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terça-feira, 13 de setembro de 2016

10 anos

São 10 anos como colunista da Folha. Por termos 10 dedos nas mãos, a data motivou uma visita ao que foi escrito no período, cerca de 220 mil palavras distribuídas ao longo de quase 650 páginas. Muita coisa, boa parte dela irremediavelmente datada, presa a debates que faziam muito sentido à época, mas, lidas hoje, não parecem ter relevância para entender o momento do país.

Algumas colunas, contudo, se não proféticas, ao menos servem para indicar que vários dos problemas que agora enfrentamos, da questão fiscal à inflação, passando pelo infindável debate sobre a taxa de câmbio, assim como a notável ineficiência microeconômica do país, não representam novidade alguma. Pelo contrário: eram nós a serem desatados já em 2006 e continuam a sê-lo em 2016, constatação triste para um país condenado à reforma.

Sintomaticamente, minha primeira coluna neste espaço tinha por título “Ajuste fiscal ou morte!”, e desenvolvimentos posteriores deixam claro que optamos pela segunda alternativa. Na mesma linha, as dívidas estaduais e as contínuas tentativas (agora exitosas) dos estados no sentido de obterem favores do governo federal foram objeto de análise algumas vezes, todas alertando para os riscos de soltar as rédeas das finanças locais, o que também acabou se materializando.

Há ainda um conjunto de artigos explorando a frouxidão e subserviência do Banco Central no período Alexandre Pombini, advertindo de forma muito clara que a contrapartida da postura servil do BC seria a inflação persistentemente acima da meta.

Erros ocorreram e não foram poucos (deixo aos interessados a tarefa de garimpá-los); ouso, porém, dizer que os acertos foram mais comuns ao longo destes 10 anos. Não houve mágica, apenas a disposição de encarar a teoria econômica como um instrumento útil para interpretar tanto a realidade como as decisões de política econômica, que, na imensa maioria dos casos, se mostraram mais equivocadas do que corretas.

Concretamente, não era difícil concluir que o arranjo da Nova Matriz Econômica, pobre órfã, iria dar com os burros n’água. Bastava saber, como ensinado em qualquer curso decente de macroeconomia, que estímulos à demanda no contexto de uma economia operando próxima ao pleno-emprego iriam se traduzir em inflação elevada e desequilíbrios externos.

A teoria econômica, assim como a história, também nos haviam ensinado os efeitos de controles de preços, seja a perda de eficiência a eles associada, seja a inevitável explosão que se segue a um período de congelamento, tanto maior quanto mais extenso o intervalo de tempo.

Não havia, por fim, como escapar da conclusão que desequilíbrios fiscais persistentes teriam consequências particularmente danosas para o país. Não era necessária clarividência: apenas conhecimento da nossa história, bem como a de outros países que haviam passado por processos semelhantes.

Se resta, assim, uma lição a tirar dos últimos 10 anos é que a boa teoria, aliada ao respeito pelos dados, é imprescindível à análise econômica e, mais importante, à formulação de política. Não tivesse sido abandonada com enorme sem-cerimônia provavelmente estaríamos em situação bem melhor do que nos encontramos.

E eu teria que achar outros assuntos.

Obrigado pelos 10 anos; que venham outros tantos.



(Publicado 7/Set/2016)

39 comentários:

Parabéns, Alex! Talento, competência, isenção!

http://www.valor.com.br/brasil/4707135/bresser-pereira-regra-fiscal-prevista-pela-pec-do-gasto-e-absurda

Alexandre,

Também divide da opinião do seu amigo e competente economista Samuel Pessoa de que ja contratamos um surto inflacionário pra daqui a 4/5 anos? Ou seja, daqui a 4/5 anos vamos estar discutindo como derrubar uma inflacao de 15/20%aa?

Diogo.

Sim. Se não acertarmos o lado fiscal, as consequências serão exatamente as que o Samu apontou...

"Sou absolutamente a favor do ajuste fiscal”, afirmou Bresser." Mas "[O correto seria] Estabelecermos uma porcentagem da despesa pública total sobre o PIB, e não pode ser mais que isso."

É má vontade minha, ou estas duas afirmações não casam uma com a outra?


"Se não acertarmos o lado fiscal..."

A reforma da previdência é a longo prazo, não havendo impacto agora, sobraria a pec do gasto publico e esse programa de concessoes/privatizacoes (há mais alguma coisa?). Essas medidas seriam suficientes para se evitar um surto inflacionario?

Diogo.

Caso o ajuste fiscal não seja feito, uma inflação acelerando para 20% iria equilibrar as coisas? Iríamos sofrer de dominância fiscal, dólar indo para R$10, monetização da dívida pública e juros reais negativos?

Parabéns Alexandre e obrigado pelos serviços prestados a nós no sentido de clarificar a economia de forma bastante coerente. Sou engenheiro por formação mas tenho aprendido bastante sobre os temas econômicos através de pessoas como você.

