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terça-feira, 6 de setembro de 2016

Excesso de desonestidade intelectual

A mitologia do “golpe” se ampara na ideia que as “pedaladas” se justificariam para manter o crescimento e o emprego. Reconhece, portanto, a ilegalidade da ação (a vilipendiada Lei de Responsabilidade Fiscal proíbe operações de crédito entre o governo e seus bancos), mas argumenta se tratar de política com fins nobres: impedir a recessão e garantir que a população permanecesse ocupada.

Há vários problemas com o argumento. A começar pela contumaz noção que fins justificam os meios, possibilitando a destruição do aparato institucional em nome de presumidos ganhos imediatos. Mesmo que estes se materializem – o que está longe de ser verdade – não raro as consequências para a capacidade de expansão de longo prazo são desastrosas, em linha com nossa experiência recente.

Diga-se, aliás, que o objetivo, vendido como nobre, era bem mais mundano, a saber, ganhar uma eleição, nem que à custa de se “fazer o diabo”, postura tornada explícita ao longo do processo.

Isto dito, há sérias dúvidas acerca da adequação desta política. Em primeiro lugar porque, conforme discutido mais vezes do que seria saudável neste espaço, em 2013 e 2014, quando se usou e abusou deste expediente, estava mais do que claro que o problema da economia brasileira não era a falta de demanda originária da crise internacional (já então o mundo crescia bem mais do que nós), mas sim os sérios gargalos do lado da oferta, incluindo o mercado de trabalho.

Naquele contexto aumentar gastos iria simplesmente agravar nosso desequilíbrio externo (e o agravou, trazendo o déficit em conta corrente de US$ 75 bilhões para US$ 105 bilhões) e elevar ainda mais a inflação, apesar dos controles de preços, o que também ocorreu.

Junte-se a ambos estes desequilíbrios o forte aumento da dívida pública no período e fica claro que a política econômica da época, além de ineficaz para elevar o crescimento, era também nitidamente insustentável para qualquer economista que não fosse signatário do manifesto de apoio à presidente às vésperas da eleição.

Não faz tampouco sentido o raciocínio (se cabe aqui a expressão) que atribui ao excesso de responsabilidade fiscal a queda da presidente.

Em primeiro lugar porque, sendo a política anterior insustentável, não havia alternativa que não passasse pela correção dos desequilíbrios fiscais. Ao contrário, a crise que resultaria da manutenção da Nova Matriz, hoje uma pobre órfã, faria a atual parecer não mais que mera desaceleração econômica.

Mais importante, porém, a modestíssima contração fiscal que se materializou em 2015 dificilmente justificaria a queda observada do PIB. Ajustado ao padrão sazonal o produto encolheu cerca de 6% entre o quarto trimestre de 2014 e o primeiro de 2016 (quase R$ 100 bilhões a preços do primeiro trimestre deste ano). Já o consumo do governo no mesmo período caiu menos do que 2%, ou R$ 5,5 bilhões no mesmo período. Conforme notado por Samuel Pessoa, não há valores plausíveis para o multiplicador fiscal que justifiquem tamanho colapso econômico.


Trata-se, na verdade, de mais um episódio da notória desonestidade intelectual dos keynesianos de quermesse a serviço de um projeto político. Se há algo de bom no atual governo é a certeza que eles estão longe da condução da política econômica.


Yes!

(Publicado 31/Ago/2016)

18 comentários:

Mentiras com diversas razões. Primeiro, ganhar a eleição para que outros aventureiros não descobrissem as falcatruas cometidas pelo PT e seus associados. Infelizmente surgiu o Juiz Sérgio Moro e um tal de Eduardo Cunha que foi uma pedra na sapatilha da Dimanta.

Mas a segunda razão, pouco discutido, é que quanto mais se gastasse (em obras sem necessidade como Abreu Lima, ou que nunca acabam como a transposição do Velho Chico, ou obras internacionais sem fiscalização) mais dinheiro iria para o Partido, as campanhas políticas e os PTistas e seus associados. O negócio era aumentar os custos para faturar mais!

