No começo da semana, o
Pravda, perdão, Valor Econômico publicou matéria divulgando trabalho
do Ibre que aponta para as dificuldades para o cumprimento do preceito
constitucional que limita o crescimento do gasto federal à inflação passada,
alertando para a possibilidade que isto leve à paralisação da administração já
em 2019, primeiro ano do novo governo.
Em que pese o escarcéu,
no qual surfaram os oportunistas de sempre (por exemplo, nelson
barbooosa), trata-se de prato requentado.
Explorei
este assunto
algumas vezes, notando que a emenda constitucional 95, que criou o chamado “teto
dos gastos” era o primeiro passo do ajuste fiscal, mas em si insuficiente para evitar
a deterioração fiscal, pois requereria medidas adicionais, das quais
a mais importante e urgente ainda é a reforma previdenciária.
De forma bem mais elaborada a Instituição Fiscal Independente publicou em maio do ano passado estudo que chegava a conclusões muito próximas das descritas acima: na ausência de reformas que alterassem a dinâmica do gasto obrigatório, categoria em que se inclui a despesa previdenciária, não seria possível conter a despesa do governo sem comprometer ainda mais a baixa qualidade dos serviços públicos.
O curioso é que a
situação é apresentada como um dilema: ou escolheríamos preservar o teto (implicando
o colapso dos serviços), ou manteríamos o governo funcionando, mas teríamos que
revogar o limite de gastos. Isto é simplesmente falso.
Temos, na verdade, um trilema: podemos manter o teto e ignorar
as reformas, mas aí a administração entra em colapso; podemos evitar o colapso
e as reformas, mas o teto se torna insustentável; por fim, podemos manter o teto
e a administração funcionando, mas teremos que encarar as reformas.
É justamente a terceira
alternativa que parece ausente não só da análise, mas, de forma muito mais
importante, do mundo político, que segue ignorando solenemente a marcha da
insensatez das finanças públicas.
Tenham em mente que a trajetória
de ajuste que resulta da aplicação do teto (caso não se torne inviável) é extraordinariamente
gradual. O resultado primário federal, negativo na casa dos R$ 100 bilhões nos
últimos 12 meses, só sairia do vermelho no final do próximo governo, prazo similar
ao requerido para que a despesa retornasse aos níveis (ainda elevados) registrados
em 2014.
Já a dívida aumentaria
relativamente ao PIB possivelmente por mais alguns anos (de dois a cinco, pois depende
crucialmente do ritmo de crescimento no período), atingindo algo na faixa de
85-90% do PIB, sempre sob a suposição que seja possível manter a atual
estratégia. Falamos, portanto de um ajuste espalhado ao longo dos próximos 6 a 9
anos, com certa dose de boa vontade, em torno de 0,4-0,5% do PIB por ano.
O abandono do teto
significaria, portanto, um ajuste ainda mais lento que, se levado a cabo,
implicaria uma dívida certamente mais alta do que a sugerida acima e, consequentemente
um risco de instabilidade bem maior do que o experimentado hoje.
A ideia, portanto, que existiria
uma alternativa relativamente indolor que permitiria contornar as reformas e
fazer um ajuste ainda mais gradual do que o proposto pode até parecer sensata e
equilibrada, mas significa, na prática, jogar mais combustível numa fogueira
que arde bem mais do que seria prudente permitir.
Não há mais meia-sola
que dê jeito nas contas públicas.
(Publicado 08/Ago/2018)
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