Sou
repetitivo. Há, confesso, temas que recorrem neste espaço bem mais que
gostaria, mas, mesmo admitindo minhas obsessões, o problema maior é com o país,
que insiste em ser ainda mais repetitivo do que eu.
Vejam
agora o pleito de governadores por mais uma rodada de renegociação de suas
dívidas junto à União. Desde que o governo federal assumiu as dívidas
estaduais, na segunda metade dos anos 90, governadores (e também prefeitos) vêm
brigando para não pagar o que devem. O que ocorre agora não é diferente, exceto
que, desta vez, parece que irão
vencer, com consequências potencialmente desastrosas para as
finanças públicas.
A
narrativa é conhecida: como as dívidas junto ao governo federal são tipicamente
indexadas ao IGP, pagando ainda uma taxa de juros elevada, governadores
reclamam que se tornaram impagáveis, em geral comparando a dívida anos atrás
com a atual. Por exemplo, o conjunto das dívidas interna e externa dos estados
atingia R$ 216 bilhões em dezembro de 2001; já em dezembro de 2015 este valor
havia subido para R$ 646 bilhões, praticamente 3 vezes maior do que em 2001 e,
portanto, impagável.
Ou
não. Quem costuma apresentar os números desta forma espertamente deixa de
mencionar que o PIB e as receitas estaduais cresceram no período, pela força
combinada da inflação e da expansão real da atividade econômica. O PIB nominal
(sem a correção pela inflação) aumentou 4,5 vezes, praticamente a mesma
magnitude de crescimento das receitas, seja pelo lado da arrecadação, seja
pelas transferências federais.
Assim
a dívida estadual – que era equivalente a 15,5% do PIB em 2001 – caiu para 11%
do PIB em 2015. Da mesma forma, a dívida equivalia a 1,5 ano de receitas em
2001, caindo para 1 ano em 2015.
Isto
dito, a comparação acima (2015 contra 2001) não captura a piora observada a
partir de meados de 2014, quando a dívida estadual saiu de 9% do PIB para os
atuais 11% do PIB. O notável, porém, é que este aumento não resultou das
dívidas reestruturadas nos anos 90, isto é, do que é devido ao governo federal,
mas principalmente de outras duas modalidades: a dívida junto a bancos locais
(+0,6% do PIB) e dívida externa (+1,0%), esta última em parte impulsionada pela
valorização do dólar no período.
Posto
de outra forma, o aumento observado nos últimos 18 meses não parece ter
resultado das regras associadas à dívida junto ao governo federal, mas pela
assunção de novas dívidas, devidamente autorizadas pelos (ir)responsáveis de
plantão.
Embora,
ao menos em tese, estados possam ter incorrido em novas dívidas para pagar a
União, na prática este pagamento manteve-se constante como proporção da receita
líquida dos estados, sugerindo que o endividamento adicional ocorreu por outros
motivos, a saber, gastos mais altos, em especial associados ao funcionalismo.
Em alguns casos as perspectivas de receitas mais elevadas, por exemplo, royalties da exploração de petróleo,
induziram governadores a gastar por conta, contando com o proverbial ovo já na
galinha.
Apesar
do comportamento gastão, o governo federal agora acena com a possibilidade de
novamente, resgatar os pródigos, gerando incentivos para mais
irresponsabilidade à frente. E mais uma coluna apontando os erros desta
postura...
(Publicado 17/Fev/2016)