Esta semana, a presidente afirmou ser “importante que as empresas privadas
cresçam junto com a produção de óleo e gás no país para evitar que o país sofra
da chamada ‘maldição do petróleo’, quando uma nação é rica em recursos, mas o
povo é pobre”. Ao ler isto quase me empolguei, pois seria sinal que,
finalmente, algo importante mudaria no que diz respeito à exploração de
petróleo, mas, ao ler a matéria, vi que os problemas continuam rigorosamente no
mesmo lugar.
A “maldição de recursos
naturais”, da qual o petróleo é um caso particular, tipicamente ocorre quando
um recurso valioso em determinado país tem sua exploração controlada, em geral,
pelo governo, de modo que a renda gerada por aquela atividade se torna objeto
de disputa política. A exploração mineral (petróleo, “diamantes de sangue”,
etc) costuma se prestar bem a este tipo de arranjo, pois as jazidas são
geograficamente concentradas, facilitando ao poder público exercer seu
monopólio.
Em contraste, a exploração
de recursos agropecuários, por exemplo, não oferece caracteristicamente as
mesmas oportunidades monopolistas, tratando-se de atividade dispersa,
dificultando o controle governamental.
Em países com instituições
políticas ruins (“extrativistas”, para usar o termo de
Daron Acemoglu e James Robinson), o controle governamental abre espaço para que
determinados grupos se aproximem do centro político com o objetivo de extrair
as rendas associadas à exploração daquele recurso. Casos mais extremos podem,
inclusive, redundar em conflito (armado até) de diferentes grupos pelo poder,
precisamente pelo acesso que este oferece às fontes de renda.
Mesmo sem conflitos
abertos, este arranjo acaba implicando baixo crescimento, pois será sempre mais
interessante investir na proximidade com o setor público, em busca dos seus
favores, do que na inovação e competição, as molas mestras da expansão
capitalista. Isto está documentado cuidadosamente no livro “Why
Nations Fail” dos autores acima, que recomendo a todos
interessados no assunto.
Assim, ao ler que a
presidente via as empresas privadas como uma forma de lidar com a “maldição”,
sofri um lapso de empolgação. Quem sabe alguém no governo teria afinal
compreendido que nosso modelo de exploração de petróleo, que coloca o governo
no centro do processo, apresenta chances consideráveis de exacerbar as
tentativas de extração de renda, minando ainda mais nosso parco crescimento?
Mas, não. O papel das
empresas privadas a que a presidente se referia não é análogo ao adotado nos
EUA (com imenso sucesso, diga-se) para a exploração do gás de xisto,
responsável pelo aumento de 30% da produção americana nos últimos seis anos. A
produção de petróleo seguirá devidamente monopolizada pelo setor público,
concedida a quem se dispuser a se associar aos diferentes braços do governo.
Às empresas privadas
nacionais caberá o papel de fornecimento dos equipamentos, com reserva de
mercado. A pretexto, portanto, de evitar a “maldição do petróleo”, o que se
oferece ao setor privado é a oportunidade de partilhar as rendas da exploração
deste recurso através da redução da competição externa, permitindo preços mais
elevados, precisamente o fenômeno descrito por Acemoglu e Robinson.
Não é por outro motivo que
nosso desempenho nacional tem sido medíocre nos últimos anos, quando se
esgotaram a abundante mão-de-obra e o efeito positivo do aumento dos preços
internacionais de commodities. Uma
vez vencida a etapa do crescimento “fácil”, pela incoporação dos desempregados,
a expansão econômica agora exige que a produtividade tome as rédeas do
processo.
No entanto, o governo
ainda acredita na distribuição de favores – em oposição aos incentivos à
produtividade – como estratégia para crescimento. Os bafejados pelos favores
governamentais ficarão ricos, mas não será isto que nos tirará da pobreza.
(Publicado 18/Set/2013)
34 comentários:
Belo texto!
Triste País!
