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sexta-feira, 7 de junho de 2019

Os novos panetones


Quando escrevi minha coluna sobre a proposta de usar a conta única para financiar as despesas do governo não sabia que o sr. Orelho, o mesmo dos panetones, tinha caído no conto da conta única (ou talvez tentado  perpetrar o golpe da conta única). Mas soube que ficou ofendidinho.

Sua resposta, no caso, é que, pela metodologia do FMI para contabilidade da dívida, toda carteira de títulos públicos no BC já teria que ser considerada no cálculo e que, portanto, o uso de operações compromissadas para esterilizar o aumento da base monetária resultante do uso da conta única (possibilidade que, diga-se, não lhe havia ocorrido), não implicaria (verbo transitivo direto, por favor) aumento da dívida.

Dois comentários a respeito. Em primeiro lugar, não usamos a metodologia do FMI. Se usássemos nossa dívida seria 86% do PIB; não 78%. E, de acordo com nossa metodologia, a dívida não inclui os títulos da carteira do BC, mas inclui as compromissadas. Isto, contudo, é de menor relevância.

O mais importante é que, em face de saques persistentes da conta única, cedo ou tarde a carteira de títulos livres do BC iria se reduzir, até o ponto em que o Tesouro necessitaria fazer novo aporte de títulos. Aí, mesmo seguindo – como aparentemente o sr. Orelho defende – a metodologia do FMI, a dívida aumentaria do mesmo jeito.

De qualquer forma, ganhei um bônus, porque amigos me mandaram a coleção de atrocidades condensada na apresentação que o sr. Orelho fez no Congresso.

Dentre elas a afirmação que a dívida não segue trajetória explosiva porque “a taxa de crescimento da relação dívida/PIB está desacelerando”. Curiosa afirmação.

Em primeiro lugar porque parece ter faltado às aulas de cálculo. Se a taxa de crescimento da relação dívida/PIB for positiva, mesmo que menor que no passado, a relação dívida/PIB será crescente e, portanto, explosiva.

Em segundo lugar porque a desaceleração da taxa de crescimento da relação dívida/PIB se deve, em parte, à redução dos créditos concedidos às instituições financeiras oficiais (BNDES, BB e CEF), de 8,8% para 4,9% do PIB entre meados de 2016 e abril de 2019.Isto, porém, é um fenômeno não recorrente, que evita por ora aumento mais acentuado da dívida, mas que não reverte a trajetória de endividamento.

Afora isto, o menor crescimento se deve à redução do déficit primário (e das taxas de juros, que tratarei em seguida), resultado que só foi possível pela aplicação do teto de gastos, medida a que o sr. Orelho se opôs (e se opõe). Note-se ademais que, como se sabe, o teto de gastos não poderá ser mantido sem a reforma da previdência, a mesma contra a qual ele preparou os argumentos.

Soa estranho, mas, no fim das contas, ele quer usar o argumento (equivocado, como se viu) que a dívida está crescendo mais devagar para torpedear a proposta que permite ao mecanismo de desaceleração da dívida funcionar. É mais ou menos como argumentar que o gordinho não precisa mais fazer regime porque o regime que está fazendo reduziu seu ritmo de ganho de peso. Como não resisto a uma sacanagem, podemos entender a forma física do sr. Orelho a partir de suas convicções econômicas.

Numa demonstração da honestidade intelectual que o caracteriza, apresenta o custo com juros da dívida em 2015, quando a taxa de juros era mais alta e as perdas com os swaps cambiais atingiram (a preços de hoje) R$ 131 bilhões, ou 1,7% do PIB. Os dados já disponíveis hoje mostram o custo da dívida em 5,5% do PIB, 3 pontos abaixo   observado no período escolhido a dedo, quatro anos atrás...

Afirma finalmente que o problema não é o excesso de gastos, mas crescimento anêmico. Considerando que até a criação do teto de gastos, as despesas federais cresceram cerca de 6% ao ano acima da inflação, o sr. Orelho recomenda como solução que cresçamos pelo menos 6% ao ano. Dado que o crescimento da força de trabalho roda hoje a cerca de 1,5% ao ano (e vai se reduzir com a transição demográfica), bastaria que a produtividade se expandisse ao ritmo de 4,4% ao ano, taxa que, diga-se, jamais foi registrada nos últimos 30 ou 40 anos.

Como dizia um amigo: eu não sou gordo; só não tenho os 2,15m que meu peso requer...

Enfim, entendo que o pessoal heterodoxo não sobrevive sem uma proposta mágica de gastar sem contrapartida de custo, mas vai ter que pensar um pouco mais. De preferência não no banheiro do shopping.




6 comentários:

Ontem no STF soprou uma brisa de racionalidade
econômica.

Qual foi o peso da redução da SELIC nesta melhoria relativa do endividamento?

O professor Oreiro é prova viva que saber escrever bem, não é condição suficiente para saber calcular bem!

"saber escrever bem"

Como? O cara usa "implicar" como verbo transitivo indireto ("implicar em"), prova de desconhecimento da língua portuguesa.

Nossa mãe do céu
Que esculacho

Achei parte do que eu queria sobre o orçamento do japão. Juro da dívida interna e pagamento do vencimento do principal (abatimento da dívida) entra como gasto público. Aqui também é assim? O pagamento do principal é simples rolagem da dívida. Não é escandaloso, não é grave. Conclui sim que a maior parte do tal déficit japonês é este pagamento da parte da dívida interna que vence no exercício orçamentário. Não é gasto e mais gasto para estimular empregos. Só não achei a compra de ETFs contabilizada como gasto público do orçamento fiscal.