Antes de tudo um
alerta: para quem não sabe, fui economista-chefe do Santander entre 2008 e
2011, demitido após discussão pública com o então presidente da Petrobras. Digo
isto porque quero hoje tratar do imbróglio que envolveu o banco na semana
passada quando foi publicada análise relacionando o desempenho da presidente
nas pesquisas eleitorais ao comportamento da bolsa, do dólar e de outros ativos.
A análise nada trouxe
de controverso. Aqui mesmo na Folha, no dia 19 de julho,
lia-se na página B-3: “Bolsa chega ao maior nível em 16 meses”, notando que “as
ações de empresas estatais dispararam na BM&F Bovespa e impulsionaram o
principal índice da Bolsa brasileira nesta sexta-feira (18), após pesquisa
Datafolha ter apresentado empate técnico entre a presidente Dilma Rousseff (PT)
e o senador Aécio Neves (PSDB)”. Acrescentou ainda que “desde que começaram a
ser divulgadas pesquisas apontando perda de espaço da presidente (...), o
mercado de ações nacional, que caía e acentuava queda (...), mudou de
tendência”.
O governo e o partido
podem não concordar com a avaliação do mercado, mas, conforme descrito pelo
jornal, trata-se de um fato: para bem ou para mal, a percepção é que uma
mudança de orientação de política econômica terá efeitos positivos sobre as
empresas brasileiras, em particular as sujeitas a controle acionário
governamental. E é bom notar que o tal mercado pode ter as preferências
ideológicas que quiser, mas, na hora de comprar ou vender uma ação, o que menos
interessa é ideologia; é sempre a perspectiva de lucro que move estes agentes.
Posto de outra forma, ninguém rasga dinheiro em nome de suas convicções
políticas.
O texto do banco,
enviado a correntistas com renda mensal superior a R$ 10 mil, supostamente mais
propensos a operar no mercado financeiro, nada mais fez o que compartilhar
estes fatos, e por um motivo muito claro. Bancos têm um dever fiduciário com
seus clientes: não podem omitir ou distorcer informações relevantes para sua
tomada de decisão.
Em particular, a
opinião das áreas de pesquisa deve refletir exatamente este tipo de
preocupação. Analistas não estão certos o tempo todo, mas é claro que suas
conclusões não devem ser guiadas pelos interesses da instituição financeira.
Não por acaso as regras buscam (nem sempre com sucesso, diga-se) isolar a
pesquisa econômica das posições próprias do banco e mesmo de áreas que
gerenciam as aplicações de clientes (fundos de investimento), precaução devidamente
apelidada de “muralha da China”.
Neste sentido, a
decisão de demitir os analistas que expuseram, mais que uma opinião, um fato
representa uma violação deste procedimento. A alegação que a análise conteria “viés
político ou partidário” não se sustenta face à própria diretriz interna que “estabelece que toda e qualquer
análise econômica enviada aos clientes restrinja-se à discussão de variáveis
que possam afetar a vida financeira dos correntistas”. Não há, como se viu,
a menor dúvida que as perspectivas acerca da eleição presidencial são mais que
relevantes para afetar a vida financeira dos clientes.
A consequência deste
comportamento é óbvia (e aqui falo em termos gerais, não do banco em si). Se a autonomia
da pesquisa é ameaçada, a credibilidade da análise fica comprometida, a
despeito das qualidades do analista. Quem, de agora em diante, pode confiar em
relatórios se não sabemos a que tipo de filtros estes se encontram sujeitos?
O maior perdedor é o
debate econômico, ainda mais numa conjuntura que – em face de desafios nada
triviais no futuro próximo – ninguém se aventura a discutir a sério o que
precisa ser feito para colocar a economia brasileira de volta nos eixos. Se até
o óbvio, amplamente noticiado (ainda bem!) pela imprensa, vira objeto de
censura, pouco falta para que fujamos da controvérsia como quem tem um miúra nos
calcanhares.
Valentes... |
(Publicado 30/Jul/2014)
16 comentários:
Peixe e culhões para Emilio Botín e Jesús Zabalba
"Por sorte, porém, posso dizer o que penso, sem temer patrão subserviente ou governo imperial."
(Paragrafo final de sua coluna hoje, 06/08, na Folha)
A infeliz da analista tinha os dois.........
A maior aflição é que a maioria das pessoas não percebem como isso é um sinal de que as liberdades de expressão nesse país estão cada vez mais restritas. Mesmo em meu meio de convivência, vejo pessoas que aprovam esse ato, possivelmente motivadas pela inveja sutil que sentem pelas pessoas que possuem possibilidade de investir.
Como eu ainda não gosto de café e nem de futebol, cada dia que passa tenho certeza que nasci em país errado...
E você se arrepende de ter discutido com o Gabrielli?
A culpa, em última análise, foi do presidente do banco que foi frouxo. Ele ratificou a censura, pois o episódio poderia ter ficado no campo das queixas usuais do PT. Mas porque será que ele se prontificou a crucificar seus colaboradores? Os bancos servem aos interesses dos clientes ou preferem se macomunar com os políticos?