As mentiras estão vindo a tona, estamos falando de centenas de bilhões roubados do povo!!! Cada bilhão são 250 km de rodovias duplicadas, são 10.000 casas populares, moradia para 40.000 pessoas, remédios, escolas, estações de tratamento de esgoto...) E os fdp ainda se fazem de vítimas.

Alexandre, continue sua boa luta, continue sendo esse economista de mão cheia, desmascarando e desmistificando esses salafrários!

Alexandre, o André Perfeito esta batendo recordes e recordes de forecasting!

Abraço,

Diogo.

Alex, mas os sócios políticos dessa desventura não são hoje os mesmos, só que majoritários? Não será temerária a crença de que a equipe econômica terá a autonomia necessária? Não será o imbróglio muito mais crítico do ponto de vista político do que do ponto de vista partidário? Estarão os políticos dispostos a medidas impopulares, sacrifícios hoje, benefícios amanhã? A nossa tradição de ser "cigarra" não se imporá sobre a urgência de ser "formiga"? A "pecha" de golpistas não poderá se intensificar à medida que vierem os "apertos" ou, abrindo-se mão deles, tudo continuar na mesma? A noção de crise não estaria baseada na situação que se viveu nos tempos do dólar R$ 1,60? No país do Carnaval, não sei o que dará uma longa Quarta-feria de Cinzas...
Grande abraço

hahahaha

André Perfeito, o Keynesiano Romântico...

Diogo.

Alexandre,

Voce poderia me dar alguma sugestão de artigos que buscam explicar a não ocorrência de um aumento inflacionário quando temos niveis de juros próximos a zero como ocorre no mundo desenvolvido?

Esse argumento é usado pelos heterodoxos (ou keynesianos de quermesse, rsrs) para justificar que "taxa de juros é uma decisão política". Aí eles citam a capacidade ociosa e tals...para justificar uma reducao hoje na selic.

Há algum artigo/autor de linha ortodoxa que justifica por que não há esse repasse para a inflação??

Muito Obrigada

Laura

Alex,

O que acha http://www.senado.leg.br/noticias/TV/Embed.asp?y=Cs0yGcs9rm0 especificamente no momento : 1:33:35: "Não faz sentido falar em títulos públicos financiando os gastos do governo"

Laura

Alex, uma queda do gasto numa economia em recessao nao seria algo danoso para as contas publicas, dado que desabaria tambem a arrecadacao? Nao conheco literatura sobre esses efeitos, mas me parece algo possivel, nao? O que voce pensa sobre isso?
Abs, Paulo

Lembrando que Pochmann que formatou o Bolsa Familia.

"Lembrando que Pochmann que formatou o Bolsa Familia"

Pena que saiu em formato de Sapato Família.

"
Alex, uma queda do gasto numa economia em recessao nao seria algo danoso para as contas publicas, dado que desabaria tambem a arrecadacao? Nao conheco literatura sobre esses efeitos, mas me parece algo possivel, nao? O que voce pensa sobre isso?"

Só se a propensão marginal a consumir fosse maior que 1...

Alex:

Tenho a mesma dúvida do que a Laura, "supra". Debatendo com colegas de esquerda, esses me perguntaram como eu explicaria o fato de a Alemanha, Suíça, Japão, dentre outros, terem juros reais negativos e não terem uma disparada da inflação, bem como terem grandes dívidas públicas, em especial o Japão.
Argumentam assim que, como defendem os heterodoxos, a escolha do nível de juros é uma decisão, antes de tudo, política.

Há algum artigo que explica a questão, se possível sem usar teorias ou cálculos que exijam conhecimentos econômico específico?

Grato, Mauro.

Além de formatar o Bolsa Família, se eu me lembro bem o Pochman foi responsável pela criação de um escritório do IPEA em Caracas (acho que Cuba também).

http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&id=2869:o-ipea-responde-a-sociedade&Itemid=2

O que seria do Brasil se o IPEA não tivesse aberto o escritório em Caracas?

