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terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Retórica e realidade


O presidente eleito, Jair Bolsonaro, manifestou sua oposição à proposta de reforma da previdência capitaneada por Michel Temer, afirmando que “não podemos querer salvar o Brasil matando idoso”. Parece não ter percebido nem que a campanha acabou, nem que o tema requer bem mais maturidade na análise.

A começar porque qualquer proposta de reforma não pode alterar direitos adquiridos dos atuais aposentados. Mais importante, porém, é que não há nada no projeto que autorize a visão particularmente cruel expressa acima.

A discussão hoje se concentra (embora não se esgote) em três aspectos. O primeiro é a criação de uma idade mínima de aposentadoria para o INSS, que atingiria 62 anos para mulheres e 65 para homens em 20 anos. O segundo é o estabelecimento de uma regra de transição, especificando que vale para mulheres acima de 53 anos e homens acima de 55. O terceiro é a equiparação do regime para o funcionalismo público às regras do regime para trabalhadores do setor privado.

No que se refere aos dois primeiros, noto que, dos 35 milhões de beneficiários da previdência (5 milhões de assistenciais e 30 milhões de previdenciários), há 6 milhões de aposentados por tempo de contribuição, ou seja, 18% do total. Apesar disto, recebem 30% do valor desembolsado, não só a maior fatia, mas também o maior valor médio, correspondente a R$ 3 mil/mês, tendo se aposentado em média aos 55 anos.

Para fins de comparação, quem se aposenta por idade (65 anos), recebe metade deste valor (a maioria recebe um salário mínimo); já os benefícios assistenciais equivalem a um salário mínimo, R$ 954/mês. Em outras palavras, o que se propõe é que os que ganham mais se aposentem (em 20 anos) na mesma idade dos que ganham menos.

Há, é verdade, um requisito adicional para o recebimento do benefício integral (cujo teto é hoje R$ 5,5 mil/mês): 42 anos de contribuição, ou seja, quem se aposentasse por tempo de contribuição aos 65 anos teria começado a contribuir pelo menos aos 23 anos. Contudo, para a maioria dos que se aposentam por idade, não haveria mudança: fariam jus a um salário mínimo e continuariam a recebê-lo após os 65 anos.

Já a equiparação de regimes eliminaria a inequidade hoje existente entre aqueles que se aposentam com salário integral e meros mortais. Em particular, no caso do funcionalismo federal, a aposentadoria média em 2016 era R$ 7,7 mil/mês, contra R$ 1,4 mil/mês para aposentados pelo INSS, 5,5 vezes maior.

Em suma, muito embora o projeto de reforma ora em discussão não seja perfeito, está longe de corrigir o problema previdenciário pelo assassinato em massa de velhinhos. Ao contrário, reduz desigualdades e preserva os direitos dos mais pobres.

Já deveria ficar claro para o presidente que o sucesso de sua administração está intimamente ligado à capacidade de aprovar, possivelmente ainda em 2019, uma reforma que limite os gastos com aposentadorias e pensões, sem o que o teto constitucional de despesas se tornará insustentável nos próximos anos.

A retórica de campanha, associada à declaração pessimista do deputado Eduardo Bolsonaro sobre a possibilidade de aprovação da reforma no Congresso, gera sérias dúvidas acerca de seu compromisso com o ajuste fiscal.

Não há margem de erro nesta frente: se não aprovarmos a reforma da previdência enfrentaremos uma grave crise fiscal, com repercussões óbvias sobre a estabilidade política do país.



(Publicado 5/Dez/2018)

4 comentários:

O ajuste fiscal será feito apenas pela reforma da previdência ou outras medidas também deverão ser tomadas? Pelo o que vejo na imprensa, aparentemente sim, mas não sou economista, então queria saber sua análise da situação.

E preciso fazer a reforma da previdência,poupando os servidores públicos.Existem outras medidas que podem ser adotadas como:Aumentar a arrecadação de impostos diminuindo a sonegação,cobrar a dívida ativa,etc.

Atualmente uma execucao fiscal com 6 anos prescreve(1 ano de prescrição intercorrente mais 5 anos de prazo para cobrar o crédito.

O correto deveria ser reformar a previdência do setor privado,depois aumentar arrecadação via combate à sonegação,cobrar de quem deve,para depois reformar a previdência do setor público.

"E preciso fazer a reforma da previdência,poupando os servidores públicos."

É preciso, fazer, uma reforma, gramática permitindo, usar as, vírgulas como a, gente quiser...