No final de 2013 muito
se falava sobre a possibilidade da chamada “tempestade perfeita”, entendida à
época como a combinação profana do rebaixamento da nota da dívida brasileira
com o aumento das taxas de juros nos EUA. Segundo o ex-ministro Delfim Netto,
em tal cenário teríamos “uma rápida elevação da taxa de
juros no mundo, uma mudança dos fluxos de capitais, um ajuste instantâneo e
profundo da nossa taxa de câmbio, uma redução do crédito bancário, uma queda
dramática da renda real dos trabalhadores e a volta (...) de taxas de juros
reais aos absurdos níveis com que vivemos durante tantos anos, acompanhados por
um aumento do desemprego”.
Embora a nota da dívida
tenha sido rebaixada, não chegamos a perder (ainda!) o “grau de investimento”,
nosso atestado de bons pagadores. Por outro lado, em que pesem os sinais de
recuperação cada vez mais evidentes da economia americana, como mostrado no
último relatório do mercado de trabalho, as taxas de juros (no caso para
aplicação nos títulos de 10 anos do Tesouro) se encontram cerca de um ponto
percentual mais baixas do que eram à época, na casa de 1,80% ao ano. A verdade
é que esta temida “tempestade perfeita” (ainda) não ocorreu.
No entanto, à falta da
ajuda meteorológica estrangeira, o governo, com sua competência habitual,
tratou de criar a versão brasileira deste desastre climatológico-econômico.
O consenso entre os
economistas que contribuem para a pesquisa Focus,
do BC, aponta para crescimento nulo em 2015 com a inflação superando 7%, e isto
num cenário que não contempla racionamento de energia e água (ainda; perdão pela
repetição do advérbio).
Assim, o mercado de
trabalho, que não foi bem do ponto de vista de geração de empregos em 2014,
deve provavelmente ter desempenho ainda pior em 2015. Neste contexto é difícil
imaginar que a taxa de desemprego vá permanecer tão baixa quanto nos últimos
anos.
É tentador atribuir
este quadro desolador às políticas adotadas no período mais recente e não tenho
a menor dúvida que economistas já conhecidos por seu baixo apego à honestidade
intelectual não hesitarão em fazer exatamente isto. Aliás, não parece ser outra
a motivação do manifesto “heterodoxo” publicado na semana
passada.
A verdade, contudo, é
que a “tempestade perfeita” vem sendo gestada domesticamente há anos, mas
ganhou velocidade do final de 2014 para cá.
Do lado da política
macroeconômica, a irresponsabilidade foi a norma. A incapacidade de reconhecer
que a desaceleração da economia brasileira resultava essencialmente de
limitações do lado da oferta levou a políticas de aumento sem precedentes do
gasto governamental, assim como o desmonte da estrutura institucional que
impunha alguma disciplina ao setor público. A Lei de Responsabilidade Fiscal
foi devidamente imolada no altar da “nova matriz macroeconômica”.
Da mesma forma, o
descaso com a inflação ficou evidente na condução desastrada da política
monetária de 2011 para cá, também implicando considerável retrocesso
institucional.
Tão, ou mais,
importante, porém, foi a deterioração da política microeconômica. Retomando
velhos vícios no que se refere à intervenção no domínio econômico, o governo
desarticulou setores importantes, reduzindo ainda mais o ritmo de expansão da
produtividade, agravando o problema do baixo crescimento.
O resultado destas
políticas não poderia ser diferente do observado: estagnação, inflação acima da
meta, déficits externos elevados e dívida pública crescente, agravados agora
pela gestão desastrosa tanto da Petrobras quanto do setor energético,
supostamente áreas de especialidade da presidente.
A “tempestade perfeita”
é apenas o ponto culminante dos erros do governo, cuja responsabilidade cabe igualmente
aos economistas que não só aplaudiram a política econômica da presidente, mas
também pediram bis, e agora tentam desajeitadamente fingir que nada tem a ver
com o problema.
(Publicado 11/Fev/2015)
3 comentários:
"No que se refere..." Não pude deixar de notar.
Me lembra uma frase (creio que atribuída ao Simonsen): "Se só existe no Brasil e não é jabuticaba pode saber que é besteira"
estagnação (ainda!)
já se fala em recessão, estagflação que nada, vão conseguir produzir a receflação mesmo, ou simplesmente: crise.
Prezado Alex, dê uma olhada no pib paulista (SEADE). No site tem uns gráficos do mergulho que falam por si.
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