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quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Triconomics 30/Out/2014

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

A curva de Rousseff

Não tenho, é claro, a menor ilusão que a presidente da República leia minhas colunas. Aliás, considerados seus maus-tratos à língua, não tenho a menor ilusão que leia qualquer coisa. Ainda assim continua a ser surpreendente (ou seria “estarrecedor”?) sua insistência em temas há muito demonstrados equivocados, em particular a suposta oposição entre inflação e desemprego, como explorado neste espaço em meados do ano.

À época ela alegou que a fixação da meta de inflação em 3% levaria o desemprego “lá pelos 8,5%, 9%, 10%, 11%, 12%. Por aí”. Como se depreende da afirmação acima, precisão não parece ser exatamente o forte da presidente, mas, mais recentemente, voltou à carga, agora argumentando que o desemprego chegaria a 15%, aumentando assim o intervalo de confiança de suas “projeções” de 3,5 para inimagináveis 6,5 pontos percentuais, uma margem de erro de fazer corar qualquer pesquisa eleitoral.

As implicações da peculiar matemática presidencial podem não ter ficado claras à primeira vista, mas são contundentes.

Como o IPCA deve fechar o ano na casa de 6,5%, buscar uma meta de 3% corresponderia a uma redução de 3,5 pontos percentuais da inflação. Por outro lado, dado que o desemprego se encontra na faixa de 5%, sua elevação para 8,5% corresponderia também a 3,5 pontos percentuais, ou seja, na “estimativa” mais otimista, cada ponto percentual a menos de inflação “custaria” um ponto percentual a mais de desemprego.

Já no caso mais pessimista, a elevação do desemprego atingiria 10 pontos percentuais (de 5% para 15%) para a mesma redução (de 6,5% para 3%) da inflação, ou seja, cada ponto percentual a menos de inflação “custaria” 2,9 pontos percentuais a mais de desemprego!

Em outras palavras, o coeficiente que captura a presumida troca entre inflação e desemprego implícita na curva de Rousseff varia de 1 a 2,9, uma diferença abissal (alguns diriam “estarrecedora”).

À parte o erro conceitual primário (não há troca persistente entre inflação e desemprego, conforme estabelecido por mais de 40 anos de pesquisa na área), as afirmações presidenciais transparecem um descaso desumano (“estarrecedor”, talvez) com os números.

Fosse eu um diplomata, diria que as estimativas poderiam ser melhoradas; como não sou, posso afirmar: trata-se de números chutados (isto mesmo, c-h-u-t-a-d-o-s!), sem a menor preocupação com qualquer referência à realidade, sem base estatística e, portanto, desprovidos da mínima relevância.

Mesmo com o devido desconto que se dá à verdade no período eleitoral (coisa triste de se dizer), esta postura é reveladora. A atual administração demonstra o mais profundo desprezo para com os números. Estatísticas só valem se corroborarem a visão pré-existente, jamais como forma de testá-la e assim permitir, caso necessário, correção dos rumos.

Insistimos há anos que o atual arranjo de política econômica (a tal “nova matriz macroeconômica”, algo sumida de retórica governamental recente) redundaria apenas em menos crescimento, inflação mais alta e desequilíbrios externos crescentes. As evidências a este respeito eram visíveis desde 2012, ao menos, expressas no então “pibinho” de 1% (que hoje seria motivo de comemoração) e na inflação que já então teimava em não retornar à meta. Mesmo assim, foram ignoradas.

Dados ruins das contas fiscais têm sido escamoteados e agora até mesmo os números de distribuição de renda se tornaram sujeitos a interesses políticos de curto prazo, culminando com a postergação da divulgação de pesquisas do Ipea sob o ridículo argumento que violariam as leis eleitorais.


O resultado é que, cada vez mais, temos que navegar sem instrumentos, enquanto se nega à população a possibilidade de avaliar os rumos do país. Neste sentido, as “estimativas” dos parâmetros da “curva de Rousseff” não são a exceção, mas a regra no modelo de condução desastrada de política econômica no Brasil.



