sexta-feira, 28 de novembro de 2014
quarta-feira, 26 de novembro de 2014
A nova matriz aritmética
Um governo
verdadeiramente comprometido com as causas populares não pode se sujeitar às
restrições impostas pelas forças conservadoras, neoliberais, feias, bobas e
cara de tacho.
A despeito das objeções
da direita golpista, amparadas em obras marcadamente reacionárias, como “A Aritmética da Emília” e “Aprendendo a Contar” (Yoyo Books: obviamente
uma insidiosa doutrinação imperialista), as forças progressistas enviaram ao
soberano Congresso Nacional (de quem se espera a não sujeição às pressões
autoritárias da oposição) projeto de lei que revoluciona a matemática e cria um
instrumento de revolta contra as classes opressoras.
Muito embora a Lei
de Diretrizes Orçamentárias (a famigerada LDO) requeira do governo
popular da presidenta Dilma a geração este ano de um superávit primário de R$ 116
bilhões para atender as demandas dos rentistas, a combinação de sua
administração previdente e a matemática dialética já permitia atender esta
injusta exigência com um superávit de apenas R$ 49 bilhões.
A diferença (R$ 67
bilhões) seria utilizada para fins mais nobres, como o Programa de Aceleração de
Crescimento (o PAC, já em sua n-ésima edição, sem que a primeira tenha sequer
acabado!) e as desonerações tributárias, peças essenciais da estratégia de desenvolvimento
com inclusão (oposta, é bom dizer, à defendida pelos ortodoxos), que permitem
crescimento acelerado com melhora na distribuição de renda, mesmo que os
números do IBGE, possivelmente devido a uma conspiração retrógrada, ainda se
recusem a admitir estas conquistas.
Não contávamos,
contudo, com a má vontade dos países desenvolvidos, que – certamente com o
objetivo de impedir os avanços populares no Brasil – se recusam a crescer. No
entanto, sob a inspirada gerência da nossa presidenta, a Guia Genial dos Povos,
e do Querido Líder, o ministro-chefe da Casa Civil, demos um passo
extraordinário à frente. Com a nova proposta poderemos abater dos recursos
destinados aos rentistas um valor maior do que os R$ 116 bilhões originalmente
reservados. O resultado final será negativo, mas também superavitário!
Em outras palavras,
criamos o superávit negativo, a contradição dialética que fará avançar
não apenas a Economia Política, mas a própria matemática, muito além dos
limites estreitos da imaginação burguesa. Demos início à Nova Matriz Aritmética (NMA).
Segundo esta nova
práxis, as forças progressistas deixarão de se sujeitar aos ditames do mercado
e dos professores de matemática. De agora em diante o superávit negativo será a
norma. Nunca mais na história deste país um governo terá que cumprir metas
fiscais anacrônicas: a meta será sempre aquilo que alcançarmos, nem mais, nem
menos (ou os dois ao mesmo tempo).
As implicações são
infinitas. Por exemplo, no mundo da NMA a inflação pode ser superior à meta ao
mesmo tempo em que é igual a ela e também inferior. Com isto o BC se livrará do
jugo do mercado financeiro e poderá se dedicar ao objetivo de estimular ainda
mais o desenvolvimento do país.
A assim chamada
“inflação”, outra invenção conservantista, será incorporada ao crescimento do
PIB, impulsionando de forma decisiva a renda da classe trabalhadora.
De quebra a NMA
possibilitará ainda que a Petrobras nunca mais passe pelo vexame de não
conseguir fechar seu balanço na data limite. Aliás, não haverá balanço que não
feche; principalmente aqueles de empresas que financiam as lutas políticas em
prol da igualdade.
O primeiro governo
Dilma lançou as bases da prosperidade nacional; seu segundo governo, agora
amparado pela NMA, irá ainda mais longe, além de onde Judas perdeu as botas. Lamentamos
apenas que o ministro da Fazenda, um dos criadores da NMA, não possa nos
liderar nesta jornada rumo ao futuro. Esperamos, todavia, que continue a
ensinar esta disciplina na escola da vida; só, de preferência, jamais no
Pronatec.
Apenas
mais uma das aplicações...
