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segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Sua Excelência

Houve certa controvérsia na caixa de comentários do post anterior acerca da balança comercial sul-coreana. O Rogério mandou o link para os dados e eu os baixei, atualizei para preços de hoje pelo PPI EUA (isto não muda o sinal da balança, é claro, mas ajuda a percepção da ordem de grandeza, que ficaria prejudicada se usássemos os dados correntes).

Os resultados estão resumidos no gráfico abaixo: em 24 dos últimos 39 anos a Coreia apresentou déficits comerciais. Até a crise de 1997 acumulou um déficit (a preços de 2009) equivalente a US$ 138 bilhões; de 1998 até 2009 mais do que compensou isto com um superávit de US$ 259 bilhões.


Em tempo: no mesmos períodos o Brasil acumulou superávits de US$ 159 bilhões (1971 a 1997) e US$ 268 bilhões (1998 a 2009), tendo registrado déficits em apenas 14 dos últimos 39 anos. Obviamente não é possível generalizar a partir destas duas observações, mas já podemos começar a refletir, não?

11 comentários:

O brasileiro ainda tem uma mente tão mercantilista que alguns alunos de doutorado iniciam frases com:

"O problema do déficit comercial...". Independentemente das circunstâncias.

E por mais que a gente ensine que se déficit fosse intrinsicamente um problema então não existiria financiamento, ainda tem uns que não aprendem. Bom, esses, pelo menos comigo, reprovam.

Alexandre,

Com toda mídia em cima do debate sobre o BNDES, ficaria contento em ver um último artigo seu (com a acidez peculiar) colocando um ponto final no assunto...

Esta semana já tenho o artigo pronto sobre outro assunto, mas poderia voltar em outra semana, dependendo da evolução (?) do debate.

Tem um pessoal justificando a farra do BNDES argumentando que os States também fizeram com as empresas de lá. Rematada mentira ou ignorância. Lá o que houve foi que o governo concedeu empréstimos ao setor privado tendo ações como colateral. À medida que os empréstimos foram pagos teve baixa no colateral. Muito diferente do nosso BNDES. Ou tô enganado?

E como sempre aparece alguém para dizer "tudo bem, eu aceito que eles tiveram déficit comercial, mas não podemos negar que eles fizeram uma agressiva política industrial", não custa nada lembrar de um artigo que já foi também citado neste blog:

http://www.fgv.br/professor/ferreira/PI2007.pdf

Os professores Bresser e Gala escreveram, em 2007, um artigo intitulado "Por que a poupança externa não promove crescimento" sobre como a taxa de câmbio afeta a substituição de poupança interna pela poupança externa.

Em qualquer modelo você tem variáveis endógenas e exógenas. E a depender do rearranjo do mesmo modelo, uma variável exógena pode ser tornar endógena, como no caso da oferta de moeda nos modelos de câmbio fixo e câmbio variável.

Mas no modelo deles, a taxa de câmbio não é nem uma variável endógena e nem exógena. É uma variável extraterrestre, pois você não sabe de onde ela vem nem como é determinada. A taxa de câmbio é determinada pela "estratégia de crescer com poupança externa". Ela determina e é determinada pelo déficit em conta corrente, sendo causa e efeito dela mesma.

Mas por que você não sabe de onde vem a taxa de câmbio? Pois ela é fruto de uma estratégia de crescer com poupança externa. E quem definiu esta estratégia? Não sabemos! Seriam os trabalhadores e os empresários?

O conflito distributivo, que já foi usado para explicar a inflação no Brasil, seria agora a explicação do câmbio apreciado?

Esta estratégia surge você não sabe de onde no modelo deles. A dificuldade em explicar a origem da estratégia de crescer com poupança externa ou da determinação da taxa de câmbio surge por um detalhe que falta no modelo deles: o Governo.

O modelo deles não tem governo, então como saber o efeito da expansão dos gastos públicos sobre o câmbio, a poupança interna, o consumo, os juros e a inflação? Eu elimino o governo e aí fica fácil dizer que o câmbio está dado.

Uma pergunta: se não sabemos quem definiu o câmbio como sobrevalorizado, quem irá desvalorizar? No modelo, quem fará isto? O modelo depende exclusivamente de uma variável definida totalmente fora dele. E se ele não dá pistas da determinação do câmbio, para quê ele serve então? Com modelo ou sem modelo, a conclusão já está dada.

E a parte empírica do trabalho também é genial. Como provar que o câmbio apreciado causa substituição de poupança interna por externa, a elevação do consumo e redução do investimento?

Eles citam vários trabalhos empíricos que estimam a substituição de poupança interna por poupança externa em vários países. E ficam surpresos por estes trabalhos não levarem em conta a taxa de câmbio na determinação desta substituição, mas vejam o que os dois professores concluem destes diversos trabalhos:


"Apesar de não utilizar diretamente a taxa de câmbio nas medições econométricas, esses trabalhos fornecem evidências empíricas favoráveis, mesmo que de forma indireta, para os argumentos teóricos apresentados neste trabalho. Assumindo-se que situações de déficits em contas correntes são acompanhadas por algum grau de apreciação cambial, podemos concluir que os trabalhos empíricos apresentados acima se alinham com o argumento de que, em geral, a utilização de poupança externa está aliada à redução de poupança interna e do aumento do nível agregado de consumo. Apesar de não utilizar diretamente a taxa de câmbio nas medições econométricas, esses trabalhos fornecem evidências empíricas favoráveis, mesmo que de forma indireta, para os argumentos teóricos apresentados neste trabalho. "

Perceberam o que foi feito? Eles pegaram vários trabalhos, em que seus autores não consideraram os efeitos do câmbio sobre a substituição da poupança interna pela externa, para confirmar a tese deles. Pois segundo eles, déficit em conta corrente está sempre associado a câmbio valorizado. Aí fica fácil, pois qualquer artigo que apenas cite poupança externa confirma a tese deles.

Não importa se os autores destes trabalhos não encontraram evidência significativa do efeito da taxa de câmbio e por isto não utilizaram a variável. O que importa é que se falou de poupança externa, está falando de déficit em conta corrente, e déficit em conta corrente está sempre associado a câmbio apreciado. Então a tese está confirmada!

VC falou que iria se divertir lendo os paper do AKB, vc encontrou alguma perola sobre Cambio, crescimento export led growth, crescimento com restrição ao balanço de pagamentos para alegrar o nosso dia e zoar dos nossos amigos heterodoxos?

abraço

tiago

Alex, por que não colocar no gráfico os saldos comerciais em proporção ao PIB? Como a Coréia cresceu tanto, o gráfico menospreza o tamanho gigantesco dos déficits comerciais coreanos nos anos em que sua economia decolou.

A entrevista do Steinbruch hoje no Valor está um primor, com direito até a sugestão de limitar temporariamente as importações para estimular a indústria local e evitar a concorrência predatória dos chineses. É claro que é um discurso institucional da Fiesp, mas tem muita gente ao redor da Dilma repetindo coisas do gênero.
Fernando A.

Nos próximos anos vamos reviver a segunda metade do regime militar...

Eu fiz aqui o gráfico usando os dados do Banco Mundial para a Coreia do Sul (não sei se é correto), e é impressionante que o período que eles mais crescem, o déficit comercial é, em média, maior que 5% do PIB.

O gráfico do déficit comercial é a imagem espelhada do gráfico das taxas de crescimento anual. O período de maior crescimento corresponde ao período de maior déficit.

E repetindo o mesmo procedimento para a Austrália, usando dados desde 1965, ela tem tido um crescimento regular e déficit comercial na maioria dos anos.