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quarta-feira, 30 de setembro de 2009

A dieta da meta fiscal

Passei uma semana nos EUA visitando investidores e resolvi aproveitá-la em todos seus aspectos, incluindo a facilidade de usar a bicicleta ergométrica do hotel, na qual me exercitei religiosamente (45 a 50 minutos por sessão, com carga ao redor de 75% da máxima) em cinco dos seis dias que estive lá. Reduzi também o consumo de calorias, evitando (exceto por dois jantares, sem sobremesa) os excelentes restaurantes nova-iorquinos. O resultado, como seria de se esperar para um descendente de uma longa linhagem de indivíduos horizontalmente prejudicados, foi uma perda negativa de peso. Em bom português, engordei e, portanto, me desviei ainda mais da meta que me foi imposta há alguns meses.

Descobri, porém, a solução perfeita: reajustando a meta uns tantos quilos para cima, descobri que, na verdade, estou suficientemente perto do meu peso alvo para deixar de me preocupar com a balança e aproveitar a vida. Redefinindo ainda parcela da gordura como músculo, cheguei à conclusão que não apenas meu peso é adequado, mas também que minha forma física invejável me permite agora até certos prazeres gastronômicos há muito não desfrutados. A minha vida mudou depois da dieta da meta fiscal, uma criação milagrosamente simples do governo brasileiro.

Assim, caso haja sinais que, por um motivo qualquer, não será possível atingir a meta que o próprio governo se impôs, basta redefini-la, estabelecendo um valor mais baixo. A persistirem as dificuldades, não há problema. Primeiro estabeleça que certos investimentos (executados no contexto do Programa de Aceleração de Crescimento, PAC) podem ser abatidos para fins de aferição do resultado. Não se desespere se houver atraso na execução dos investimentos do PAC: reclassifique investimentos já executados, de forma que passem a fazer parte do programa, permitindo sua dedução da meta de superávit. Se, mesmo assim, a meta parecer inatingível, sempre restará o Fundo Soberano para ajustar as contas.

E, caso tudo isto falhe, ainda é possível, como de hábito, prometer que começaremos, sem falta, a cumprir a meta no ano que vem, a partir de segunda-feira.

Até agora o único problema que a dieta da meta fiscal me causou foi certa dificuldade de caber nas roupas para magros. As confecções nacionais, certamente motivadas pelo seu inexplicável credo neoliberal, não foram capazes de convencer as calças 42 que o diâmetro da minha cintura não deveria ser obstáculo ao seu uso, de modo que continuam se recusando obstinadamente a serem abotoadas. De pouco adianta argumentar que a crise internacional rompeu antigos paradigmas, revelando tanto as falhas da teoria econômica neoclássica como a falácia do estado mínimo tupiniquim; as calças permanecem irredutíveis e, principalmente, inabotoáveis.

Pelos mesmos motivos inconfessáveis, creio, a redução da meta do superávit primário, ainda que ajustada por todas as siglas que consigamos imaginar, não consegue convencer a dívida pública a não crescer. Mais importante ainda, embora a arrecadação provavelmente volte a crescer no ano que vem, o aumento permanente do gasto público também deverá enfrentar dificuldades consideráveis para persuadir a demanda a não continuar se expandindo no contexto de uma recuperação vigorosa da economia.

Receio assim que nem o Dr. David Lewi, nem o Banco Central, se deixarão convencer pelas promessas da dieta da meta fiscal. Dificilmente sairei da minha próxima consulta sem uma renovada recomendação de perda de peso, a mesma que o Banco Central fez ao governo na semana passada.

(Publicado 30/Set/2009)

sábado, 19 de setembro de 2009

Estarei fora esta semana

Espero conseguir moderar os comentários, mas não prometo.
Abs
Alex

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Muito além do jardim

Há quem imagine que estejamos revertendo à situação de um país exportador de produtos primários, já que nos primeiros oito meses deste ano a exportação desses bens superou a de manufaturados, fenômeno que deve perdurar no restante de 2009 e, se confirmado, ocorrerá pela primeira vez desde 1979. Como de hábito, porém, o anúncio da nossa reversão à exportação de matérias-primas é prematuro, fruto da observação superficial dos dados.

Para entender este fato requer-se um breve exame do perfil das exportações nacionais. Tomemos dois grupos relevantes: as grandes economias (GEs) – EUA, União Européia, China e Japão – e a América Latina (AL). O primeiro grupo (38% do comércio global) responde por quase metade de nossas exportações, enquanto o segundo representa fração importante, mas menor, em torno de 22%.

Isto dito, há distinções radicais de composição nas exportações para cada grupo. No caso das GEs, metade das exportações consiste de produtos primários, enquanto manufaturados são cerca de 35%. Esta média, entretanto, encobre grandes diferenças: as exportações para a China são essencialmente de primários (80%); para os EUA, porém, exportamos majoritariamente manufaturados (61%). Já no que se refere à AL nada menos do que 85% das exportações são de bens manufaturados, proporção esta que pouco se altera para cada país da região.

Assim, ainda que as exportações para a AL sejam menos da metade das vendas para as GEs, no que tange aos manufaturados sua relevância é praticamente igual. Cada grupo representa pouco menos de 40% dessas exportações.