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(Publicado 19/Nov/2014)
terça-feira, 25 de novembro de 2014
quinta-feira, 20 de novembro de 2014
quarta-feira, 19 de novembro de 2014
Vida em Tlön
Às vezes, na verdade
quase sempre – o “quase” apenas para acomodar alguma exceção desconhecida –
tenho a impressão que nossos “keynesianos de quermesse” habitam uma dimensão à
parte (a Dimensão Z), onde os fatos se acomodam às crenças, permitindo que o
voluntarismo mais primitivo se estabeleça como ideologia hegemônica.
Veja-se, por exemplo, o
manifesto publicado por
luminares da quermesse nacional, defendendo a manutenção da atual política
econômica. Não bastasse reivindicar para si o monopólio do desenvolvimento com
inclusão social – como se todos os demais economistas favorecessem a decadência
econômica com piora da distribuição de renda –, os signatários do documento
levam às raias do extremismo a distância entre o mundo como ele é e a realidade
como reflexão distorcida de uma mentalidade peculiar.
A declaração é um
repúdio às políticas de austeridade, não apenas no que se refere à política
monetária, mas principalmente no que diz respeito à política fiscal. O mau
desempenho econômico dos países desenvolvidos é apontado como resultado da
redução da despesa pública, enquanto se sugere que a elevação dos gastos governamentais
no Brasil nos faria retomar o crescimento.
Trata-se de
impressionante incapacidade de distinguir os problemas brasileiros daqueles
enfrentados por alguns países desenvolvidos, notadamente na periferia europeia.
Lá o desemprego é alto
e a inflação se encontra muito abaixo da meta. Na Espanha, por exemplo, o primeiro
segue acima de 20% e a segunda (medida ao longo de 12 meses) tem ficado em
terreno negativo, situação semelhante à enfrentada por Portugal e Itália, onde
o desemprego, embora menor, permanece na casa de dois dígitos, enquanto a
inflação se mantém abaixo de zero. Na verdade, como sabe qualquer um que tenha
se dignado a olhar os números, o maior risco hoje enfrentado na Zona do Euro é
a ameaça de deflação.
Deveria ser óbvio, mas,
como aparentemente não se trata do caso, noto que o problema no Brasil é
diametralmente oposto. A inflação se encontra não apenas (bem) acima da meta,
4,5%, é bom lembrar, como nos últimos meses tem atingido além do limite máximo
de tolerância. É formidável que, mesmo à luz disto, os luminares insistam na
afirmação furada que “a inflação (...) manteve-se dentro (sic) da meta no
governo Dilma Rousseff”.
Não bastasse isto nosso
desequilíbrio externo se encontra na casa de US$ 85 bilhões (3,5% do PIB) nos
12 meses terminados em setembro, indicando que a demanda interna supera nossa
produção, em contraste com superávits nas contas externas observados na
periferia europeia.
É, portanto, notável, embora
nada surpreendente, que a conclusão da quermesse seja sempre a mesma (“vamos aumentar
o gasto público!”) independentemente da natureza do problema.
Diga-se, aliás, que
esta postura diminui em muito a credibilidade da promessa de “iniciativas
contracionistas (...) para quando a economia voltar a crescer”, mas, justiça
seja feita, estas vozes também se calaram quando o país crescia forte e o
governo seguia com o pé no acelerador fiscal. Sua coerência em sempre pedir
mais despesa é legendária.
A verdade é que esta
visão, embora se coloque como “alternativa”, predominou nos últimos quatro
anos. O arranjo de política econômica, caracterizado por gastos crescentes,
redução “na marra” das taxas de juros, intervenção no mercado de câmbio e
ativismo injustificável no domínio econômico, foi, sem tirar nem por,
exatamente aquilo por que clamaram anos a fio os autodenominados
“desenvolvimentistas”.
Os resultados estão aí:
crescimento pífio, inflação acima da meta (não “dentro” dela), desequilíbrios
externos, estagnação da produtividade e, agora sabemos, também retrocesso no campo das conquistas
sociais.
Engana-se, porém, quem acreditar que o fracasso retumbante poderia lhes ensinar
alguma coisa; o manifesto da semana passada é prova disto.
(Publicado 12/Nov/2014)
terça-feira, 18 de novembro de 2014
sexta-feira, 14 de novembro de 2014
quarta-feira, 12 de novembro de 2014
Eu, robô?