X da questao: para completar pode ser que alguma dessas empresas amigas do governo façam um belo marketing do "business plan" (e do governo é claro) abra o capital na bolsa e no final quem paga é o minoritario.
somente uma hipotese
Prezado Alexandre, sou um dos 19 leitores do seu blog (qdo. comecei a lê-lo, já havia 18) e o reputo como um dos poucos (são cada vez menos!) espaços de lucidez na esfera pública brasileira. Há anos, venho trabalhando com a noção de democracia de commodities, como noção explicativa de nosso sistema político e econômico. Essa noção é uma adaptação da noção de ditadura do petróleo. Uma democracia de commodities é, na verdade, uma semidemocracia. Seu jogo básico é a utilização, pelo governo, das rendas do setor de commodities para a compra de apoio político dos mais diferentes grupos de rent-seekers. Obviamente, o acesso a essas rendas é indireto, diferentemente do que ocorre com as rendas auferidas pelas ditaduras do petróleo. Entretanto, mesmo sendo indireto, ele é real. Esse é o jogo, e quem não o joga é apinhado do poder (cf. tucanos, que resistiram parcialmente ao populismo que esse jogo implica e agora são vistos como inimigos do povo, leia-se rent-seekers). um abraço, Manoel.
perdão pelo erro grosseiro: eu disse "apinhado do poder", quando deveria ter dito "apeado do poder". um abraço. Manoel.
pois eu também fiquei muito empolgado quando li, em algum jornaleco, que o pré-sal iria gerar 900 BILHÕES em 30 anos.
fiquei mais ainda empolgado quando lembrei que o governo arrecada 1 TRILHÃO em aproximadamente 8 meses
Boa Mauricio!
Alguém acredita em conta do governo ou Petrobras?
Pode até render 900 bilhões em 30 anos, mas a que nível de investimento? E não estou falando nem em fluxo de caixa e valor presente.
Algum de vocês saberia me dizer quanto custará a extração do pré-sal?
E se a extração do Shally gás é uma revolução energética, os EUA reduzirão a demanda por petróleo e isto vai levar a quedas reais no preço do barril (e parece que o gás lá produzido não pode ser exportado).
O FED manteve as impressões e ainda assim o dólar tende a fortalecer (pode ter um solavanco no curto prazo, mas a longo prazo sobe) e dólar forte correlaciona inversamente com o preço das commodities.
E a dilma preocupada com os dados do pré-sal na NSA. Será que é devido a eles terem feito as contas certas do custo de exploração e extração?
Alex, desculpe a ignorância, não sei se o assunto esta correlacionado. Uma abundância de recursos do pré-sal pode ter como consequência a desindustrialização? A tal doença holandesa faz algum sentido? Você poderia fazer um breve comentário sobre o assunto?
abs
SPIN
http://maovisivel.blogspot.com.br/2010/05/doenca-holandesa-x-evidencia-holandesa.html
http://maovisivel.blogspot.com.br/2009/08/uma-tese-com-substancias.html
É muita saúva e pouca saúde para um país só! Me supreende termos chegado tão longe, tão acima da nossa mediocridade. O governo central é um imenso redemoinho: puxa tudo para o centro e depois afunda.
Por que todo mundo baba o ovo desse Why Nations Fail?
Trata-se de uma publicação para leigos, bem chinfrim...
"O",
discorra sobre esse post:
http://johnrlott.blogspot.com.br/2013/09/stunning-96-percent-of-net-jobs-added.html
grato
já que você citou Why nations fail, não consegui entender como os autores consideraram a ascensão de Lula e do PT como a linha mestra do surgimento de instituições políticas e econômicas inclusivas no Brasil. Ao ler o livro, percebe-se que o caso brasileiro está muito mais próximo dos casos argentino, colombiano e chinês do que aquele vizualizado pelos autores.
Também não Gustavo (acredito que eles vejam a transição política como exemplo de democracia e, portanto, de instituições políticas inclusivas, o que me parece um exagero).
O livro é melhor quando fala do passado do que especulando acerca de eventos recentes e seus desdobramentos.