(Publicada 22/Out/2014)

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Ovo por carne

Segundo o ministro da Fazenda o fraco desempenho da economia brasileira no mandato da presidente se deve exclusivamente à conjuntura internacional. Face à mais severa crise do capitalismo desde os anos 30 do século passado, a redução do crescimento brasileiro seria consequência inevitável, descontadas, é claro, todas as bravatas sobre a “marolinha” que jamais afetaria o desempenho nacional.

O argumento, reproduzido à exaustão a cada pronunciamento ministerial, é logicamente impecável, sofrendo apenas de um modesto problema: não guarda a mais remota semelhança com o ocorrido, seja no que se refere ao Brasil, seja no que diz respeito à economia global.

Não é necessário mais que uma simples tabela para demolir a história oficial, no caso uma que compare o crescimento brasileiro ao mundial, assim como ao do conjunto dos países emergentes, cobrindo os últimos 5 mandatos presidenciais.


Crescimento do PIB (1994-2014) - % ao ano
Fontes: FMI, IBGE (2014 Focus)

Como se vê, o mundo cresceu algo como 3,5% ao ano entre 2011 e 2014, precisamente o mesmo ritmo registrado nos 4 anos anteriores. Por outro lado o Brasil, que crescera 4,6% aa no período 2007-10, deve registrar expansão de apenas 1,6% aa nos últimos 4 anos, redução abrupta equivalente a 3 pontos percentuais. Nunca antes na história recente deste país o Brasil ficou tão para trás da economia global.

Posto de outra forma, a desaceleração mundial não pode ser invocada como motivo para a piora extraordinária do nosso desempenho simplesmente porque jamais ocorreu, certamente não fora da fértil imaginação do ministro da Fazenda.

A tabela também sugere que a “velocidade de cruzeiro” da economia global não parece ser muito diferente da observada no período mais recente: em 4 dos últimos 5 mandatos presidenciais ali destacados o mundo se expandiu à taxa de 3,5% aa, saindo da toada apenas no período 2003-2006, quando se acelerou para 5% aa, sob o efeito combinado da bolha imobiliária nos países ricos e do pico do crescimento chinês.

Neste sentido, mesmo reconhecendo que a recuperação global poderia ser mais vigorosa, considerada a intensidade da queda do produto observada durante a crise de 2008-09, o ritmo de expansão mundial não chega a ser particularmente desastroso, pelo contrário.

Já se limitarmos a comparação ao conjunto de países emergentes as conclusões são ainda mais vexatórias. Em momento algum o Brasil conseguiu superar o desempenho de nossos pares. Afora isto, mesmo nos últimos 4 anos, quando a expansão emergente perdeu algo de seu brilho, caindo de 6,2% para 5,1% aa, a piora nacional foi bem mais pronunciada, padrão também difícil de reconciliar com a desculpinha oficial para a queda aguda do nosso crescimento.

Nosso lamentável desempenho não pode, portanto, ser atribuído nem à (inexistente) desaceleração global, nem à (muito mais modesta) desaceleração das economias emergentes. Como notado (com certo atraso) pelo FMI, se queremos entender o que vem ocorrendo no Brasil temos que buscar causas locais, que, aliás, não são tão difíceis de encontrar.

Em primeiro lugar a redução visível do crescimento da produtividade, refletindo em larga medida a virtual paralisia do esforço reformista que marcou o país entre 1990 e 2005. Em segundo lugar o esgotamento da mão-de-obra ociosa, que durante algum tempo permitiu expansão baseada na simples adição de trabalhadores ao processo produtivo. E, por fim, também a fraqueza do investimento, que caiu de insuficientes 19,5% do PIB em 2010 para risíveis 17,7% do PIB nos últimos 4 trimestres, a despeito da maciça injeção de recursos nos bancos públicos, assim como de toda sorte de incentivos fracassados.

Nenhum destes fenômenos óbvios é sequer reconhecido como problema no discurso oficial, que continua a insistir nas fantasias que criou, vendendo ovo por carne, tentando justificar a injustificável deterioração em praticamente todas as dimensões da economia brasileira.

