A calma do mercado
financeiro esconde uma preocupação séria. Muito embora o Banco Central tenha
reduzido a Selic a 7,5% e praticamente prometido que chegará a 7% no final do
ano, nível mais baixo da história, o mercado de renda fixa tem apontado na
direção de juros bem mais altos à frente.
Para entender esse
aparente paradoxo, considere um exemplo simples. Imagine que uma investidora possa
aplicar seu dinheiro por um ano (e reaplicá-lo no ano seguinte), ou fazer uma
aplicação diretamente por dois anos. Vamos admitir que ela saiba que a taxa de
juros será, com certeza, 5% no primeiro ano e 10% no segundo. Assim, uma
aplicação de R$ 100 valeria R$ 105 ao final do primeiro ano e R$ 115,50 no
segundo.
A alternativa sob tais
circunstâncias, o investimento por dois anos, não pode render menos do que R$
115,50 (senão jamais será escolhido), nem mais (senão o tomador de dinheiro
preferirá fazer a operação em dois passos). É fácil concluir, portanto, que uma
aplicação por dois anos requer uma taxa de juros equivalente a 7,5% aa, que
gera este exato valor.
Na prática as coisas
não são tão simples, a começar porque não sabemos toda sequência de taxas de
juros de curto prazo ao longo de períodos mais extensos. Imagine agora que a
taxa de juros do segundo período possa ser 10% ou 15% (cada qual com 50% de
chance). Agora o valor esperado do investimento é R$ 118,125 (0,5xR$115,50 +
0,5xR$120,75), ou seja, a taxa de juros para dois anos subiria para 8,7% aa,
sob a suposição que nossa investidora seja neutra com relação a risco. Se não
gostar de correr riscos, pedirá um pouco mais, talvez 9% aa para aplicar por
dois anos.
Hoje vemos um caso
semelhante. A taxa de juros para uma aplicação de um ano é pouco superior a 7% aa,
enquanto a taxa de juros para cinco anos se encontra ao redor de 10% aa.
Interpretado à luz do exemplo acima, isto sugere que o mercado de renda fixa
embute expectativas de um aumento considerável das taxas de juros nos próximos
anos, chegando a 11% aa, mesmo com as expectativas de inflação bem comportadas.
A elevação da taxa de
juros ao longo de 2019 não é exatamente uma surpresa. Embora a Selic deva mesmo
cair e continuar baixa em 2018, pelo menos, à medida que a inflação retorne à
meta e a economia se aproxime do pleno emprego, é natural que a taxa Selic
também suba. O problema, no caso, é que – de acordo com as melhores estimativas
hoje disponíveis – com uma meta de inflação de 4%, a Selic deveria atingir
perto de 8% aa, não 10% ou 11%, como implicado no mercado de renda fixa. Por
que tamanha diferença?
Prêmios de risco
crescentes podem explicar o fenômeno, ao menos parcialmente, refletindo a
incerteza que cerca a trajetória de juros depois de 2018.
Uma explicação
alternativa (mas não excludente) sugere que, na ausência de um ajuste fiscal
consistente, tanto a inflação tenderia a subir mais, como a taxa real de juros
necessária para combater este fenômeno também teria que ser mais alta. Em
outras palavras, é o medo do futuro que empurra o juro longo para cima.
A incapacidade do atual
governo de aprovar reformas essenciais e o receio acerca do comprometimento de
futuras administrações com o ajuste começam a cobrar a conta. Não perdemos
jamais a oportunidade de perder uma oportunidade.
(Publicado 22/Nov/2017)