Acho que é bem fácil de explicar: tanto o Acemoglu quanto o Robinson são ignorantes de pai e mãe sobre o Brasil. O Robinson é um caso curioso porque ele em tese deveria saber mais sobre a America Latina porque ele é casado com uma colombiana. Mas a mulher dele é antipática ao grupo que chegou ao poder na Colômbia com Uribe e então eles só focam no negativo. Como toda a informação que eles sabem sobre o Brasil vem de um único livro (da Margaret Keck) que é bem equivocado sobre o papel do PT, eles acabam falando non-sense como prever que o Brasil vai crescer mais no longo prazo que a Colômbia. O corolário lógico é que devemos tomar bastante cuidado com esse livro - o que garante que este é o único erro crasso na obra?
Também tive a mesma reação..se a parte sobre o Brasil é tão absurda, o que me garante que o resto não é tão absurdo quanto? Alias, cutenomics demais para mim
Como uma vez comentei com o "O". Why Nations Fail seria um livro melhor se não tivesse falado nada sobre Brasil. O Livro e' ótimo ate a pagina 100, depois tenho duvidas...
As pessoas babam o ovo desse livro por convenção.
Tem muitas falhas e as pessoas compram a idéia por ignorância.
É humanamente impossível os autores entenderem tanto de tantos países ao mesmo tempo. Não há capacidade cognitiva para tal.
Falam merda como consequencia. Tenho colegas que fazem PhD em outros lugares do mundo e falam argumentos semelhantes ao que usamos para o Brasil (eles exageram para o caso do nosso país).
Enfim, os autores tem uma hipótese muito interessante (reconheço), mas os exemplos utilizados e as relações de causa efeito não estão provadas por este livro.
Vlw
Modelo do xisto Brasil? Não entendo de economia, mas ...
Um dos motivos do sucesso da exploração do xisto deve-se a que nos EUA o subsolo também pertence ao proprietário da terra, o que viabilizou a abertura de 20.000 poços (fonte Estadão).
Para se ter um modelo análogo no Brasil, o governo teria de mudar a Constituição, doar a riqueza do subsolo aos atuais proprietários e a mão invisível, que há séculos distribui a renda da terra, também distribuiria a renda do subsolo. Entendo a empolgação.
A ideia é boa, mas tem um probleminha. Os neoliberais não estabeleceram a naturalidade histórica da propriedade privada no Oceano Atlântico (ainda!) e, portanto, esse modelo não poderia ser aplicado ao pré-sal.
Ainda bem!
O Poeta
PS: sei, sei, o senhor está falando em termos gerais da concessão/partilha e eu deveria me dedicar à poesia (rsrsrs)
Alex, o problema todo, e a visibilidade que as más decisões do governo tem diante da midia, todos os dias ne televisão, radio, jornal e internet escutamos que o governo esta gastando mal os recursos públicos e cá pra nós, quem gasta mais que tem fica endividado.
E mesmo essa visibilidade o povo, a massa pensante tbm vota como se escole um time de futebol
Um dia em uma reunião societária com acionistas (empresa familiar), um consultor externo, respondeu a uma pergunta de um filho de acionista: o que ele achava de familiares serem aproveitados na organização. Ele disse que sim desde que passassem por processo de seleção independente e externa. Disse que se uma pessoa com mais de 30 anos não conseguiu acumular experiência não poderia ser aproveitada pois iria causar problemas administrativos e societários.
Passando para o Brasil atual: o PT não tem quadros (pensantes ou com experiência) para governar. É o motivo do desgoverno. Pior ainda: a presidANTA acha que entende de economia e não entende nada (o Lula tinha a virtude de ouvir e decidir). A presidANTA, não entende nada, dizem que é mal educada, não ouve e impõe linha de pensamento e ação. Como deu tudo errado está mudando um pouco. Mas ela e o time são muito fracos.
Como disse o consultor: como esperar uma parede correta de quem nunca construiu paredes (só na sorte = jogo de azar).
Mage,
Essa turma é muito ruim. Eu preciso me beliscar para ter certeza que não estou em um pesadelo quando penso que em um país como o Brasil, de 200 milhões de habitantes, a política econômica pode estar nas mãos de nulidades como Guido Mantega, Nelson Barbosa, Marcio Holland, Luciano Coutinho.
"O"
Uma pena colocarem o Nelson Barbosa no mesmo saco...