Churrasco à Márcio Holland


(Publicado 15/10/2014)









quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Paradoxos heterodoxos

A economia não cresce; apesar disto o desemprego tem caído, atingindo 5% em agosto nas seis regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE, que correspondem a pouco mais de um quinto do emprego no país. Trata-se do menor registro para o mês desde que estas estatísticas começaram a ser coletadas, o que, aliás, tem sido verdade em todos os meses deste ano. Em que pesem questões específicas destas regiões, o resultado desafia o senso comum: como é possível a redução do desemprego em face da economia estagnada?

O resultado se torna menos paradoxal quando examinamos o número mais de perto. Nessas regiões o emprego não cresceu; muito pelo contrário, caiu nos oito meses deste ano, registrando em agosto redução de 85 mil postos de trabalho na comparação com o mesmo mês do ano passado. Este comportamento é consistente com o que seria natural no caso de uma economia cujo crescimento deve ficar ao redor de zero.

Fica claro, portanto, que a evolução positiva do desemprego em 2014 não se deve ao desempenho favorável do emprego, mas sim a desenvolvimentos que afetam a oferta de trabalhadores.

Parte da história reflete a demografia. Há 10 anos a população em idade ativa (PIA) crescia perto de 2% ao ano; hoje o crescimento oscila de 1% a 1,5% ao ano. Isto, porém, não explica o aparente paradoxo: mesmo este ritmo mais modesto de crescimento da PIA supera por larga margem a expansão (negativa!) do emprego. Com mais pessoas chegando ao mercado de trabalho do que empregos sendo gerados, o natural seria observarmos desemprego crescente.

O que tem ocorrido, porém, é uma redução persistente da fração da PIA engajada no mercado de trabalho (a população economicamente ativa, PEA, ou força de trabalho), seja trabalhando, seja na busca por empregos. Entre 2003 e 2013 a PEA foi equivalente em média a 57% da PIA, proporção que hoje se reduziu para pouco menos de 56%.

Parece uma queda pequena, mas não é. Caso a PEA em agosto deste ano atingisse a mesma proporção registrada um ano antes, o total de pessoas engajadas no mercado de trabalho seria algo da ordem de 24,8 milhões; na prática, porém, apenas 24,3 milhões de pessoas participavam dele, uma diferença de quase 500 mil pessoas.

Vista por outra ótica, entre agosto de 2013 e agosto de 2014 a força de trabalho encolheu em 160 mil pessoas, quase o dobro da queda do emprego no período. É este desenvolvimento que explica a redução do desemprego apesar da produção e do emprego estagnados.

Não é claro o que causou este fenômeno. Ele parece mais pronunciado na faixa etária de 18 a 24 anos e pode resultar tanto da busca por maior qualificação por parte dos jovens (que teriam se afastado do mercado para estudar), como do aumento da “geração nem-nem” (nem trabalha, nem estuda). Muita gente boa tem queimado as pestanas para entender o que ocorre.

Embora o debate sobre as origens do fenômeno seja de interesse por si só, prefiro destacar aqui uma conclusão que me parece pouco notada. Se há menos gente disposta a trabalhar (por bons ou maus motivos), nossa própria capacidade produtiva deve ser menor do que imaginávamos.

Em números, com a produtividade crescendo ao redor de 0,7% ao ano, enquanto a força de trabalho encolhe em magnitude parecida, nossa capacidade atual de crescimento não deve ser muito diferente de zero. Isto, contudo, não deve ser persistente, já que em algum momento a força de trabalho voltará a crescer em linha com a população.


Ainda assim, este desenvolvimento parece explicar a resistência da inflação mesmo em face do baixíssimo crescimento deste ano, o que ajuda a esclarecer mais uma aparente anormalidade brasileira. Trata-se apenas de mais uma das contas que pagamos pelo descaso com a produtividade em nome da “nova matriz macroeconômica”, cuja obsessão com a expansão do consumo e com o microgerenciamento da economia minou as bases do crescimento sustentado.

