Nossas estimativas sugerem que o
desemprego se encontra de 2 a 2,5 pontos percentuais acima da taxa “natural” e
que serão necessários cerca de 3 anos com crescimento próximo a 2,5% ao ano
para atingi-la. Assim, a inflação dificilmente será um problema neste
horizonte.
A
visão mais difundida sobre os determinantes da inflação liga a evolução dos
preços ao montante de “folga” na economia. Quando o desemprego está muito
elevado e há considerável capacidade ociosa, a aptidão de trabalhadores
elevarem seus salários e empresas repassarem estes aumentos ao preço de seus
produtos se reduz, levando à inflação baixa; no caso oposto, com o mercado de
trabalho apertado e a utilização de capacidade no limite, as pressões
inflacionárias se acentuam.
A
ideia, portanto, é que há uma relação inversa entre a “folga” – conhecida no
jargão como “hiato de produto” – e a inflação. Isto não esgota o conjunto dos
fatores determinantes da inflação, que inclui expectativas de inflação futura (ao
balizar reajustes de salários e preços), a inflação passada (devido à
existência de mecanismos de reajustes automáticos), os impactos do dólar e, por
fim, o que Nelson Rodrigues, em diferente contexto, apelidou de “Sobrenatural
de Almeida”, isto é, eventos de difícil previsão, como movimentos dos
preços do petróleo, produtos agropecuários, etc.
Este
entendimento possibilitou aos bancos centrais desenvolverem regimes monetários
que conseguiram lidar com relativo sucesso contra a inflação, apesar da presença
permanente de Sobrenatural de Almeida na escalação. É possível mostrar
na teoria e, mais importante, comprovar na prática que bancos centrais que
praticam regras relativamente simples de política monetária, aumentando taxas reais
de juros quando a inflação esperada se eleva além da meta e as reduzindo em
caso contrário, conseguem manter a inflação em média próxima à
meta.
Em
consequência, a melhor expectativa para a inflação futura passa a ser a própria
meta, desenvolvimento que fortalece o regime monetário. Não é por acaso que a
pesquisa Focus aponta para a inflação em 2021 e 2022 precisamente
no centro da meta, em contraste considerável com o observado sob Alexandre
Pombini, cujo histórico impecável manteve a inflação a uma distância segura da
meta durante toda sua gestão.
O
bom funcionamento do regime brevemente descrito requer estimativas do montante
de “folga”. Quando afirmamos que o “desemprego está elevado”, ou que a
“capacidade ociosa é considerável”, devemos sempre ter uma noção do marco a que
se referem, isto é, o desemprego está (ou não) elevado na comparação com o quê?
Nossa
estimativa da “folga” parte do mercado de trabalho, em particular da noção que
o desemprego permanece estável quando a economia cresce a seu ritmo dito
“potencial”. Isto nos estimar a capacidade de crescimento de longo prazo da economia,
notando que, em situações de desemprego “elevado”, a economia pode crescer,
temporariamente, além de seu potencial.
Uma
vez conhecida esta grandeza conseguimos então estimar a tendência do nível do
produto de “pleno-emprego” e , portanto, a taxa de desemprego a ele associada
(taxa “natural” de desemprego, ou NAIRU), que no caso do Brasil parece se
encontrar ao redor de 9-9,5%, isto é, de 2 a 2,5 pontos percentuais abaixo do
desemprego médio observado em 2019 (12%). À luz disto, precisamos saber agora
por quanto tempo esta folga deverá permanecer, considerando expansão algo mais
vigorosa daqui para frente.
É
bem verdade que o comportamento recente da economia aponta para uma capacidade
muito baixa de crescimento “potencial”. Mesmo com aumento do PIB na casa de 1%
ao ano o desemprego tem caído a um ritmo média ao redor de 0,4 ponto percentual
a cada 12 meses, praticamente invisível a olho nu, sugerindo que nosso
potencial possa ser ainda menor que o observado nos últimos 3 anos.
Mesmo
levando este fato em consideração e com o crescimento acelerando para 2-2,5% ao
ano, o desemprego provavelmente não cairia para perto do seu nível “natural”
até 2022 ou 2023, isto é, a “folga” permaneceria ainda por um longo período.
Não é por outro motivo que o consenso de mercado ainda aponta para inflação bem
abaixo da meta em 2020: 3,6% contra 4,0%.
Sob
tais condições, apenas Sobrenatural de Almeida parece capaz de produzir
qualquer ameaça inflacionária mais séria no país.
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