Ele eh claramente superior aos demais. O que acha Alex?
“Uma pena colocarem o Nelson Barbosa no mesmo saco...”
Por quê? Só porque Nelson Barbosa é menos destemperado que Guido Mantega não quer dizer que ele seja competente. Ele é na realidade muito fraquinho tanto como acadêmico quanto como policymaker. Entre outras barbaridades, é dele a interpretação que um aumento no preço de nossas exportações é um choque (negativo) de oferta.
Estamos pagando agora por esse erro com alta inflação em serviços, perda de competitividade da indústria, congelamento de preços administrados, Petrobrás com problemas de caixa apesar de ter feito a maior emissão de bônus corporativo da história da humanidade etc.
"...é dele a interpretação que um aumento no preço de nossas exportações é um choque (negativo) de oferta."
Como?
"O", como o cara conseguiu essa proeza?
Um debate entre James Galbraith e Matias Vernengo.. o que cazzo o Clarida ta fazendo moderando esse freakshow?
http://www.modernmoneynetwork.org/seminar-2-central-banking-theory--practice.html?utm_source=buffer&utm_campaign=Buffer&utm_content=buffer7d36c&utm_medium=twitter
“"O", como o cara conseguiu essa proeza?”
Que pergunta você me faz? Estamos falando do Brasil. Nossa presidente acha que quando o FED afrouxa a política monetária é protecionismo, e quando aperta ou ameaça apertar, é protecionismo também. Não existe nenhuma restrição que impede idiotas de chegar a posições de decisão.
Dona Bronca queria baixar os juros. Se NB fosse honesto intelectualmente E bom economista, ele explicaria à dona Bronca que a alta nos preços de commodities são um choque de demanda positivo que requer aperto na demanda. Aparentemente uma das condições acima não vale para o sujeito e acabamos com estímulo à demanda (via BNDES) e política monetária frouxa, com a consequência de livro-texto de inflação acima da meta, perda de competitividade da indústria e uma dilma monumental nos preços relativos.
Prezado "O",
"alta nos preços de commodities são um choque de demanda positivo que requer aperto na demanda".
Por qual razao um choque de demanda qualquer deveria ser combatido? Nao deveria este ser o caso apenas quando a economia supera o pleno emprego?
Afinal, quando a economia esta abaixo do pleno emprego, e provavelmente a economia estava naquela epoca, um choque de demanda positivo deveria ser visto: (i) como um mal necessario para levar a economia back to full employment; (ii) como um mal indolor no longo prazo, pois o ajuste da oferta de curto prazo traria o nivel de precos para baixo e para o pleno emprego novamente no longo prazo...
Serio, quem eh Irineu de Carvalho Filho perto de Nelson Barbosa para poder falar dessa forma tao arrogante?
Se ele eh tao bom, pq fica estacionado no FMI sem nada de relevante para fazer (soh sabe ficar chiando)...
Melhor você comentando aqui como anônimo do que plagiando aluno ou abusando de menor de idade em banheiro de shopping!
O Matias é divertido. Ele é uma combinação única de inteligência com estupidez radical. Isso o faz bem mais interessante do que outros membros da quermesse que são simplesmente medíocres e enfadonhos.
Acho que está bem claro que não havia folga. O estimulo de Nersão causou inflação dos bens não transacionáveis (serviços, por exemplo), com a consequente perda de competitividade dos setores transacionáveis (industria, por exemplo). Para fazer a inflação fora do controle caber na banda superior da meta, os pimpões tiveram que congelar os preços administrados, com danos consideráveis à Petrobras, entre outras companhias. Mais: o teste do pudim também está no crescimento. Não é por acaso que crescemos menos que o eixo do bem (Chile, Colômbia, Peru) em particular e a maioria dos outros países emergentes em geral. A situação é tão ruim que é possível que cresçamos menos que o Japão esse ano. Mas voltando ao Nersão, completamente bobo ele não é, pois saiu na hora certa.
Se naquela epoca nao havia folga, entao agora estamos bem acima do pleno emprego...
Ou voce realmente acha que as preferencias dos trabalhadores mudaram e, consequetemente, tambem a taxa natural de desemprego?
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