Não foram poucas as vezes que se ouviram críticas à pesquisa Focus, na qual o Banco Central busca sistematizar as previsões de analistas acerca de um conjunto amplo de variáveis, com maior ênfase nas expectativas de inflação. Ainda que não sejam a palavra final sobre o assunto, estas desempenham um papel central nos modelos que o BC usa para projetar a trajetória da inflação, tanto pelo canal de determinação da taxa real de juros, como pelo seu efeito sobre a determinação dos preços correntes.
Com base nisto há quem afirme que a predominância de analistas ligados ao mercado financeiro no Focus criaria distorções. Sugerem que haveria incentivos para analistas do mercado “carregarem nas tintas” das expectativas de modo a induzir o BC a definir uma trajetória da taxa de juros mais alta do que a estritamente necessária para manter a inflação na meta, o que beneficiaria bancos e administradoras de recursos. O incentivo inverso, no caso ser incluído entre os analistas de maior grau de acerto (“Top 5”), seria muito tênue face aos ganhos que advindos de uma taxa de juros mais elevada (isto vale uma discussão à parte, que, para evitar dispersão, fica para outro dia).
Esta hipótese pode, contudo, ser testada empiricamente. Se é verdade que os analistas de mercado deliberadamente informam ao Banco Central expectativas superiores àquelas que acreditam, a inflação observada deveria também ser sistematicamente inferior às projeções do Focus.
A palavra-chave, no caso, é “sistematicamente”. É claro que, num dado ano, a inflação pode ser menor que a prevista pelo Focus (como ocorreu em 2006 e 2009), mas esta observação não é suficiente para caracterizar uma distorção; da mesma forma que o Focus superestimou a inflação naqueles anos, também subestimou a inflação em 2007, 2008 e 2010. Em outras palavras, as projeções apresentam erros, mas não está claro que sejam sistemáticos.
Fonte: Autor a partir de dados do IBGE e Banco Central |
Já o erro médio do Focus 12 meses à frente no período atingiu -0,37%, também incongruente com a tese de superestimação. Finalmente, uma medida padrão do grau de assimetria da distribuição (“obliquidade”, ou skewness) revela que esta é “torcida” para o quadrante negativo, isto é, há mais chance de valores negativos para o erro de previsão, sugerindo ser mais provável que a inflação supere as expectativas do que o contrário. Em outras palavras, a evidência empírica indica que o Focus tende a subestimar a inflação, não superestimá-la, desmentindo a tese de conspiração.
Outros estudos, notadamente de Affonso Pastore[1], mostram que as expectativas Focus podem ser explicadas não apenas pela inflação passada, mas também por variáveis que capturem o comportamento da inflação futura, como preços de commodities em moeda nacional e medidas de pressão de demanda sobre os recursos da economia, além, é claro, da própria meta de inflação. Esta última, pelo menos até recentemente, parece desempenhar o papel mais importante na determinação das expectativas, mas pode estar perdendo a capacidade de “ancorá-las”.
De fato, mesmo que os agentes continuem a acreditar que o BC está perseguindo a meta, é possível mostrar que, quanto mais gradualista for a reação do BC à inflação (isto é, quanto mais lenta for a resposta da taxa de juros), tanto maior deverá ser o peso da inflação passada nas expectativas de inflação. No limite, a meta pode perder toda a relevância para determinar as expectativas.
Neste aspecto, mesmo reconhecendo as incertezas que cercam as perspectivas para inflação e crescimento, é forçoso concluir que a recente decisão de reduzir o ritmo de ajuste da taxa de juros traz também o risco de que os agentes passem a atribuir maior peso à elevada inflação passada na formação das expectativas, dificultando adicionalmente a tarefa da convergência à meta.
Em tal contexto, não adianta reclamar da pesquisa Focus. Se o BC quer domar as expectativas e reduzir a inércia, o melhor a fazer é tomar as medidas que mostrem seu comprometimento com a meta de inflação, e não participar da temporada de caça ao mensageiro das más notícias.
Não é minha culpa... |
(Publicado 5/Mai/2011)
5 comentários:
Muito bom o texto. No discurso o mercado é viesado, mas na prática ele é pragmático. Um ponto importante é que o maior gradualismo do BC atual pode dar o resultado que ele espera (e não o que eles, mercado, esperam). Então, o mercado se adaptará ao bom resultado, voltando a ver a meta como centro das expectativas de médio/longo prazo. entretanto, introduzir um maior gradualismo nesse momento me parece obviamente inoportuno e arriscado. Tem muitas goteiras heterodoxas na política econômica pro BC se achar o FED.
Fernando A.
Ótimo texto Alex.
Mas se perdeu nessa enxurrada de posts. Quase que não li.
Abs
Leo
Alex,
o Padovanni publicou no blog dele na Exame dizendo que inflação é uma discussão menos importante. E que, austeriadade fiscal era mais importante para a confiança na economia.
Você discorda dele??
Parabéns.
Esta turma (mantega na frente)é de uma demagogia (será ignorância?)revoltante. Falaram que não havia risco da meta ser ultrapassada, depois que não havia importância do teto ser atingido, que não havia risco do um processo inflacionáreio retornar. Trouxeram de volta o risco da indexação (depois de negarem o risco de inflação). Agora querem culpar o que trouxeram de volta: a indexação: são uns cara de pau (dá até nojo). A crítica que fizeram ao FOCUS é senvergonhice barata.
Segue abaixo um breve trecho extraido direto de um sonho do nosso querido ministro: http://www.youtube.com/watch?v=ve7NK3IvcrE
Postar um comentário