Nesta semana o Conselho
Monetário Nacional decidirá sobre a meta de inflação para 2017. Muito embora deva
provavelmente mantê-la em 4,5%, há quem defenda sua redução, talvez
(e paradoxalmente) casada com uma elevação da meta para 2016. A ideia é dar um
tanto de folga para o aperto de juros neste ano, mas sem comprometer as
expectativas de inflação, já que a meta mais baixa para 2017 sinalizaria a
continuidade do esforço à frente.
Em outras
circunstâncias a redução da meta seria uma boa ideia; nas condições de hoje possivelmente
não.
Para entender o
problema imagine um BC muito diferente do atual, que costume entregar a
inflação na meta, de modo que a melhor aposta para a inflação num dado ano seja
sempre a própria meta. O que ocorreria caso esta fosse reduzida de 4,5% para
3,5% dois anos à frente?
Face ao histórico favorável,
as expectativas para 2017 cairiam de 4,5% para 3,5%. Afinal de contas, trata-se
de instituição que tem dado mostras de responsabilidade nesta área.
Isto dito, empresas e
trabalhadores, ao formarem preços e salários em 2016, sabedores da provável
queda da inflação em 2017, não deveriam manter seus reajustes na casa de 4,5%,
mas incorporariam expectativas mais baixas em preços e salários já no próximo
ano. A inflação tenderia, portanto, a cair em 2016 por conta deste efeito, o
que permitiria uma política monetária menos apertada e maior crescimento naquele
ano.
Curiosamente, pois, no
caso de um BC com reputação impecável, a redução da meta de inflação abriria
espaço para queda temporária da taxa de juros e crescimento acima do potencial,
por período igualmente restrito. As chaves para este resultado surpreendente
são o comportamento das expectativas de inflação (no caso em queda), bem como
seu peso na determinação da inflação corrente (moderando reajustes de preços já
no período anterior à mudança).
Tais resultados, é bom
notar, ainda seriam em larga medida válidos caso a inflação passada tivesse
algum efeito sobre a inflação corrente: a taxa de juros seria mais baixa do que
a que vigoraria sem a mudança da meta e o crescimento mais alto do que o
observado no caso da meta inalterada, também desafiando o senso comum.
A hipótese crucial para
que isto ocorra, como podem imaginar, é a reputação impecável do BC, ou seja,
seu feito de manter a inflação flutuando próxima à meta.
Não é necessário grande
esforço, porém, para concluirmos que esta descrição dificilmente se aplicaria
ao Banco Central do Brasil dos últimos anos. Sob sua atual direção a inflação
atingiu, em média, 6,2% ao ano, apesar de controles de preços administrados e da
mudança na metodologia de cálculo do IPCA em 2012, que fez a inflação daquele
ano atingir 5,84% contra 6,54% caso o índice tivesse permanecido o mesmo.
Nestas circunstâncias,
a prioridade deveria ser atingir a meta para começar a reconstruir a reputação
abalada, e não brincar com números para tentar convencer as pessoas que, daqui
para frente, tudo vai ser diferente.
Na verdade, esta
iniciativa me lembra de um amigo de mercado financeiro que me disse certa vez buscar
seu segundo milhão de dólares, “porque o primeiro eu jamais vou conseguir”. O
BC, ao contrário, deveria se preocupar em ganhar seu primeiro milhão; o segundo
seria apenas consequência.
Segundo milhão a caminho |
(Publicado 24/Jun/2015)
4 comentários:
Milhão tá difícil, serve mandiocão?
As incertezas e falta de credibilidade não são apenas no BC, mas também políticas. O PT jogando contra a Presidanta (será que ela segura o Levy?), o governo fazendo tudo que demonizava durante as eleições (remédio necessário), Petrolão, Impeachement, paralisia das empreiteiras (como serão os reflexos no programa de concessões?) - tantas dúvidas que entramos totalmente no âmbito do surreal para 2017. Expectativas são importantes, os números para 2017 são preciosidades cuja bola de cristal ninguém tem. Podem deixar em 4,5% mesmo pois para baixo ninguém vai acreditar.
Lembro na década de 70 quando falavam da previsão do tempo no Rio, diziam simplesmente "amanha o dia vai ser bom". 2015 foi péssimo, 2016 será ruim, 2017 "anyone´s guess"!
... no papel, ótimo plano. Quero ver na prática.
que lindo um mundo sem rigidez nominal...
(A ref original da anedota é: "vou atrás do meu segundo milhão, do primeiro já desisti".)
Alex, seguindo a sua lógica se o BC reduz a meta lá na frente, o setor produtivo hoje passa a cortar ainda mais sabendo que os juros continuarão altos por mais tempo, resfriando ainda mais a economia, gerando ainda mais escassez de produtos, retraindo ainda mais o consumo.
MAS, se essa escassez na oferta for maior que a retração no consumo, pela velha lei da ofertaXdemanda a inflação de preços continuará em alta, e acho que é exatamente este o caso, um empresário ligado no mundo, prudente, e escaldado com anos de BRasil nas costas ele pode rapidamente parar sua produção a zero, fechar as portas e surfar nos juros. Já a retração pelo consumo, acredito que não se retraia assim tão rápido, a família vai fazendo as contas, cortando aos pouquinhos, rolando a dívida de um cartão pro outro.
Por isso tudo, é razoável supor que esse corte na meta futura vá gerar mais crise E mais inflação, com ou sem reputação.
Aí me lembro de outra anedota não tão elegante: "merda, quanto mais mexe mais fede".
Postar um comentário