O Banco
Central finalmente reconheceu que o baixo crescimento do Brasil não resulta da
fraqueza do consumo, mas de limites à expansão da capacidade produtiva do país.
Trata-se de uma mudança importante na atitude da autoridade monetária que, até
semana passada, parecia comungar com o restante do governo a noção que o
desenvolvimento do país viria na esteira do juro baixo e do dólar caro.
Na verdade,
há uma importante suposição implícita nesta noção, a saber, que a economia disporia
de suficiente capacidade ociosa para que o impulso do lado da demanda (consumo
e investimento, pelas taxas de juros, e exportações, pelo efeito da taxa de
câmbio) possa se transformar em aumento da produção.
“Capacidade
ociosa” neste contexto tem um significado amplo, abrangendo – além da
capacidade instalada na indústria – também a disponibilidade e qualificação de
mão-de-obra, os serviços de infraestrutura, assim como todas as regras de
organização da produção no país que se traduzem no nível de produtividade.
Ocorre que,
se há ainda algum excesso de capacidade no setor industrial, nos demais as
indicações são no sentido oposto. Não apenas as taxas de desemprego vêm em queda
persistente, mas também os salários têm subido bem acima de qualquer estimativa
honesta do aumento da produtividade. Em particular os sinais de falta de
mão-de-obra são ainda mais pronunciados no caso do pessoal qualificado. A
infraestrutura, por fim, está esgarçada, como sabe qualquer um que tenha usado estradas,
portos ou aeroportos, culminando, mais recentemente, em elevações expressivas
dos preços de energia no mercado à vista.
E, ao
contrário do que ocorre no setor industrial, onde investimentos tendem a se
materializar em capacidade adicional em prazos relativamente curtos (em torno
de 18 meses), estes gargalos são de correção bem mais complicada. É risível
acreditar, como andei lendo por aí, que imigração possa resolver o problema
geral de falta de mão-de-obra (qualificada inclusive) num país das dimensões do
Brasil, onde, de acordo com o último dado disponível (2009), o total de pessoas
empregadas atingia pouco menos de 97 milhões.
Já no que
diz respeito à educação, o tempo necessário para promover a mudança requerida
se mede em anos, senão gerações, e isto na suposição que, de repente, fizéssemos
todas as coisas certas, as mesmas que passamos as últimas décadas cuidadosamente
evitando.
Adicionalmente,
embora a iniciativa de conceder ao setor privado a responsabilidade por
segmentos da infraestrutura seja louvável, os resultados obtidos pelas
concessões anteriores não permitem nenhum otimismo quanto a uma solução de
curto prazo. Trata-se de um caso exemplar de “muito pouco, muito tarde”, ao que
poderia acrescentar: “e errado também”...
Por fim, o
crescimento da produtividade tem sido pífio, e o padrão errático da política
econômica contribui para enfraquecê-lo ainda mais. Desde meados da década
passada não há uma agenda de reformas que busque acelerá-la e mesmo que uma milagrosamente
surgisse (literalmente) do nada, a experiência sugere que seus efeitos só se manifestariam depois de alguns anos.
Assim, sem
capacidade ociosa e sem que haja possibilidade de surgimento de nova capacidade
no futuro imediato, não faz sentido tentar estimular o crescimento por meio de
incentivos à demanda, como admitido pelo BC. Sob estas circunstâncias, o
impulso monetário se transmite principalmente aos preços, ou seja, a divergência
da inflação com relação à meta é apenas a outra face do esgotamento da
capacidade de crescimento da oferta.
Mas, se isto
é verdade, segue-se que a política monetária tem sido (e ainda é) inadequada
para trazer a inflação à meta. Como, porém, o BC demorou quase ano e meio para
entender o que estava ocorrendo, deve ainda encontrar dificuldades para atingir
as conclusões lógicas de seu próprio argumento.
Epifania na
última reunião
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(Publicado 30/Jan/2013)