Na minha última coluna fiz uma breve menção à queda das exportações brasileiras para a Argentina como um dos fatores que piorou o desempenho da indústria nacional a partir do final do ano passado. Parece inusitado, pois, mesmo sendo a Argentina um dos principais parceiros comerciais do país, este mercado representou pouco menos que 9% do total exportado pelo Brasil no ano passado. No entanto, um exame mais detalhado mostra resultados interessantes.
Com efeito, se podemos descrever o Brasil, quando olhamos o conjunto de nossas vendas externas, essencialmente como um exportador de commodities, no caso do comércio com a Argentina em particular (e América Latina em geral), esta descrição certamente não se aplica. Enquanto manufaturas representam, em média, algo como 45% das exportações brasileiras, no caso das exportações para a Argentina manufaturados são mais de 90% do total, correspondendo a quase 20% das exportações destes produtos.
E não falamos aqui de qualquer produto manufaturado. Pela nossa classificação de comércio exterior, este rótulo se aplica a produtos que vão de suco de laranja a aviões. Em se tratando das exportações para o mercado argentino, porém, o predomínio é de produtos como automóveis, celulares, autopeças e máquinas, sofisticados e com cadeias de produção longas e complexas, em contraste acentuado com as exportações brasileiras em geral. Apenas no que se refere a automóveis, mais de metade do valor exportado em 2008 foi destinado a nossos vizinhos.
Isto dito, entre o pico registrado em setembro do ano passado e junho deste ano as exportações para a Argentina caíram 45%, fenômeno que, à luz dos dados acima, sugere um efeito fortemente negativo sobre a atividade. Usando mais uma vez o exemplo dos automóveis, observamos uma queda de 44% no valor exportado para aquele país entre janeiro e maio deste ano relativamente ao mesmo período do ano passado, o que explica quase dois terços da redução das exportações de automóveis neste intervalo.
Há quem atribua este desempenho fortemente negativo ao protecionismo argentino, ou mesmo a uma suposta invasão de produtos chineses naquele mercado, mas acredito que a mera inspeção do gráfico sugere uma explicação mais simples e, espero, mais convincente. Como é mostrado, o comportamento das exportações brasileiras para a Argentina segue muito de perto o desempenho das importações totais argentinas, ou seja, a queda de nossas exportações reflete essencialmente o colapso das importações platinas, que, entre o pico de julho do ano passado e maio deste ano caíram nada menos que 55%.
Por outro lado, assim como no Brasil, as importações argentinas variam quase que integralmente em função do comportamento da demanda doméstica. O colapso das importações (e de nossas exportações), portanto, nada mais é que o espelho de uma queda colossal da demanda argentina, sugerindo que a recuperação da indústria brasileira passa também pela reanimação da economia vizinha. Neste meio tempo, a única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
(Publicado
22/Jul/2009)