Como se sabe, no entanto, o desempenho das importações desses grupos é bastante distinto. No caso das GEs, apesar da forte queda desde o terceiro trimestre do ano passado, já se observa modesto aumento na margem, resultado que deriva essencialmente do crescimento chinês, cujas importações sobem desde o começo do ano. Na AL, todavia, os sintomas de crescimento ainda não apareceram, embora haja sinais muito incipientes no terceiro trimestre.

Dado que as exportações brasileiras seguem as importações de seus parceiros (a rigor uma aproximação, pois a participação do Brasil tem, na verdade, crescido), a mudança do perfil não chega a surpreender. As exportações de primários têm um desempenho melhor que manufaturados porque as importações chinesas crescem, ao contrário do que ocorre com as importações de nossos principais clientes de manufaturados, a AL e os EUA.

Há, contudo, um dado alentador. Preços de commodities, fortemente correlacionados com preços de exportação (e termos de troca) latino-americanos têm subido, um fenômeno que leva à recuperação das exportações e, portanto, importações da região com defasagem ao redor de um trimestre. É razoável, pois, esperar que nossos vizinhos sigam, em grau e velocidade variados, uma trajetória de recuperação semelhante à nossa, com implicações positivas para as exportações de manufaturados.

Quem não entender esta dinâmica continuará acreditando tanto em Papai Noel como na “doença holandesa”.
Fontes: Bloomberg e elaboração do autor
(Publicado 16/Set/2009)

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Outra dica do Mankiw

Belo ensaio do Luigi Zingales, daqueles que põem a gente para pensar.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Irresistível

Estava no blog do Mankiw, mas foi vê-la no blog do Léo Monastério que me convenceu.













Era uma vez (versão animê)

Em 2008 o valor da produção doméstica aumentou cerca de R$ 140 bilhões, enquanto os impostos cresceram quase R$ 80 bilhões. Assim, embora a carga tributária tenha atingido já elevados 36% do PIB, a carga adicional superou inacreditáveis 57%. Mesmo com níveis quase obscenos de tributação, ainda há quem defenda a bizarra tese que – graças à transferência à sociedade de parcela considerável daqueles recursos – a carga tributária líquida de transferências seria baixa, assim como seus efeitos sobre a economia. Um pequeno conto, porém, deve bastar para nos convencer do contrário.

Era uma vez uma economia muito simples: pessoas idênticas produziam (e consumiam) um único produto, feito apenas com trabalho. Tudo que recebiam como salário era consumido, ou seja, a decisão de quanto consumir era exatamente a mesma decisão de quanto trabalhar.

Assim, ainda que as pessoas pudessem ter outros interesses em mente, o custo de se consagrarem ao desenvolvimento do espírito corresponderia àquilo que deixariam de consumir. Em outras palavras, o custo de oportunidade do lazer era o consumo do qual abririam mão para usufruírem de tempo livre.

Certo dia um novo ministro, egresso de um desenho animado japonês, decidiu criar um imposto sobre a renda, prometendo, contudo, sua devolução integral. Destarte, dizia o Pokémon, a carga tributária líquida seria nula, sem qualquer impacto sobre a economia. A partir daquele momento cada trabalhador passou a entregar metade do salário para o governo, recebendo um montante equivalente sob a forma de transferências governamentais. Parecia um arranjo neutro.

No entanto, não era. Embora a renda total (salário líquido mais transferências) fosse a mesma, o custo de oportunidade do lazer caíra substancialmente. Se antes uma hora a mais de lazer significava a perda de uma hora de salário (digamos, R$ 100/hora), sob o novo arranjo esta perda líquida era apenas de R$ 50/hora. Dado isto, as pessoas fizeram o que normalmente fazem, isto é, demandaram mais o que ficou mais barato (o lazer) e menos o que ficou mais caro (o consumo). Vale dizer, passaram a trabalhar menos e, portanto, a produzir menos.

Poderia parecer irracional. Afinal de contas, trabalhando menos, também a arrecadação cairia, reduzindo as transferências. Cada indivíduo, porém, via a transferência como algo independente de seu esforço pessoal. Mesmo que houvesse a compreensão que, do ponto de vista agregado, a redução do tempo de trabalho implicaria também menores transferências, cada um tinha o incentivo para reduzir o seu tempo de trabalho, na esperança que os demais não o fizessem, pois usufruiria de mais tempo livre enquanto a transferência seria apenas marginalmente afetada por sua decisão. O resultado, mesmo com carga líquida zero, foi queda da produção, do emprego e do consumo.

Obviamente a economia brasileira é bem mais complexa que esta fábula. Há pessoas diferentes, bens distintos e vários recursos contribuindo para a produção. Isto dito, a lógica do modelo ainda se aplica: se a tributação toma fração apreciável da renda, o estímulo à produção é reduzido, mesmo que os recursos retornem à sociedade, com efeito negativo sobre o crescimento de longo prazo.

Não se justifica, pois, a existência de uma carga tributária elevada com o argumento das transferências, dado que são os impostos brutos que reduzem os incentivos à expansão da economia. Essa tese, como tantas outras, serve apenas para defender a qualquer custo o gigantismo estatal no Brasil, ignorando os fundamentos básicos de análise econômica.

(Publicado 2/Set/2009)