Além de histórias em
quadrinhos e mitologia grega, sou fã confesso de ficção científica e, claro, li
muitos dos livros de Isaac Asimov, dentre eles “Eu, Robô”. Uma das histórias
do livro relata um episódio
em que um robô (QT1) desenvolve um culto, ocasionando um conflito
com os humanos, até que estes percebem que as crenças do robô, ainda que
erradas, o permitiam cumprir sua tarefa melhor do que qualquer programação
poderia conseguir.
Esta é minha percepção de
boa parte do governo Lula (do qual participei de 2003 a 2006). Quaisquer que
fossem as crenças do mandatário, a verdade é que, por muito tempo, foi um
governo que fez as coisas certas no plano econômico. O BC desfrutou de enorme
autonomia operacional, as contas fiscais foram aprimoradas e reformas
importantes adotadas, em particular no mercado de crédito.
Mesmo na política
social a administração Lula rendeu-se ao “neoliberalismo” do Bolsa-Família
depois do fracasso do “Fome Zero”, sofrendo, aliás, duras
críticas por parte de economistas historicamente ligados ao PT.
Obviamente muita coisa
descambou desde então, inicialmente de forma algo envergonhada, culminando com
a “nova matriz macroeconômica”, a verdadeira implantação das ideias econômicas
do partido, que redundou em crescimento medíocre (na casa de 1,6% ao ano),
inflação acima da meta (próxima a 6,5%), elevados desequilíbrios externos e uma
forte redução no ritmo de crescimento da produtividade.
Agora, passada a eleição,
a questão é saber se voltaremos à situação do conto, em que, apesar das crenças
equivocadas, uma política econômica apropriada voltará a vigorar, ou se
experimentaremos mais do mesmo.
Posto de outra forma,
queremos saber se teremos um estelionato eleitoral, para escândalo
de André Singer, que recentemente descobriu, ó horror, que políticos
mentem durante a campanha, ou se a aposta será dobrada, produzindo, conforme
argumentei semana passada, os mesmos resultados medíocres observados nos últimos
quatro anos, senão coisa ainda pior.
Muito embora a decisão
inesperada do BC de elevar a taxa de juros – contrária, a propósito, de sua
sinalização nos últimos meses – possa sugerir estelionato eleitoral (perdão, correção
de rumos), há dimensões em que a mudança é muito mais custosa,
sugerindo tratar-se de caminho muito pouco provável.
De fato, nos primeiros
9 meses deste ano o setor público registrou déficit primário equivalente a 0,4%
do PIB segundo os números oficiais. Descontadas “pedaladas”, criatividade contábil
e demais estripulias, o déficit no período deve andar na casa de 1% do PIB,
tornando a promessa de início do ano (superávit de 1,9% do PIB) não mais que
uma distante memória.
O tamanho do ajuste fiscal
requerido para por a casa em ordem é praticamente sem precedentes. Precisaremos
sair de um déficit primário (verdadeiro) ao redor de 1% do PIB para um superávit
de 3,0% do PIB, de
acordo com as contas de Marcos Lisboa. Em dinheiro falamos de algo
na casa de R$ 200 bilhões.
É inviável atingir tal
melhora em apenas um ano. Trata-se, na melhor das hipóteses, de um programa de
ajuste para ser realizado em três anos, contra um pano de fundo de uma
administração que não apenas se mostrou incapaz de atingir suas metas, mas que também
deliberadamente produziu a maior deterioração fiscal de que se tem notícia no
país nos últimos 20 anos.
O governo não terá,
portanto, o benefício da dúvida. Pelo contrário, terá que apertar muito para
convencer o distinto público de sua firmeza de intenções, o que destruiria até as
perspectivas de crescimento pífio de 1% em 2015, hoje consensuais, com reflexos
negativos sobre o desemprego. Desconfio, e estou longe de estar sozinho, que a
presidente não há de apreciar sua única conquista econômica se esfumaçando no
rastro do ajuste fiscal, mesmo necessário.
A conta da campanha
chegou e duvido que o governo esteja disposto a pagá-la.
