensão você vive?