Abraços.

O Globo comprou o Pravda. Vamos ter uma limpa?

Parabéns pelos 10 anos de análise lúcida e sempre acessível aos leitores em geral.
Seus escritos me fazem acreditar (ainda!) na relevância dos bons economistas, em meio a tantos que se dizem como tais, mas não entenderam nem sequer o básico.

"Caso o ajuste fiscal não seja feito, uma inflação acelerando para 20% iria equilibrar as coisas?"

Não. Seria o sintoma do desequilíbrio.

Alexandre, o discurso do Samu é o discurso de dominancia fiscal. Num dsge com dominancia fiscal, a transmissao para a inflacao em economias abertas ocorre via aumento de demanda por produtos domesticos ou por ativos externos, o que causa depreciaçao cambial. No mundo real, no emtanto, como tivemos a chance de ter uma pequena prova nesses ultimos dois anos, caso ocorra tal cenario, ele se materializa com baita contracao economica, com produto bem abaixo do potencial. Sob essas circunstacias, é complicado acreditar no canal da demanda domestica. No canal do cambio, é tambem complicado, dado o baixo pass-through nestas condiçoes. Em suma, a historia faz sentido no modelo, mas nao na vida real. A inflacao dificilmente aumentara a ponto de fazermos o estrago tao propalado por aí. Um abraço, Pedro

Inflação, câmbio, ineficiência infelizmente não vem de 2006. Roberto campos já falava disso na década de 60... parece que nunca saímos disso.

"Não. Seria o sintoma do desequilíbrio."
Estou tentando imaginar como poderia ser um novo equilíbrio se o aj fiscal fosse abandonado.
Obrigado pela resposta.

Critica pesada, Alexandre. Ja leu?

https://www.law.yale.edu/system/files/area/workshop/leo/leo16_romer.pdf
O que acha?

Alexandre,

Voce concorda com a Monica de Bolle com relação a uma reducao do juros? Ela usa o como argumento o elevado nivel de endividamento. Ao invés de tomarem crédito para investir, as empresas/consumidores usarão esses recursos para abater o endividamento.

Faz sentido? O que acha?

Essa Monica é a mesma que defendia o fim do regime de metas no ano passado? Acho que apoiou o cavalo de pau de 2011,o do Pombini.

Parabéns, menino!!! \o/
Obrigada pelos 10 anos; que venham outros tantos.
Zilhões!!!
luciene felix lamy

"Num dsge com dominancia fiscal, a transmissao para a inflacao em economias abertas ocorre via aumento de demanda por produtos domesticos ou por ativos externos, o que causa depreciaçao cambial."

Não estou pensando em termos de DGSE, mas em financiamento monetário do déficit, caso não se faça o ajuste fiscal.

Abs

Essa Mônica é a que acreditada no soft land da economia americana nas vésperas de 2008?

Alex,

A LRF nao proibe o financiamento monetario do deficit? Acho institucionalmente inviavel esse caso.

Parabéns, Alex!

Continue arrancando as máscaras dos que vendem fórmulas econômicas já testadas e fracassadas.

Infelizmente, ainda prevalece no Brasil um modelo mental estatista e profundamente iliberal. Mas acredito que isto está gradualmente mudando, graças também à atuação corajosa e decidida de gente influente e preparada como tu.

Que venham mais 10 anos!

Nesses 10 anos o senhor não homenageou nenhuma vez o presidente Lula em sua coluna.

O cavalo de pau de 2011, foi estranho mas não foi o problema pois os juros estavam em 13%. Problema foi quem apoiou a queda de abaixo de 9% até 7,25% quando a inflação subia. E quem não percebeu que segurar os juros com core rodando a 7,5% ia dar em encrenca. E a Monica percebeu isso.

"A LRF nao proibe o financiamento monetario do deficit? Acho institucionalmente inviavel esse caso."

A LRF proíbe um monte de coisas que, apesar de tudo aconteceram. Sinto te desapontar, mas adivinhe quem irá prevalecer se estas coisas entrarem em choque...

"Nesses 10 anos o senhor não homenageou nenhuma vez o presidente Lula em sua coluna."

Como não?

O sentorno nunca disse que Lula foi um exemplo de moralidade publica,etc.

Me mostre uma coluna sua dizendo que Lula foi um exemplo de moralidade publica,de combate a corrupção etc?

Alexandre, quanto ta tua selic esperada pro final do ano? Quanto para out e quanto para nov?

"Me mostre uma coluna sua dizendo que Lula foi um exemplo de moralidade publica,de combate a corrupção etc?"

Mostre que não escrevi...

"Alex, o que acha do Castelar?"

Craque.

Por que o sr só guarda palavras elogiosas para homens?
bjs
Zee Elle