Bom texto Alex....mas do ponto de vista do pequeno investidor ....eu acrescentaria : JAMAIS, MISTURE INVESTIMENTO PESSOAL COM POLITICA OU IDEOLOGIA, pois isso é um dos caminhos mais faceis para perder dinheiro....sempre lembrando que o mercado não tem ideologia...a ideologia do mercado é ganhar dinheiro...eu pessoalmente do meu ponto de vista de pequeno investidor acho tais opiniões como essa do santander um baita bullshit, que sempre ignoro...caminho facil para se ferrar no mercado.....experiência propria...rsss.. abraço
Sr. Alexandre. Meu nome é João Bosco, tenho 71 anos. Sou aposentado do antigo Banespa e tenho uma página no Facebook a respeito do nosso drama: https://www.facebook.com/groups/aposentadosbanespa/
Trabalhei durante 31 anos no banco,com muito orgulho, onde estive prestando serviço em 13 cidades diferentes. Há 20 anos eu e mais 14.000 ex-banespianos estamos sendo ferrados tanto pelo Santander como pelo Governo Federal. Ao que parece você se afastou de ambos pelo fato de não compactuar com alguns procedimentos e não camuflar a verdade. Já perdemos 3.000 colegas que não viram nossos direitos restabelecidos. Hoje recebemos 80% a menos do que deveríamos receber do banco. Tivemos 6 anos de congelamento feito em parceria banco/pt/governo, que causou enormes perdas ao nosso meio. Além disso tínhamos um seguro de vida da COSESP, o qual pagávamos desde 1972, e agora que estamos velhos, estamos morrendo, a Cosesp cancelou unilateralmente a apolice. Tenho acompanhado suas opiniões isentas e independentes em suas colunas e blogs. Tenho vasto material (outros colegas idem) a respeito de nosso drama. Será que hoje,ao ver as coisas como andam, refletindo com seu espírito cristão, seu desejo por justiça, não usaria parte de seu tempo para nos ouvir, quando talvez pudesse refletir sobre a luta dos "mariscos", que na briga entre o mar e rochedo é o que mais perde? Eu sonho de ter alguém, formador de opinião, de credibilidade, que pudesse se juntar a nós, inclusive se possível escrevendo provavelmente um livro a respeito do assunto. Repito que competência, conhecimento espírito de cidadão e credibilidade não lhe faltam. Hoje somos em torno de 14.000 vítimas dos conchavos financeiros entre financiadores e financiados em campanhas políticas e fomos várias vezes usados como moeda de troca.Somando-se filhos, netos, esposas, maridos, irmãos, amigos e demais familiares chegamos a mais de 100.000 indignados com tanta negociação no alto poder contra nossos legítimos direitos. Houve um simulacro de CPI do Santander, proposta pelo Dep. Marquezelli, um palanque pré-eleitoral para enganar os idiotas banespianos (me incluo entre eles) e, que, após a última eleição foi arquivada pelo então presidente da câmara, Marco Maia. Temos vários processos no STF mas nossas esperanças são cada vez mais escassas pelo que vemos acontecer na nossa justiça maior. Eu procuro ajuda de onde suponho possa haver algum retorno, pois estou entre os desesperançosos do Banespa, e me desculpe se estou incomodando ou batendo em porta errada. Recomendo ainda o site abaixo, com informações a respeito de nossa luta.Agradeço a atenção que venha a merecer a respeito desse assunto, extremamente relevante para milhares de idosos(as) ansiosos por justiça. http://apdobanespa.com/
Sr. Alexandre, sou aposentado do Extinto-BANESPA, estamos vivendo um terrível drama. O Santander está nos esfolando. Digitar no Yahoo: orly e Santander. Veja a Exclusão total dos aposentados.
Adoro ler você. Adoro ver como você equilibra bem números e palavras tão certeiras, esclarecedoras.
Você e o Gianetti me fizeram gostar não só de economia como de economistas.
Luciana Moretzsohn.
Parresiázesthai! \o/
http://lucienefelix.blogspot.com.br/2011/04/parresia-coragem-de-dizer-verdade.html
Saudades, tudo de bom!
bjs,
lu.
Ouvi comentários que estão ameaçando servidores públicos federais contrários ao petê por meio de laudos psiquiátricos.
Não sei como isto ainda não chegou na imprensa, se for verdade, será um escândalo.
Em apoio ao colega Banespiano João Bosco, sugiro digitar no YAHOO: orly e Santander, para ver os vídeos sobre as patifarias do Santander.
O tal texto/vídeo do Empiricus é uma análise de nível de introdução a economia, nada profundo, com cenários levados ao extremo, beirando o juvenil. Os gênios do PT, democráticos como um ditador russo, acabaram por chamar exagerada atenção à análise. O Empiricus agradece.
http://mobile.nytimes.com/blogs/krugman/2014/07/15/on-the-neo-paleo-keynesian-phillips-curve-wonkish/
Sugestão de leitura:
http://agropolitica.wordpress.com/2014/08/11/a-decada-perdida-estudo-da-puc-mostra-que-brasil-avancou-menos-que-outros-emergentes/
País estranho. Tudo dá errado.Não há esperança, só desespero. ´Como é difícil viver assim.
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