A lugar algum
(Publicado 08/Out/2014)

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Filhos fazendo arte (Maurício Schwartsman toca 'Tamboriles' de Abel Carlevaro)

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Cada um tem a Maria Antonieta que merece


Uma pergunta



1995-98 Brasil cresce 1,0% aa a menos que o mundo
1999-02 Brasil cresce 1,4% aa a menos que o mundo
2003-06 Brasil cresce 1,4% aa a menos que o mundo
2007-10 Brasil cresce 1,1% aa a mais que o mundo
2011-14 Brasil cresce 1,8% aa a menos que o mundo
E o problema do nosso baixo crescimento agora é o mundo?


quarta-feira, 8 de outubro de 2014

A marca da maldade

A invenção das partidas dobradas pelo monge e matemático Luca Pacioli no final do século XV foi tão importante que ninguém menos que Max Weber marca o início do capitalismo a partir deste evento. A ideia de um registro fiel das transações econômicas foi, sem dúvida, revolucionária ao possibilitar o cálculo capitalista, ou, nas palavras do próprio Weber: “a contabilidade monetária atinge o mais alto grau de racionalidade como meio de orientação da atividade econômica pelo cálculo quando toma a forma de contabilidade do capital”.

Menos conhecido que Luca Pacioli é seu irmão gêmeo malvado, Guido Pacioli, o inventor da contabilidade criativa, que, ao contrário da tradicional, se ocupa em criar registros que pouco ou nada se relacionam com o fenômeno econômico.

É nesta categoria original que se enquadra o Fundo Soberano do Brasil (FSB, conhecido no exterior como Brazilian Sovereign Fund, ou BS Fund). Enquanto em outros países os fundos soberanos se originam de superávits governamentais, em geral provenientes de receitas associadas a algum recurso natural esgotável (petróleo, gás, ou minério), o FSB surgiu em 2008, quando o setor público registrou um déficit total equivalente a 2% do PIB.

Em dezembro daquele ano o governo federal contabilizou como despesa a constituição do FSB, R$ 14,2 bilhões (cerca de R$ 19,5 bilhões a preços de hoje), muito embora não tenha comprado nenhum bem ou serviço, o que seria necessário para caracterizar, pela ótica do bom Pacioli, uma despesa no sentido econômico do termo. Na prática subestimou o verdadeiro resultado primário do governo federal.

Em 2012, porém, confrontado com um desempenho fiscal aquém do prometido o governo contabilizou cerca de R$ 13,7 bilhões (em moeda de hoje) como se receita fosse, inflando artificialmente o saldo primário federal. Agora, em face da mesma insuficiência de desempenho, acena com a possibilidade de repetir a operação se utilizando dos R$ 3,5 bilhões que ainda “sobrariam” no FSB, muito embora isto não resulte da redução de bens e serviços disponíveis para o setor privado (como no caso da arrecadação de tributos), mascarando assim a competição entre os setores público e privado pelos mesmos recursos.

(A propósito, como os 18 leitores devem ter notado, em moeda do hoje os “saques” do FSB somariam R$ 17,2 bilhões, bem menos que o depósito inicial de R$ 19,5 bilhões, sugerindo que alguém andou perdendo dinheiro no meio do caminho).

Neste caso fica claro que, a exemplo do ocorrido em anos anteriores, trata-se de operação puramente contábil, sem qualquer efeito direto na vida real (além, óbvio, daquele que resulta da desmoralização persistente dos padrões da contabilidade pública).

É, portanto, estarrecedor que a presidente da República, supostamente uma economista, considere “estarrecedor” que analistas sérios das contas públicas questionem a utilização do FSB. Segundo ela “o fundo tem uma característica contracíclica (...). Se o ciclo está ruim, ele aumenta o gasto para conter o ciclo. Se o ciclo está bom, ele segura o gasto e faz uma poupança”.

A presidente parece desconhecer que o FSB não tem nada a ver com este tipo de operação, precisamente por não representar compra ou venda de bens e serviços que afete de alguma forma a atividade econômica.

Isto dito, senão estarrecedor, é curioso que a mesma presidente que aponta para o desemprego baixo como sinal que vai tudo bem na economia venha ao mesmo tempo afirmar que passamos por um momento ruim.


Como já notei mais de uma vez neste espaço, a fraqueza da economia é sempre invocada para justificar o aumento do gasto, enquanto em momentos de crescimento mais forte, utiliza-se a arrecadação crescente como justificativa para novas despesas. Ou seja, contracíclica é a desculpa para gastar, atitude que certamente deixaria Guido Pacioli ainda mais orgulhoso do que já está.