Alex, nao sei qual modelo vc tem em mente, mas nao precisa de propensao marginal a consumir maior que um necessariamente. Ela pode ser bem menor que isso para que o multiplicador seja mais alto no caso de uma economia tão fechada quanto a brasileira e com carga tributaria nao tao elevada (obvio que alta para nosso padrao de renda, mas bem abaixo do que se observa em muitas outras economias). Acho que vc errou nessa, nao?

Alexandre, supunhetamos que o BC precisasse desinflacionar a economia brasileira pos 2015 num cenario sem crise fiscal e politica, que foram eventos contracionistas. Certamente ele teria de elevar muito a taxa de juros para produzir a recessao que estamos vivendo agora. Ainda assim, nossa desinflacao caminha a passos de cagado. Algum economista consideraria essa possibilidade? Me parece que nossa curva de philips ficou bem flat, e que precisamos de uma baita recessao para reduzir um pouco a inflacao. Poderia escrever sobre isso?

"Acho que vc errou nessa, nao?"

Vamos lá:

Comecemos com a igualdade entre oferta e demanda agregadas:

y = c + i +g

Consumo é suposto função crescente da renda disponível:

c = c(y-t), c'>0

Tributação também é suposta função crescente da renda:

t = t(y), t'>0

Logo:

c = c(y-t(y))

Ou seja


y = c(y-t(y)) + i +g

Assim o impacto de um aumento de gastos no produto é dado por:

dy/dg = 1/[1-c'(1-t')]

Já o impacto sobre a arrecadação seria:

dt/dg = t'/[1-c'(1-t')]

Para que a arrecadação cresça mais que o gasto do governo seria necessário que:

dt/dg>1

Ou seja

t'/[1-c'(1-t')]>1


t'>[1-c'(1-t')]


-c'(1-t') < -(1-t')

c'(1-t') > (1-t')

Ou

c'>1 QED

Dá para complicar isto, por exemplo, introduzindo taxa de juros, p quie nos levaria ao modelo IS-LM, mas, como o multiplicador fica tipicamente menor (exceto quando estamos no limite de juro nominal zero), isto só torna mais difíceis as condições acima.

No caso de um modelo plenamente microfundamentado teríamos que escapar da equivalência ricardiana (possível, claro, mas ao custo de um investimento matemático um pouco maior). Só que , mesmo quando fazermos isto, o impacto do gasto público sobre PIB fica ainda menor.

"Tenho a mesma dúvida do que a Laura, "supra". Debatendo com colegas de esquerda, esses me perguntaram como eu explicaria o fato de a Alemanha, Suíça, Japão, dentre outros, terem juros reais negativos e não terem uma disparada da inflação, bem como terem grandes dívidas públicas, em especial o Japão."

Basta que a taxa real de juros de equilíbrio (ou "neutra") seja negativa, em particular mais negativa que a taxa real de juros observada nestes países.

Noto também que um país com taxa nominal negativa de juros pode ter taxa real de juros positiva, caso a expectativa de inflação seja mais negativa que a taxa de juros, não?

Deixo para vocês pesquisarem a literatura acerca do que poderia levar a taxa real neutra negativa.

"Me parece que nossa curva de philips ficou bem flat, e que precisamos de uma baita recessao para reduzir um pouco a inflacao. Poderia escrever sobre isso?"

Ou isto, ou o peso da inflação passada na curva e Phillips aumentou muito, o que, como argumentei várias vezes, pode ser resultado de um BC que estendeu demais o período de convergência.

Veja, aqui:

https://www.dropbox.com/s/ws9s632vr6lxjph/Monetary%20policy%20under%20inertia.pdf?dl=0

Alex, por que a influencia do hiato na inflacao teria diminuido? Quais parametros estruturais teriam mudado? A frequencia do reajuste?