Run Forest, run... |
(Publicado 05/Nov/2014)
terça-feira, 11 de novembro de 2014
quinta-feira, 6 de novembro de 2014
quarta-feira, 5 de novembro de 2014
A realidade equivocada
Para onde quer que se
olhe fica claro que o desempenho econômico do Brasil nos últimos quatro anos tem
piorado consistentemente, deterioração que dá sinais de ter se agravado a
partir do ano passado.
O crescimento médio do
país de 2011 a 2014, por exemplo, deve ficar ao redor de 1,6% ao ano, mas
cadente, reduzido para quase zero este ano. Já a inflação média superará 6%,
acelerando para 6,5% em 2014, o pior resultado desde 2011.
O déficit externo
provavelmente atingirá o equivalente a 3,0% do PIB no período, e também
crescente, devendo chegar a 3,7% do PIB no final deste ano.
A dívida bruta do
governo, que havia sido reduzida para pouco mais de 50% do PIB em 2010, já se
encontra em 60% do PIB, refletindo o descaso com as contas públicas. O
superávit primário (livre da contabilidade criativa), que ficara em 2% do PIB
entre 2007 e 2010, caiu para menos 1% do PIB ao longo deste mandato
presidencial e deve registrar em 2014 o primeiro resultado negativo desde 1997.
Por fim, mesmo quando
se trata do emprego, cantado em prosa e verso como o grande mérito do atual
governo, a degradação é visível: a criação de vagas formais na economia caiu de
130 mil/mês no mandato anterior para 86 mil/mês no atual. Da mesma forma, a
Pesquisa Mensal do Emprego, que captura também o emprego informal, aponta crescimento
médio da ocupação de 0,8% ao ano entre dezembro de 2010 e setembro de 2014 (e
ao redor de zero este ano) contra mais de 2,5% ao ano nos quatro anos
anteriores.
Fica destes números a
imagem de quatro anos tristes, culminando com um desempenho lamentável em 2014.
Ainda assim não há a menor indicação de que o governo pretenda alterar os rumos
da política econômica. Pelo contrário, a mensagem é que esta sempre esteve
certa; se alguém errou foi a realidade.
Por mais que a
anunciada demissão do atual ministro da Fazenda (contra minha vontade, quero
deixar claro) possa criar esperanças de uma gestão mais racional da economia, a
verdade é que sinaliza muito pouco no sentido de correção de rota.
Mesmo que seja trocado
por alguém com mais compostura, o ministro da Fazenda foi pouco menos que a
rainha da Inglaterra; nunca houve (nem deve haver) dúvida que o comando da
política econômica se encontra nas mãos da presidente, cujo apreço pela
centralização de decisões só é superado por seus persistentes atentados ao
vernáculo.
Não chega a ser
surpreendente, portanto, que o secretário-executivo do ministério da Fazenda já
tenha acenado com mais um pacote de estímulo à
indústria, afirmando ser possível “esperar por uma economia cada dia melhor”. Na mesma toada, a
presidente fala em “ajustes pontuais”, como se o problema fosse localizado e
pudesse ser resolvido por mais uma rodada de microgerenciamento.
O que se espera, pois,
é “mais do mesmo” na forma de tratar a economia. Do lado macro o mesmo descaso
com as contas públicas e a inflação. Mais importante, na perspectiva
microeconômica antecipa-se a persistência de um processo de intervenção
governamental sem paralelos desde o governo Geisel.
À luz disto, a promessa
de uma “economia cada dia melhor” soa improvável. Pelo contrário, se fizermos
as mesmas coisas que fizemos nos últimos quatro anos, há escassas razões para
imaginar que o desempenho econômico possa ser muito distinto do observado neste
período.
É atribuída a Einstein
a definição de insanidade como fazer as coisas do mesmo modo e esperar que os
resultados sejam diferentes. Há sérias dúvidas sobre a autoria da frase, mas
não tanto no que tange à sua aplicação para as perspectivas da economia brasileira.
Sem uma mudança de
rumos que contemple por um lado a recuperação da estabilidade macroeconômica e,
por outro, a busca obsessiva pela produtividade, estaremos condenados à
repetição da mediocridade que caracterizou este mandato presidencial e mais uma
vez a realidade levará a culpa.
(Publicado 29/Out/2014)