Hello, Danny. Come and play with us. Come and play with us, Danny. 
Forever... and ever... and ever.

(Publicado 01/Out/2014)

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

“Pessidilma”

Por que não conseguimos trazer a inflação de volta à meta? Simplesmente porque o governo federal não quer, fato aparente em suas repetidas mostras de satisfação com uma taxa que não ultrapasse o limite superior permitido, 6,5%.

Há pouco, por exemplo, a presidente afirmou que “a inflação tenderá para o centro da meta a partir de novembro ou dezembro”, mesmo reconhecendo que fechará o ano apenas pouco abaixo do nível crítico. Esta fala isoladamente não significa muito, mas afirmações como esta abundam, não apenas no discurso presidencial, mas também no que se refere a praticamente todas as autoridades econômicas. O próprio BC, supostamente o responsável pela manutenção da inflação próxima à meta, comemorou acintosamente até quando a inflação ficou exatamente em 6,5% (em 2011).

Como de hábito, a culpa é sempre dos outros: a seca, a chuva, a safra, os EUA, a China, o câmbio ou o “Pessimildo”; jamais resultado do manejo inadequado de política econômica, manifesto na visível piora das contas públicas, assim como de uma política monetária temerária, que reduziu a taxa de juros mesmo em face de inflação alta e crescente.

E, como sempre, a promessa é de queda da inflação no ano que vem, ou no próximo. A convergência lenta, às vezes “não-linear”, e nunca verdadeira, é geralmente justificada como uma tentativa de preservar o nível de atividade. Na prática, porém, independentemente de termos registrado inflação média superior a 6% ao ano nos últimos quatro anos, o país chega ao fim deste período com crescimento medíocre, inferior a 2% ao ano e muito próximo de zero em 2014.

E nem adianta argumentar que as coisas teriam sido ainda piores caso houvesse um esforço para conter a inflação. Como se sabe, a relação negativa entre crescimento e inflação só existe em prazos curtos; ao longo de quatro anos teria sido possível trazer a inflação de volta à meta a tempo de retomar o crescimento e compensar qualquer perda de produto, ainda mais porque, até 2011, o BC ainda dispunha da credibilidade herdada de gestões anteriores.

A verdade é que o descaso com o problema tem agravado a questão do crescimento. Nem tanto porque uma taxa de inflação na casa de 6% produza, por si só, um estrago muito maior do que uma taxa de 4,5%, mas sim por conta das tentativas desastradas de lidar com a alta de preços por meio de intervenções diretas na economia.

O congelamento do preço da gasolina, por exemplo, teve forte impacto negativo na capacidade de investimento da Petrobras. Adicionalmente, “amassou” o setor de açúcar e álcool, dando uma lição inesquecível àqueles que acreditaram nas palavras do governo acerca do futuro de biocombustíveis. Já a intervenção no setor elétrico deve ter liquidado qualquer fiapo de confiança acerca do respeito às regras do jogo.

Não é por outro motivo que o investimento, como já destacado neste espaço, apresenta quatro trimestres consecutivos de queda, recuando a níveis observados pela última vez em 2007.
Da mesma forma, para evitar que a inflação se cristalize acima do limite permitido, o BC tem feito pesadas intervenções no mercado de câmbio, afetando negativamente nossas exportações.

Em outras palavras, a falta de disposição para combater a inflação e a aceitação tácita que bastaria mantê-la levemente abaixo do limite superior para poder decretar vitória nos colocaram numa situação delicada. Para evitar chegar a patamares superiores ao permitido no fim deste ano, o governo recorreu a controles de preços e câmbio, com consequências adversas para nosso crescimento.

A culpa, portanto, não é do “Pessimildo”, mas da “Pessidilma”, a gestora iluminada que, por sua conta e risco, abandonou o bem-sucedido regime macroeconômico que nos assegurava a estabilidade, obtendo em troca inflação alta e crescimento risível, uma combinação verdadeiramente inigualável. Vai para o trono ou não vai?



(Publicado 24/Set/2014)